O papel da agrobiodiversidade na redução da aplicação de pesticidas

Revisitarmos os pesticidas exige que pensemos não só na produção, mas também em todo o sistema alimentar e na cadeia de valor associada.

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A utilização massiva de pesticidas começou como uma grande história inicial de sucesso há muitas décadas, levando a produtividades garantidas na agricultura convencional, a um controlo não manual das ervas daninhas e a uma agricultura mais previsível, rentável e homogénea.

No entanto, este cenário rapidamente se tornou problemático, uma vez que se começou a perceber a influência direta dos pesticidas na biodiversidade e na saúde humana e a sua influência indireta na evolução global dos tipos de sistemas de produção vegetal.

Com o aumento da utilização dos pesticidas, observou-se uma simplificação da rotação de culturas, uma homogeneização das paisagens, e a perda acentuada de serviços de ecossistema que por sua vez limitam a produção vegetal. Um dos maiores exemplos é a perda de polinização, e mais recentemente o declínio nas populações de aves.

Os pesticidas permitiram também o desenvolvimento de uma agricultura industrial e das agroindústrias associadas, e tiveram indiretamente um papel importante na evolução dos regimes alimentares que vemos atualmente.

No contexto que vivemos de alterações climáticas, degradação dos solos e incertezas associadas a crises demográficas e conflitos mundiais (que perturbam as cadeias de produção e distribuição de alimentos), torna-se absolutamente necessário reconsiderar a atual utilização de pesticidas.

Revisitarmos os pesticidas exige que pensemos não só na produção, mas também em todo o sistema alimentar e na cadeia de valor associada.

Uma das primeiras formas de reduzir os pesticidas é apostar na reintrodução da biodiversidade nos campos e nas paisagens, apostando nas misturas de variedades e espécies, nas rotações longas, que por sua vez trazem efeitos positivos, com um aumento generalizado da biodiversidade e dos serviços ecossistémicos, tais como o controlo de ervas daninhas, aumento do número de insetos voadores, armazenamento de carbono, melhoria da qualidade do solo e da água.

Mas não há bela sem senão. Ainda precisamos, por exemplo, de mais investigação sobre o efeito das múltiplas formas de diversificação na prevalência de várias pragas, e sobre o efeito das alterações climáticas, em especial o stress hídrico, em sistemas mais agrobiodiversos.

O aumento da agrobiodiversidade pode aumentar a cobertura vegetal do solo e, consequentemente, a procura de água, o que pode ser crítico em regiões já por si mais suscetíveis à secura.

É preciso investigar e validar novas estratégias de biocontrolo, avaliar o potencial do holobionte, desenvolver equipamentos adaptados a culturas diversas, apostar em programas de melhoramento para novas variedades resistentes a pragas e integrar as estratégias numa mudança do sistema alimentar.

A agrobiodiversidade inclui a interação entre o ambiente, os recursos genéticos, a gestão do campo e as práticas agrícolas. Traz muitos benefícios aos sistemas agrícolas, sendo uma componente essencial da gestão integrada das culturas e das estratégias de baixo consumo que apoiam o desenvolvimento de sistemas de cultivo saudáveis.

O projeto europeu RADIANT, coordenado pela Universidade Católica Portuguesa, numa colaboração entre 29 parceiros, visa responder a algumas destas questões, valorizando simultaneamente cadeias de valor que promovam sistemas agrícolas mais sustentáveis.


A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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