Não é só na escola que se pode aprender a ser tolerante

Trazer para o diálogo a tolerância e aceitação do que é diferente é uma das várias maneiras de não entrar em conflitos desnecessários.

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É necessário trabalhar a tolerância Daniel Rocha/Arquivo
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Várias têm sido as notícias de situações em diversos domínios que revelam a pouca disponibilidade para a aceitação da diferença, para a resolução de pequenos conflitos ou para a inclusão de ideias com perspectivas que em nada coincidem com as nossas. Assistimos a uma falta de tolerância social, cultural e interpessoal que todos os dias é notícia de alguma forma.

São peças de arte que se querem remover ou esconder, são culturas que não queremos acolher ou conflitos entre familiares e amigos que acabam tragicamente e de forma irreversível, entre muitos outros exemplos. Dentro das empresas e organizações, nas nossas casas ou no mundo, a falta de tolerância é, por vezes gritante, ao ponto de ser um problema a abordar.

Muitas vezes e para muitas pessoas, a abordagem de questões como a promoção da tolerância, são menores e ridículas, pois há tantos assuntos ‘importantes’ relacionados com a área financeira e económica que requerem o traçado de uma estratégia de posicionamento e de crescimento, que não temos tempo para pormenores como estes.

Quem quer estar, é bem-vindo, quem não se acomoda, pode ir-se embora. Esta maneira de pensar é, em si mesma, reveladora de pouca tolerância. Esta ou a não-promoção da paz, por exemplo, são muitas vezes as principais causas de desequilíbrios e desastres financeiros, que, no final, são o critério das opções fundamentais do homem.

A cultura de um povo é aquilo que ficará, para revelar o seu modo de pensar e agir. A falta de tolerância cultural é querer reprimir aquilo que para si próprio é incomodo e que não sabe reagir ou reage mal se alguém o confronta com o que ali está representado, o seu significado e como acolhe aquele pedaço de cultura de um povo que é o seu e do qual faz parte.

É essencialmente a vergonha de aceitar que pode, alguma vez, alguém pensar que eu também penso, sinto ou faço aquilo que ali está. É antes de mais, a sua própria confrontação com todos os possíveis significados da obra de arte. Julgar se é bonito ou feio, é um acto tão perigoso ao qual Kant dedicou parte da sua obra e que de alguma maneira abordamos na sua Crítica da Faculdade de Julgar.

Não desenvolvermos um pensamento flexível e elástico promove a fechamento do indivíduo sobre si mesmo, que o faz não sair da sua zona de conforto, e consequentemente potencia a não-aprendizagem de coisas novas e diferentes, o que leva à falta de crescimento seja em que dimensão for.

A promoção da aceitação da diferença, da inclusão, da tolerância não é sinal de pouca capacidade de debater ideias e muito menos de fazer valer as suas, mas antes sinal de que nos podemos complementar e encontrar caminhos novos para situações novas e por vezes antigas, incluindo diferentes maneiras de pensar e fazer.

Aceitar não significa ceder ou passar a pensar como o outro, significa que aceitamos que a diversidade de pensamento e de abordagens exista, que tem o direito de ter e manifestar ideias diferentes das minhas, tal como eu tenho esse direito. Significa que podemos resolver as diferenças na base do interesse mútuo, sem desentendimentos, sem querer ganhar ou ter o sentimento de perder na conversa.

Trazer para o diálogo a tolerância e aceitação do que é diferente é uma das várias maneiras de não entrar em conflitos desnecessários, de não perder amigos, de gastar o tempo com conversas que proporcionem bem-estar e acrescentem aquilo que sei e sou.

Há semanas, ouvi nas notícias, mais uma vez, que temos de ensinar na escola o que é a tolerância e ensinar a ser tolerantes — isto a propósito da desavença trágica entre duas irmãs por causa de um telemóvel que terminou na morte de uma delas. Sim, as escolas trabalham o tema da tolerância, até porque se não o fizerem vão ter sérios problemas, tal é a diversidade de proveniências da sua população.

E nas empresas? E na política? E na economia e finanças? Como é possível fazer com que estes temas sejam também tratados com o respeito que merecem e precisam em todos os sectores da sociedade? Há temas que são transversais e não apenas da escola. Devem, tal como o amor, por exemplo, ser lembrados com frequência, para não nos esquecermos dos nossos propósitos pessoais e colectivos.

As mentes rígidas, julgadoras e moralistas têm, normalmente, um confronto de aceitação de si próprias que as leva à negação de determinadas situações, que têm dificuldade de viver de maneira simples e tranquila. Leva à não-aceitação das suas necessidades, à falta de transparência e de verdade e à frustração. Compromete o bem-estar emocional.

Tanto na escola como na vida adulta, a tolerância, a aceitação da diferença, a co-criação de novas abordagens aos problemas devem ser trabalhados ao ponto de se conseguir o alargamento do campo das possibilidades, a aceitação e inclusão de todos e do seu pensamento, hábitos e cultura, e o repúdio de toda e qualquer forma de conflito e violência. Não há temas que devam ser abordados apenas por alguns. Há temas transversais necessários a todos, e a tolerância é um deles.

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