Como dignificar os professores? Como promover a escola pública?

Esta greve do Stop é insensata, tendencialmente ilegítima e só prejudica os professores e as escolas públicas.

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Leio que o presidente do Stop quer passar a mensagem de que “venha quem vier para o futuro governo, os profissionais de Educação continuarão a lutar por uma escola pública e de qualidade para todos os que lá trabalham e estudam”. E por isso decreta 13 dias de greve de docentes e não docentes até ao dia 29 de novembro.

Ora, independentemente das razões e dos sentimentos que assistem aos professores, esta deliberação não pode (não deve) eleger como vítimas os alunos e respetivas famílias. Não pode continuar a promover a instabilidade, o tédio e o abandono das aprendizagens. E, ao contrário do que afirma, esta luta está a desacreditar a escola pública, a promover a procura social do ensino particular e cooperativo e a cavar o desprestígio de uma profissão que deveria ser exemplar na adoção de um código de conduta de serviço público – porque há formas alternativas de lutar, há formas alternativas de protestar, dignificando e prestigiando a profissão.

Sustento, pois, que esta ação é insensata, tendencialmente ilegítima e só prejudica os professores e as escolas públicas. E enuncio cinco argumentos:

1. É uma greve que é feita contra o futuro governo. Ora, esta visão e este propósito não podem ser mais descabidos. Sabendo da inutilidade de ação presente, adota-se a arrogância desta medida para marcar posição? Em que valores éticos se fundamenta? Não se entenderá que deve haver limites para uma luta que parece ter abandonado as linhas vermelhas e em que vale tudo?

2. É uma greve feita para promover a escola pública de qualidade para todos. Mas não se vê que este modo de agir promove a desigualdade no acesso e na frequência da educação? Não se vê que são os mais frágeis e fracos os que mais sofrem? Não se vê que isto é um contributo objetivo para desacreditar e progressivamente destruir a escola pública que está muito longe de ser pública e de qualidade para todos e para cada um? Em que mundo vivem os dirigentes do Stop?

3. É uma greve feita para dignificar os professores. Mas a dignidade e o prestígio social e profissional só se afunda com estas práticas. Porque é um atentado aos direitos basilares das crianças – o de aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a ser e conviver. É um atentado à tranquilidade das famílias. É um motivo objetivo para perda de trabalho de um número indeterminado de famílias. A dignidade profissional constrói-se no interior da profissão, na ação de serviço ao outro, na exigente qualidade das aprendizagens que assegura (a todos os alunos, em condições muitas vezes adversas), na responsabilidade da equação dos direitos e deveres e na capacidade de prever as consequências das ações.

4. É uma greve para arregimentar o “rebanho” e o manter unido contra um inimigo que é o Ministério da Educação e o Governo. Mas não se vê a inutilidade desta ação de “terra queimada”? Saramago, no incipit de um dos seus romances, aconselhava os seus leitores: “Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara.” Será preciso elaborar outro “ensaio sobre a cegueira”?

5. E referir, enfim, o pensamento inspirador de um sociólogo de “esquerda”, Pierre Bourdieu: “Ensinar não é uma atividade como as outras. Poucas profissões serão causa de riscos tão graves como os que os maus professores fazem correr aos alunos que lhe são confiados. Poucas profissões supõem tantas virtudes, generosidade, dedicação e, acima de tudo, talvez entusiasmo e desinteresse. Só uma política inspirada pela preocupação de atrair e de promover os melhores, esses homens e mulheres de qualidade que todos os sistemas de educação sempre celebraram, poderá fazer do ofício de educar a juventude o que ele deveria ser: o primeiro de todos os ofícios.”

Precisamos de dignificar os professores e promover a escola pública. Não precisamos de agir em sentido completamente contrário.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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