Deputada municipal da Frelimo encontrada morta em Quelimane

Corpo encontrava-se parcialmente carbonizado, mas com sinais visíveis de agressão. Celeste Mucunha desapareceu no dia em que tomou posse, “dia da legitimação da fraude” eleitoral, segundo o CDD.

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Manuel de Araújo, presidente do município de Quelimane, reeleito pela Renamo Rui Gaudencio
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Tinha sido vista pela última vez no próprio dia em que tomou posse do seu cargo na assembleia municipal de Quelimane, capital da província da Zambézia, no Centro de Moçambique. Na madrugada deste sábado, o corpo de Celeste Mucunha foi encontrado com sinais visíveis de agressão e parcialmente carbonizado.

A notícia foi avançada à agência Lusa pelo chefe de relações públicas do Comando Provincial da Polícia de Moçambique na Zambézia, Miguel Caetano. O corpo da deputada da Frelimo foi encontrado em Nicoadala, a cerca de 15 quilómetros do centro de Quelimane.

“Parte do corpo dela foi encontrado carbonizado, mas, a outra parte do corpo, ainda visível, apresentava sinais de agressão, o que nos leva a concluir que, antes de ser queimada, ela foi agredida”, explicou Miguel Caetano, acrescentando que as autoridades estão a envidar esforços para esclarecer o caso.

Quelimane é um dos quatro municípios nas mãos da Renamo, o principal partido da oposição à Frelimo que não só governa o país desde a independência como conquistou 60 dos 65 municípios do país nas eleições de 11 de Outubro, um resultado muito contestado pela oposição pelos evidentes sinais de fraude.

Aliás, a Comissão Nacional de Eleições (CNE) moçambicana atribuiu a vitória em Quelimane à Frelimo, mas o resultado seria revertido pelo Conselho Constitucional, a mais alta instância judicial eleitoral. Um resultado que geraria um movimento forte de protesto na cidade, tal como se verificou em muitos outros municípios do país, incluindo a capital, Maputo, e a sua cidade satélite da Matola, onde a Renamo também diz que venceu, mas cuja vitória foi atribuída à Frelimo.

Quelimane já estava antes nas mãos da Renamo e de Manuel de Araújo, que foi reconduzido no cargo de presidente do município. Na quarta-feira, na tomada de posse, não se esqueceu disso, citado pela DW: “Hoje é dia de festa porque vocês tiveram a coragem de desafiar o sistema. A CNE tinha roubado as eleições.”

O Centro para Democracia e Direitos Humanos (CDD), uma das mais importantes organizações da sociedade civil moçambicana, escrevia no seu boletim de quarta-feira que este “é um escrutínio que entrou para a história como o mais fraudulento desde a votação instaladora da democracia em 1994”.

O CDD lembra que a contagem paralela da Renamo deu a vitória do partido em pelo menos 18 municípios e a CNE não lhe atribuiu nenhum, concedendo apenas que a cidade da Beira continuava nas mãos do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), o terceiro maior partido. A “luta contestatária nas ruas das principais cidades do país” levou o Conselho Constitucional a alterar os resultados “sem qualquer fundamentação”, atribuindo a vitória da Renamo em Quelimane, Chiure, Alto Molócuè e Vilanculos.

Para o CDD é pouco, significa que a Renamo viu ser-lhe impedida a vitória em outros municípios, e, por isso, a organização chamou ao 7 de Fevereiro de 2024 o “dia da legitimação da fraude”.

Na sexta-feira, em Maputo, na conferência de imprensa de apresentação dos relatórios sobre a situação dos direitos humanos no país no último trimestre e sobre o processo eleitoral, o director do CDD, Adriano Nuvunga, referiu, citado pela Lusa, que em matéria de direitos humanos “a situação é desoladora”.

“O Estado moçambicano, através da sua polícia, as forças de intervenção rápida, são o principal instrumento de abuso e violação dos direitos humanos, com a nota dominante de neste período terem matado cidadãos moçambicanos”, denunciou.

“Eu estive em Namicopo, onde o Estado moçambicano, através da sua polícia, deliberadamente, matou moçambicanos”, disse Nuvunga, falando do bairro mais populoso e degradado de Nampula, capital da província homónima no Norte do país. Esse foi o epicentro dos protestos contra os resultados eleitorais no final de Outubro, reprimidos com brutalidade pela polícia, resultando em pelo menos três mortos.

“O Estado tem de ser levado a tribunal”, afirmou o director do CDD. Porque, como escreve a organização no seu boletim, “a polícia violentou os cidadãos que se faziam às ruas em protestos” e acabou por ser “um instrumento ao serviço da fraude”. A instituição do Estado que devia proteger os cidadãos, zelar pela sua segurança, mesmo quando estes exerciam o seu direito constitucional de protestar contra aquilo que consideravam ser a manipulação de resultados por parte do partido no poder, recorreu à violência “que resultou em ferimentos e mortes”.

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