Stellantis antecipa para 2024 início da produção de eléctricos em Mangualde

Fábrica portuguesa é a melhor de todo o grupo em qualidade e custos na Europa. Arranque só estava previsto para 2025, mas será mais cedo, depois de um ano recorde em 2023.

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Carlos Tavares, presidente do grupo automóvel Stellantis Reuters/REMO CASILLI
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A fábrica da Stellantis em Mangualde, que produz carros para quatro marcas do grupo (Peugeot, Citroën, Fiat e Opel) vai estrear-se na produção de carros eléctricos já este ano, antecipando-se em um ano face ao anunciado em Março de 2023.

A novidade foi adiantada esta tarde no Porto, por Carlos Tavares, CEO da Stellantis, num encontro com jornalistas depois de ter subido ao palco do Congresso da Ordem dos Engenheiros, que decorre até amanhã no antigo Pavilhão Rosa Mota.

Depois de confirmar um novo recorde, com 84 mil carros produzidos no ano passado, Tavares revelou que a fábrica do grupo no distrito de Viseu é a melhor em qualidade e custos do universo Stellantis na Europa, acrescentando que começará já este ano a fabricar versões eléctricas dos quatro modelos que ali já são produzidos: Citroën ë-berlingo, Peugeot e-Partner, Opel Combo-e e Fiat e-Doblò, nas versões de comerciais ligeiros e de passageiros.

Há dez meses, Tavares apontava para 2025. Agora, o gestor não especificou os motivos da revisão desse calendário, nem detalhou o momento em que Mangualde começará a fabricar esses eléctricos. Mas o motivo ficou subentendido nas explicações bastante completas que deu sobre a estratégia do grupo que lidera, e que passa por acelerar a produção de eléctricos, com um investimento global de 50 mil milhões de euros em electrificação e software para as 14 marcas detidas pelo grupo.

É isso que os políticos europeus exigem aos construtores activos na União Europeia (UE), sublinhou Tavares, carregando no entanto contra o “dogmatismo” e a “demagogia” dos que impuseram a morte dos motores a combustíveis fósseis a partir de 2035, como é o caso da UE.

O gestor português, que em 2014 pegou na aliança francesa PSA (Peugeot-Citroën) depois de ter feito carreira na Renault, conseguiu em 2019 chegar a acordo de fusão com a aliança italo-americana Fiat-Chrysler. Catorze meses depois, selou o negócio, depois de autorizado pela UE, que exigiu uma avaliação prévia ao negócio por questões de concorrência.

Tavares acredita que isso foi fundamental para enfrentar a potente concorrência chinesa, e antevê que haverá mais fusões ou aquisições na indústria durante os próximos dez anos. E se a oportunidade surgir, a Stellantis estará “preparada” e interessada em voltar às compras, garantiu aos jornalistas no Porto.

O grupo tem capacidade financeira – se perdesse hoje 60% das receitas, continuaria a gerar dinheiro suficiente para pagar as despesas, isto é, continuaria no ponto de break even, salientou. Admitiu, contudo, que tudo será mais difícil, por causa dos reguladores, pedindo por isso mesmo mudanças. “O antitrust europeu [direito da concorrência] é como a ONU, precisa de uma reforma”, advogou.

Sem consolidação, será difícil enfrentar os “gigantes chineses”, que têm um custo de produção cerca de 30% mais barato do que os europeus, à saída da fábrica. O proteccionismo não é solução, defendeu ainda, porque isso só levaria “a mais inflação” e eventuais retaliações da China contra produtos europeus.

A Comissão Europeia abriu uma investigação aprofundada aos carros chineses à venda na UE por suspeita da prática de dumping – venda abaixo do preço de custo – e distorção do mercado com subsídios estatais de Pequim aos produtores de eléctricos na China.

Tavares tem sido um gestor obcecado com a classe média. Diz que a viragem forçada para os eléctricos está a ser feita sem uma boa estratégia e quem paga a factura é a classe média que não consegue pagar o preço de um veículo eléctrico, porque a indústria está obrigada por lei a acelerar, sem ter tempo para desenvolver e amadurecer tecnologia e ganhar a escala que permita cortar nos custos. Por isso, os eléctricos com maiores autonomias ainda são muito caros, o que levanta o risco de gerar uma fractura social com a mobilidade eléctrica reservada a uma elite.

Uma guerra de preços, com cortes sucessivos nestas condições, seria uma “corrida para o fundo” que acabaria “num banho de sangue”. Mas a opção contrária, que é manter preços inacessíveis à classe média também acarreta riscos de perda de mercado. Num caso ou noutro, a indústria fica em risco, assim como os 14 milhões de empregos que assegura na UE.

O empresário também vê riscos geopolíticos sérios em 2024, que é ano de eleições presidenciais nos EUA e de eleições para o Parlamento Europeu. Dos dois lados do Atlântico podem ganhar os “dogmáticos progressistas”, que querem mudanças rápidas mas não têm em conta o tempo e o dinheiro que elas exigem, ou podem ganhar “os populistas” que podem travar ou até inverter esta política – o que significaria centenas de milhares de milhões de investimento feito deitadas ao lixo.

Questionado pelo PÚBLICO sobre qual cenário prefere, o CEO da Stellantis respondeu assim: “Estou preparado para os dois cenários.”

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