No Pacífico mais remoto, os recifes de coral resistem às alterações climáticas. Como?

Cientistas de uma expedição nas zonas mais remotas do Pacífico têm observado a recuperação de corais que foram afectados pelo fenómeno El Niño em 2016. Qual o segredo da recuperação?

Foto
Os peixes dão um grande contributo para a protecção de corais no Pacífico National Geographic Pristine Seas

Directamente das Ilhas Marshall para o mundo, Ryan Jenkinson apresenta aos jornalistas a expedição em que está a participar no Pacífico “Estamos actualmente no atol de Rongerik e está uma manhã bastante tempestuosa”, diz numa conferência transmitida na plataforma online Zoom. O coordenador da expedição anuncia que a equipa está a fazer a quarta paragem desta viagem, que tem deixado algo bem claro: no remoto oceano Pacífico, os recifes de coral têm sido resilientes às alterações climáticas.

Mas esta resiliência tem uma razão – ou, pelo menos, essa razão tem ajudado os corais. São zonas remotas, quase intactas. A equipa de Ryan Jenkinson tem percebido isso na expedição integrada no programa Mares Prístinos (Pristine Seas, em inglês), que já proporcionou mais de 40 expedições em 30 locais. Desde Agosto, na embarcação Argo, têm vindo a ser explorados em zonas mais remotas do Pacífico atóis – anéis circulares de coral com uma lagoa no meio –, tendo sido um deles usado como local de detonação para bombas nucleares entre 1946 e 1958.

Mesmo antes de o Sol nascer, a tripulação desta expedição começa logo a trabalhar. Nos sítios visitados, são distribuídas câmaras e recolhidos dados para análises. Nesta expedição subaquática, os cientistas fazem longas horas de mergulho para que possam chegar a todos os locais. Nesta viagem, têm participado cientistas de longe e de perto.

Foto
Expedição da National Geographic tem estado nas águas do Kiribati National Geographic Pristine Seas

“Trouxe um método local para fazer os mergulhos”, contou aos jornalistas, também por Zoom, Bryant Jeffery Zebedy, da Autoridade de Recursos Marinhos das Ilhas Marshall. Para si, a participação de técnicos e investigadores locais pode fazer toda a diferença na expedição. “Nas ilhas do Pacífico, somos pessoas do oceano e estamos dependentes do ecossistema marinho”, assinala. Um dos objectivos é transmitir, no final, o relatório da expedição aos locais para que continuem a participar na protecção dos ecossistemas.

Essa protecção é algo indispensável para Evii Tong desde sempre. Mas, agora, essa protecção é mais necessária do que nunca. “Temos de cuidar e de proteger mais os nossos oceanos. Ter mergulhado nas ilhas do Pacífico foi um abre-olhos”, reflectiu Evii Tong, cientista marinho, natural do Kiribati. “A diversidade de corais e de peixes é imensa.” E Evii Tong quer preservá-la. “A expedição tem sido uma experiência mágica para mim. Lembro-me de cada mergulho que fiz.”

Esta também tem sido uma experiência enriquecedora para o experiente Alan Friedlander, cientista-chefe da expedição. O investigador diz que têm sido usadas diferentes ferramentas para se conhecer melhor o Pacífico mais remoto, desde mergulhos mais superficiais, a câmaras, até técnicas mais avançadas de mergulho. “Temos vindo a perceber como os locais prístinos funcionam”, diz já o cientista, mesmo antes da publicação de resultados mais concretos.

Por agora, tem-se tido oportunidade para se perceber como funcionam os recifes de coral de locais mais remotos. “Os recifes de coral [de lugares prístinos] são resilientes às alterações climáticas”, anuncia aos jornalistas. “Quando temos um ecossistema intacto, a natureza tem a capacidade para recuperar por si mesma.”

Peixes a produzir areia

Mas, mesmo no Pacífico remoto, os recifes de coral têm tido uma ajuda. Na mesma conferência, Enric Sala refere que as áreas marinhas protegidas têm contribuído para a boa saúde dos corais na zona do Pacífico onde está a decorrer a expedição. “Quando um lugar é protegido por nós [humanos], a vida marinha recupera de forma espectacular dentro das suas fronteiras”, nota o fundador do programa Mares Prístinos e explorador da Sociedade National Geographic. “As áreas marinhas protegidas proporcionam a resiliência climática.”

Foto
As áreas marinhas protegidas têm-se mostrado uma arma eficazes contra as alterações climáticas National Geographic Pristine Seas

Enric Sala dá o exemplo do El Niño – fenómeno climático natural geralmente associado ao aumento das temperaturas e da seca – em 2016. Metade dos corais nas Ilhas Marshall foi afectada por este fenómeno nesse ano, mas conseguiram recuperar. O explorador diz que, em grande parte, isso se deveu ao facto de estarem em áreas marinhas protegidas. “Os recifes estão com um óptimo aspecto”, salienta, quanto aos ecossistemas que observou nas Ilhas Marshall.

Mas como ficam os corais protegidos através das áreas marinhas protegidas? Através dos peixes que ficam nessas áreas. Enric Sala relata que há peixes nas Ilhas Marshall que podem produzir cerca de 5000 quilos de areia por ano, por exemplo, através de excrementos. “A areia produzida por peixes protege a linha costeira das tempestades, das ondas e da subida do nível do mar”, nota o cientista, que realça que esta protecção tem sido evidente ao longo da expedição. Ora, com as áreas marinhas protegidas, há maior abundância de peixes.

“Esta parte do Pacífico tem mostrado uma capacidade extraordinária para recuperar dos impactos humanos, incluindo do aquecimento da água do oceano”, resume Enric Sala. Por agora, a expedição continua pelas zonas mais remotas do Pacífico...

Sugerir correcção
Ler 3 comentários