Novo tipo de semicondutor descoberto por acaso bate recordes de velocidade

O Re6Se8Cl2 é mais lento e mais rápido do que os semicondutores de silício na maioria dos sistemas electrónicos actuais. Os investigadores usam o conto A Lebre e a Tartaruga para explicar porquê.

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É pouco provável que o novo material se torne num competidor comercial viável aos semicondutores de silício – pelo menos, no futuro próximo Wong Yu Liang/Getty
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Foi descoberta uma alternativa aos semicondutores de silício, os materiais microscópicos que são a base da maioria dos sistemas electrónicos modernos, dos smartphones aos mísseis. Uma equipa de especialistas em Química da Universidade de Colúmbia, nos Estados Unidos, concluiu que uma combinação de rénio, selénio e cloro permite criar um semicondutor à temperatura ambiente que é mais eficiente e mais rápido do que o silício. Mesmo que à primeira vista pareça mais lento.

O material, com a fórmula química Re₆Se₈Cl₂, foi apresentado este mês num artigo publicado na revista Science. As suas capacidades de semicondução foram descobertas por acaso em 2021, quando uma equipa da Universidade de Colúmbia, liderada pelo doutorando Jack Tulyag e pelo professor Milan Delor, estava a testar a resolução de microscópios da instituição. Em teoria, o Re₆Se₈Cl₂ deveria ser um mau condutor de energia, mas, ao analisar o material, descobriram precisamente o contrário – os electrões atravessam o material entre 100 e 1000 vezes mais rapidamente do que num semicondutor de silício.

“Em termos de transporte de energia, é o melhor condutor que conhecemos, pelo menos até agora”, resumiu Milan Delor, em comunicado. A equipa passou os dois anos seguintes a perceber o motivo da inesperada eficácia do Re₆Se₈Cl₂. A resposta pode ser explicada com a ajuda do conto A Lebre e a Tartaruga, de Esopo – no Re₆Se₈Cl₂, as partículas movem-se mais lentamente, mas dispersam-se menos numa viagem do ponto A para o ponto B.

Perder menos energia

Há muito que os cientistas procuram uma alternativa aos semicondutores de silício. Apesar de estes semicondutores serem a base do mundo moderno, a sua estrutura tem limitações. Regra geral, as vibrações dos átomos num material, incluindo em semicondutores de silício, levam à libertação de partículas quânticas (os fonões) que provocam a dispersão dos electrões e excitões (duo de partículas com cargas opostas, resultantes de electrões excitados). Isto conduz a perdas de energia e electrões que demoram mais tempo a ir de A a B.

Em contraste, no Re₆Se₈Cl₂, os electrões e excitões não se dispersam. Como os excitões se movem mais lentamente, conseguem formar pares com os fonões e gastar menos energia numa viagem. É isto que faz com que Delor compare o novo semicondutor de rénio à tartaruga de Esopo.

A equipa de Delor descreve o movimento como “balístico” no sentido em que o Re₆Se₈Cl₂ permite um movimento rápido com muito pouca dispersão e resistência. A característica pode levar ao desenvolvimento de aparelhos electrónicos mais rápidos e eficientes.

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A equipa de Jack Tulyag compara o novo material à tartaruga no conto de Esopo DR Jack Tulyag

É pouco provável, no entanto, que o novo material se torne num competidor comercial viável aos semicondutores de silício – pelo menos, no futuro próximo. O primeiro elemento do novo material, o rénio, é extremamente raro. Por outro lado, o silício é um dos elementos químicos mais abundantes (o segundo mais abundante na superfície terrestre, depois do oxigénio). Isto deixa o novo semicondutor de rénio como uma possível opção para aplicações menos comuns em que a velocidade é essencial: por exemplo, novos computadores quânticos.

A realidade não desmotiva a equipa de Milan Delor. “Podemos agora começar a prever que outros materiais podem ser capazes deste comportamento que ainda não considerámos antes”, justificou Delor na apresentação do material.

A procura por novos e melhores semicondutores continua.

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