Doenças malignas do sangue em Portugal — o que importa saber

Setembro é o mês dos tumores relacionados com o sangue e sistema linfático: a 15, assinala-se o Dia Mundial do Linfoma; a 22, o Dia da Leucemia Mielóide Crónica.

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Os últimos 30 anos viram acontecer a tradução do conhecimento biológico fundamental em avanços terapêuticos DR/National Cancer Institute via Unsplash
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Fala-se frequentemente do número crescente de casos de cancro, mas também dos avanços no diagnóstico e tratamento. Tipicamente focamos a nossa atenção nos quatro grandes grupos — cancro da mama, do cólon e recto, do pulmão e da próstata —, que, em conjunto, são responsáveis por cerca de 50% do total de casos. E os cancros de origem no sangue, medula óssea e sistema linfático? Quais são e qual o seu peso no total de cancros?

Os dados mais recentes para Portugal são fornecidos pela plataforma internacional Globocan e são referentes a 2020. Neste período, tivemos em Portugal um total de cerca de 60 mil novos casos de cancro e 30.168 mortes.

Se olharmos para os cancros de sangue ou sistema linfático, tivemos cerca de 4700 casos, ou seja, cerca de 8% do total. Estes 4700 são o somatório de linfomas, de leucemias e de mielomas, e estão discriminados em 4 grupos, nomeadamente: linfoma não Hodgkin (2098 casos); leucemias (1547); mielomas (881): linfoma de Hodgkin (233).

Em Setembro, assinala-se o mês dos tumores relacionados com o sangue e sistema linfático: a 15, com o Dia Mundial do Linfoma e, a 22, com o Dia da Leucemia Mielóide Crónica. Estas efemérides alertam-nos para a importância de gerar um pouco mais de conhecimento sobre algumas destas doenças.

Importa, então, saber que: as células que circulam no sangue e que formam o sistema linfático têm origem em células-mãe, que habitam o interior dos nossos ossos, a medula óssea; a transformação destas células, decorrente de alterações genéticas, dá origem às leucemias, mielomas e aos linfomas. Infelizmente não conhecemos os mecanismos que iniciam estes processos (ao contrário, por exemplo, da relação entre o tabaco e o cancro do pulmão).

A transformação das células-mãe na medula óssea resulta em leucemia, com manifestações de anemia (cansaço), hemorragias e infecções. A transformação das células que compõem o sistema linfático (medula, baço, gânglios) resulta em linfomas.

Existem vários tipos de linfomas e leucemias.

O linfoma de Hodgkin (do nome do médico Thomas Hodgkin que, em 1832, descreveu pela primeira vez a doença) distingue-se de outros linfomas, ditos não Hodgkin (e que incluem várias dezenas de subtipos de linfomas). Enquanto as manifestações do linfoma de Hodgkin são essencialmente ganglionares, no linfoma não Hodgkin podem estar afectadas quaisquer estruturas do organismo (do cérebro à pele, do baço ao pulmão, entre outras).

O linfoma de Hodgkin foi o primeiro tipo de linfoma a ser considerado curável mesmo sem ser conhecida a sua origem precisa. No caso dos linfomas não Hodgkin, o panorama de tratamento mudou significativamente com a introdução de anticorpos específicos para as células linfóides.

O mieloma múltiplo é um tumor também de origem na medula, mas com manifestações diferentes e que, muitas vezes, simula doença óssea e articular ou doenças renais. Nos últimos 20 anos, assistiu-se a uma revolução no tratamento, com novos fármacos, que transformaram a esperança de vida dos doentes de poucos anos para décadas, nalguns casos.

No caso das leucemias existem 4 grupos principais, de acordo com a rapidez de evolução e de acordo com o tipo de células implicado. As leucemias agudas, de evolução em semanas ou meses, incluem a leucemia linfoblástica aguda e a leucemia mielóide aguda. Já as leucemias crónicas, de evolução lenta (anos), incluem a leucemia mielóide crónica e a leucemia linfocítica crónica.

A leucemia mielóide crónica foi a primeira doença a ser caracterizada por uma alteração molecular característica (chamada bcr/abl) e foi a primeira doença para a qual foi criado um fármaco específico que permitiu que os doentes passassem a ter uma esperança de vida praticamente igual à de pessoas da mesma idade sem a doença.

A investigação dos mecanismos provocadores das doenças não pára, como não pára o avanço dos métodos de diagnóstico, a investigação farmacológica e a determinação cada vez mais precisa do tratamento adequado a cada doença e a cada pessoa — medicina de precisão.

As pessoas diagnosticadas com leucemia ou linfoma, tratadas segundo os princípios modernos, tornam-se sobreviventes a longo prazo das suas doenças.

Por vezes, os tratamentos deixam marcas resultantes de toxicidade de quimioterapia ou radioterapia, mas os últimos 30 anos viram acontecer a tradução do conhecimento biológico fundamental em avanços terapêuticos com o aparecimento de uma lista extensa de tratamentos inovadores, alguns verdadeiramente revolucionários no seu impacto na história natural destas doenças.

Do inovador ao revolucionário, há sem dúvida enormes conquistas em esperança e qualidade de vida!

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