Menos carros, mais pessoas. Estas são as ideias (vencedoras) de estudantes suecos para a Mouraria

Trocar o espaço automóvel por circuitos cicláveis, usar tuk-tuks como transporte público, instalar mobiliário urbano. Dupla de estudantes suecos repensou a Mouraria para a tornar mais sustentável.

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Os estudantes suecos estiveram em Lisboa para repensar a Mouraria Dreamers Inc.
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À boleia da competição Students Reinventing Cities (estudantes a reinventar cidades, em português), Martyna Idasiak e Ralph Frühwirth, alunos do mestrado em Design Urbano Sustentável​ da Universidade de Lund, na Suécia, repensaram o bairro da Mouraria, em Lisboa. Propuseram menos carros e menos estacionamentos, que seriam substituídos por áreas verdes, habitação acessível e mais transportes públicos.

No projecto dos jovens suecos, o desenho actual do bairro da Mouraria dá lugar a uma paisagem com mais percursos a pé e cicláveis, mais mobiliário urbano, mais espaços verdes com vegetação e melhores ligações de transportes públicos, com algumas ideias inovadoras, como como os tuk-tuks turísticos que inundaram a capital nos últimos anos a servirem de transporte para os moradores. Isto porque, reconhece a dupla de estudantes, “as ruas da Mouraria estão sobrelotadas de veículos, deixando pouco ou nenhum espaço para as pessoas”.

O exercício feito por Martyna Idasiak e Ralph Frühwirth resulta da competição internacional Students Reinventing Cities que, como o nome sugere, convida estudantes a reinventar cidades ou, mais concretamente, a "imaginar um futuro mais sustentável e inclusivo", explica a organização no site do concurso. Este foi o único projecto a repensar uma cidade portuguesa. No concurso participaram outras 11 cidades de todo o mundo como Barcelona, em Espanha, Milão ou Roma, em Itália, ou Freetown, na Serra Leoa, mas a dupla que se debruçou sobre o bairro da Mouraria foi a vencedora.

O concurso é promovido pela C40 Cities, uma rede internacional que tem como objectivo combater as alterações climáticas. Por cá, o concurso foi organizado pela agência de energia e ambiente Lisboa E-Nova e integrado no projecto HUB-IN, que pretende precisamente regenerar zonas históricas.

O turismo e a gentrificação são alguns dos problemas identificados neste projecto. Os jovens defendem que “a dependência económica do turismo levou a uma desertificação gradual do bairro seguida pela substituição dos negócios locais por negócios orientados para o turismo”. Neste sentido, o espaço público acabou por “ser negligenciado” e a “disparidade entre as comunidades locais e os visitantes externos tem tido uma influência negativa na qualidade de vida” de quem lá vive. Martyna Idasiak e Ralph Frühwirth estiveram na Mouraria para conhecer as dinâmicas locais e chegaram a estas conclusões através de entrevistas e projectos participativos.

Menos carros, mais espaço para as pessoas

Transformar o estacionamento automóvel em espaços para usufruto da população é uma das ideias da dupla sueca. Ao tirar os carros do centro histórico, tendência que se tem verificado por toda a Europa, sobra mais espaço para percursos cicláveis e de caminhada, esplanadas de restaurantes, mobiliário urbano, estacionamento para bicicletas e pequenas oficinas para reparação destes veículos.

A ideia do reaproveitamento do estacionamento “não serve só para a melhoria da mobilidade suave”, mas também permite “criar uma ligação aos serviços do dia-a-dia” como a instalação de bancos para que os residentes mais velhos possam descansar no caminho para casa depois de uma ida ao supermercado. Tudo isto “melhora a qualidade geral do espaço público” e “é um importante passo na direcção de uma zona 100% livre de carros”.

Ainda assim, o estacionamento não desaparece do espaço público - é repensado. Os actuais lugares de estacionamento horizontais são substituídos por garagens verticais (em que os veículos são "empilhados" numa estrutura em altura) que libertam espaço para, por exemplo, a criação de espaços verdes que ajudam a regular a temperatura e a diminuir as emissões poluentes.

Tuk-tuks como transporte público

Usar os tuk-tuks como transporte público é outra das propostas de Martyna Idasiak e Ralph Frühwirth. Na perspectiva dos estudantes, as ruas do bairro da Mouraria “estão hoje repletas destes veículos” que, além de agradarem os turistas que visitam a cidade, também empregam a população local.

Por isso, a proposta é que se transformem numa alternativa sustentável de transporte público para servir a comunidade lisboeta e da Mouraria, em particular. Os tuk-tuks movidos a energia solar “têm como vantagem a dimensão” - são pequenos e enquadram-se nas ruas estreitas do bairro “que não permitem a passagem de grandes veículos como autocarros”, lê-se na memória descritiva.

A vertente do transporte público assenta “numa cooperação entre os órgãos municipais e as empresas privadas” numa lógica de hop-on e hop-off com um investimento financeiro inicial reduzido na identificação das paragens para os utilizadores. Como a ideia é servir a comunidade, a proposta inclui “desconto nos bilhetes para quem tem residência permanente em Lisboa”.

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A herança cultural do bairro da Mouraria é preservada neste projecto. DR

Revitalizar edifícios antigos e devolvê-los à população

"Primeiro transformar e depois criar" é um dos motes. Os jovens identificam o "potencial adormecido" da Mouraria num conjunto de "edifícios negligenciados e abandonados, espaços públicos subutilizados e áreas abandonadas, fechadas e vedadas". A proposta seria recuperar esta herança e aliar tradição, arte e inovação.

A construção de habitação acessível nestes locais é também sugerida para "criar maior diversidade na tipologia de casas, equilibrando com o mercado de arrendamento a curto prazo" típico do turismo.

A mudança de paradigma dos actuais espaços lisboetas é concretizada com várias propostas. Para o Largo da Rosa, Martyna Idasiak e Ralph Frühwirth sugerem que seja criado um centro intergeracional com alojamento para idosos, jardim-de-infância, habitação acessível e uma área pública para eventos comunitários. Além disto, também projectam um espaço comunitário, com ateliers artísticos e escritórios partilhados na antiga estrutura industrial entre a Rua Damasceno Monteiro e a Travessa da Nazaré.

A Calçada de Santo André vê nascer uma área verde e uma praça pública e o parque de estacionamento da Rua Damasceno Monteiro e Calçada do Monte seria transformado num "mobility hub", com biblioteca, centro multimédia, escritórios, centro de logística e posto de carregamento para tuk-tuks eléctricos.

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