Com o alívio dos cortes de água “até parece que a seca acabou” no Algarve

Agricultores e ambientalistas criticam o pacote de medidas anunciadas pelo Governo. Sobre os investimentos, Macário Correia diz que “falta saber o calendário das obras anunciadas, que não são novas”.

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O primeiro-ministro, Luis Montenegro, anunciou o alívio das restrições, acompanhado pela ministra do Ambiente, Maria da Graça Carvalho, e pelo ministro da Agricultura e Pescas, José Manuel Fernandes LUÍS FORRA / LUSA
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A forma como o primeiro-ministro Luís Montenegro anunciou na quarta-feira o alívio à redução dos usos da água, no Algarve, causou “estranheza e preocupação” à associação ambientalista Zero, que a considera "uma irresponsabilidade". “Parece que acabou a seca”, comenta Sara Correia, lembrando que as áreas agrícolas de regadio vão prosseguir como se a região deixasse de se encontrar em situação de escassez hídrica.

Os agricultores, por seu lado, consideram “positiva” a redução em cerca de 20 hectómetros cúbicos (hm3) dos cortes que estavam previstos numa resolução do Conselho de Ministros do Governo de António Costa, publicada a 20 de Fevereiro. O alívio das restrições ao consumo de água no Algarve privilegia a agricultura, que fica com 13,14 hm3 desse valor, seguido do turismo (4,17 hm3) e consumo urbano (2,65 hm3).

Foi ainda anunciado um reforço no de 103 milhões de euros nos investimentos dedicados a região no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). Mas Macário Correia sublinha que não passam de promessas. “É preciso saber qual o calendário das obras de milhões que foram anunciadas, que não são novas, porque o dinheiro existe há algum tempo”, critica Macário Correia, representante do sector agrícola.

As reservas das albufeiras e aquíferos, segundo a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), garantem o abastecimento dos diferentes usos até final do ano. A seguir, é esperar que chova, porque nenhuma das grandes obras – dessalinizadora e conduta de ligação ao Guadiana - estará concluída. “É preciso saber: fazer o quê, quando e como”, salientou o presidente da associação de regantes do sotavento algarvio, Macário Correia, em declarações à Lusa

Criticou o facilitismo na apresentação das soluções divulgadas.“Há coisas que foram anunciadas que não são credíveis, como dizer que em dois anos se faz uma dessalinizadora e se faz a conduta do Pomarão para Odeleite, não é credível”.

Ainda em relação à ligação do sistema de abastecimento das barragens do Algarve à bacia hidrográfica do Guadiana, no Pomarão, Macário Correia contradiz o primeiro-ministro: “Nem sequer há negociações com Espanha, nem um projecto definitivo”.

Por motivos diferentes, a Zero também vê com preocupação as medidas anunciadas pelo primeiro-ministro, Luís Montenegro, “principalmente quando se prevê um reforço daquilo que é permitido ao sector agrícola”. O conjunto de soluções apresentadas, afirma Sara Correia, gera apreensão. “Nesse momento, parece que acabou a seca, isto causa-nos até algum espanto por ver o Ministério do Ambiente associado a este alívio de restrições”.

Com o Verão à porta

"Esta decisão é tomada numa altura em que o Verão está à porta, durante o qual é expectável que ocorra um agravamento da situação de seca no país, em particular nas regiões mais a Sul e numa altura em que se desconhece como serão os primeiros meses do próximo ano hidrológico no que respeita aos níveis de precipitação. Pode colocar-se em causa a garantia do abastecimento público durante o próximo ano", salienta a Zero, em comunicado. "As actuais reservas de água do Algarve só permitem garantir o abastecimento público até ao final do ano", sublinha a associação ambientalista.

Ainda sobre a ligação ao Pomarão, Sara Correia lembra que esta solução vai obrigar Alqueva a libertar mais água para garantir que os caudais ecológicos estão presentes, e Alqueva já veio a público dizer que não estará disponível por causa dos compromissos que tem neste momento.

Alqueva já liberta "importantes caudais para cumprir o caudal ecológico a jusante" e, nesse sentido, encontra-se "muito perto da capacidade" máxima de descarga, afirmou em Fevereiro José Pedro Salema presidente da empresa gestora da albufeira do Alqueva.

Porém, nem todos criticam o alívio das restrições anunciado pelo Governo. Do lado Oeste da região algarvia, na zona do Barlavento, persistem os problemas relacionados com a baixa de nível do aquífero Querença-Silves, que alimenta a maior zona de cultivo de citrinos e abacates. Por isso, o presidente da associação de regantes do perímetro Silves-Portimão-Lagoa, João Garcia, considera que o corte das medidas restritivas que estavam a ser seguidas foi um passo “positivo”, justificado pela precipitação que se verificou no início do ano.

“Felizmente, verificaram que os cortes que tinham sido decretados para este sector colocavam em causa a sustentabilidade da actividade [agrícola]”, afirmou João Garcia.

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