Falemos de terras raras, as “vitaminas da indústria”

As terras raras são metais que, ao contrário do que o nome sugere, não são raras. O termo “raro” dever-se-á à surpresa de um mineiro na Suécia em 1788, quando encontrou uma rocha negra peculiar.

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Peggy Greb/Departmento de Agricultura dos EUA
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O que têm em comum objectos tão diversos como um disco rígido, um ecrã de um telemóvel, a lente de um telescópio e um taco de basebol? Todos estes objectos são fabricados usando uma ou mais terras raras.

As terras raras constituem um grupo muito especial de 17 elementos químicos e são apelidadas de “vitaminas da indústria” porque, à semelhança das nossas vitaminas, têm um papel fundamental no desenvolvimento tecnológico e, tal como no nosso organismo, cumprem a sua função mesmo em pequenas quantidades.

Nos discos rígidos, o neodímio e o praseodímio, entre outros, fazem parte de ímanes que controlam o movimento de um braço que permite ler e escrever dados. Nos ecrãs de computadores e de televisores há materiais luminescentes (phosphors) com diversas terras raras, tais como ítrio, európio e térbio, que geram as cores que nós vemos. As lentes de telescópios e de câmaras de alta qualidade incluem lantânio, cuja adição permite melhorar as propriedades ópticas do vidro. Por sua vez, o taco de basebol usa uma liga com escândio que faz com que este seja leve, mas ao mesmo tempo forte e resiliente.

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Amostras de terras raras, incluindo de neodímio, que faz parte de ímanes nos discos rígidos David Becker/Reuters

As terras raras são metais que, ao contrário do que o nome sugere, não são raras. A terra rara mais abundante, o cério, é um pouco mais comum na crosta terrestre do que o cobre. O neodímio, que é a segunda mais comum, é sensivelmente duas vezes mais abundante do que o lítio. Acredita-se que o termo “raro” se deve à surpresa de um mineiro na Suécia em 1788 ao ter encontrado uma rocha negra peculiar, enquanto “terra” era o termo geológico nessa altura para rochas que poderiam ser dissolvidas em ácido.

Recuperar terras raras de equipamentos

Apesar de serem elementos químicos muito úteis para a humanidade, a extracção mineira das terras raras é bastante complexa e nefasta para o meio ambiente e populações que estejam estabelecidas nas proximidades. O principal problema é a libertação de elementos radioactivos, como o tório e o urânio, que contaminam o solo, a atmosfera e os cursos de água em redor. A acidificação dos solos e dos cursos de água, a eutrofização e a contaminação do ar com partículas e gases tóxicos lançados durante o processamento extractivo são outros problemas relacionados com a exploração destes minérios.

A recuperação das terras raras presentes em resíduos de equipamentos eléctricos e electrónicos é uma via muito promissora para obtenção destes elementos críticos. Tem sido amplamente investigada na última década, como forma de reduzir a produção em minas clássicas, evitando os problemas ambientais associados, reduzindo o consumo de energia e reagentes químicos e promovendo uma economia mais circular.

O meu trabalho de investigação foca-se na utilização de processos hidrometalúrgicos, que são à base de água, e também em processos solvometalúrgicos, em que a água é substituída por um solvente com propriedades desejáveis, para a recuperação de terras raras presentes em ímanes à base de neodímio e phosphors de equipamentos com tubos de raios catódicos.

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O investigador Filipe Figueiredo DR

Em geral, é necessário dissolver o resíduo sólido com ácidos e proceder a separações selectivas por extracção para um solvente diferente e/ou por precipitação de um novo produto sólido rico em terras raras. Além de experimentar diferentes reagentes e condições, a fim de optimizar sucessivamente cada etapa, obtenho dados para possibilitar o desenvolvimento de uma unidade-piloto de recuperação de terras raras em Portugal na forma de óxidos mistos.

Estudante de doutoramento em Engenharia Química do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa

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