Portugal consegue mil milhões nos mercados com juros mais baixos

Emissão de títulos de dívida a cinco anos depois da agência DBRS ter mantido rating estável.

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A procura dos investidores foi de 1,9 vezes a oferta, menor do que em Agosto PATRÍCIA DE MELO MOREIRA/AFP

O Tesouro português foi levantar aos mercados internacionais mil milhões de euros numa emissão de títulos de dívida pública que vencem dentro de cinco anos, conseguindo taxas de juro mais baixas em relação a uma emissão anterior de há dois meses. Foi o primeiro leilão depois da agência canadiana DBRS ter decidido manter o rating inalterado, num nível acima de “lixo” financeiro e com perspectiva estável.

Portugal conseguiu uma taxa de juro média de 1,751%, inferior aos 1,87% registados num leilão idêntico realizado no final de Agosto. O IGCP, agência responsável pela gestão da tesouraria e da dívida pública, tinha traçado como objectivo obter entre 750 milhões e mil milhões de euros, conseguindo o máximo previsto, o que é comum acontecer nestas operações.

Além de ser o primeiro leilão depois da decisão da DBRS, esta foi a primeira vez que Portugal foi ao mercado depois da Comissão Europeia ter feito uma primeira nota pública sobre o Orçamento do Estado para 2017, pedindo mais explicações ao Governo português sobre o plano orlamental, mas deixando hoje claro, pela voz do comissário Pierre Moscovici, que o OE “parece estar dentro dos critérios exigidos pelas regras”.

Portugal tem ido ao mercado emitir dívida com diferentes maturidades, mas desde o final de Agosto não colocava obrigações com prazo de cinco anos. Na emissão desta quarta-feira, a procura foi de 1,9 vezes a oferta, menor do que a registada nesse leilão anterior. A taxa de juro é mais baixa do que o valor dos juros implícitos das obrigações a cinco anos transaccionadas no mercado secundário (onde são trocados títulos de dívida já emitidos pelos Estados), onde nesta manhã as taxas estavam estáveis nos 1,82%.

Para o director de gestão de activos do Banco Carregosa, Filipe Silva, Portugal beneficiou da redução dos juros no mercado secundário nas últimas semanas, depois de alguma pressão. “Basta lembrar que a 7 de Outubro esta dívida, no mercado, tinha os juros a 2,07%”, registando-se uma descida tanto desde a última emissão comparável, como desde o “pico” sentido nos juros entretanto, enquadra Filipe Silva num comentário enviado às redacções. “É mais um passo para baixar o custo médio do financiamento do país e um sinal de que os investidores acreditam na manutenção do rating da DBRS. Aliás, tudo continuará a correr bem enquanto o BCE continuar a comprar a dívida portuguesa”, sublinha.

Marisa Cabrita, gestora de activos da Orey Financial, nota esse efeito nos resultados do leilão. “Depois de ultrapassado o factor de risco DBRS, Portugal assegurou a elegibilidade para o programa de compras do BCE, levando assim à redução do prémio de risco. Os resultados do leilão, onde o ICGP colocou o montante máximo a uma yield mais baixa do que a observada em Agosto, poderão reflectir esse alívio na percepção de risco”. No entanto, diz, é preciso ter em conta que há “outros desafios para a economia portuguesa, com especial destaque para as expectativas de crescimento modesto, tal como afirma a Fitch”, que ontem emitiu uma nota sobre a proposta de orçamento para 2017.

Atentos às palavras do presidente do Banco Central Europeu (BCE), os investidores ouviram Mario Draghi falar sobre Portugal na véspera da decisão da DBRS, a única agência de rating (entre as consideradas pelo banco central) que atribui a Portugal uma notação acima de “lixo”.

Primeiro, Draghi confirmou que, se o rating descesse (o que não aconteceu, nem era previsível que acontecesse tendo em conta as posições anteriores da agência), o BCE deixaria de aceitar os títulos de dívida portuguesa como garantia dos empréstimos concedidos pela instituição e do programa alargado de compra de activos financeiros da autoridade monetária da zona euro. Além desta constatação, o presidente do BCE destacou os “progressos significativos” do país, mas avisou que Portugal ainda enfrenta “muitas vulnerabilidades”, que o Governo português conhece, nomeadamente o problema do crédito malparado.

Já esta semana, na véspera da emissão de dívida de hoje, foi dada a conhecer a posição de Bruxelas sobre o projecto de orçamento do Governo. Numa carta enviada ao executivo de António Costa na terça-feira, os comissários europeus Valdis Dombrovskis e Pierre Moscovici deixam três notas: mostram-se menos optimistas do que o Governo português em relação ao cenário macroeconómico, dizem que algumas medidas não estão “suficientemente especificadas” e consideram que há um desvio de 0,6 pontos percentuais do PIB (900 milhões de euros) no esforço de redução do défice estrutural (diferente do défice nominal, pois não leva em conta as medidas de carácter excepcional adoptadas por um Governo, nem o impacto da conjuntura económica).

A discrepância foi minizada pelo ministro das Finanças, Mário Centeno, que ainda ontem disse que a diferença se devem à “metodologia de cálculo do défice do saldo estrutural” e mostrou-se convicto de que a divergência não põe em causa o plano orçamental enviado por Lisboa.

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