Ministro da Educação considera que rankings das escolas são operação comercial

Em entrevista à RTP, João Costa explicou que a condição sócio-económica das escolas influencia os resultados. FNE diz que resultados são “mais do mesmo” e Fenprof considera “ranking” uma fraude.

Foto
João Costa sublinhou que os resultados dos alunos mais desfavorecidos têm melhorado nos últimos anos LUSA/MIGUEL A. LOPES

O ministro da Educação, João Costa, atribuiu, esta sexta-feira, aos rankings das escolas divulgados pela comunicação social um estatuto de "operação comercial", ao hierarquizarem estabelecimentos de ensino em função dos resultados dos exames, ignorando variáveis de contexto socioeconómico.

"Olho para a escola que aparece num dos rankings no último lugar, a Escola Secundária da Baixa da Banheira. Essa escola tem uma percentagem de alunos de 70% com Acção Social Escolar, tem uma percentagem de alunos migrantes elevadíssima e o trabalho que essa escola faz para garantir que aqueles alunos que recebem, sem condições em casa, que muitas vezes chegam à escola com fome, chegam à conclusão do ensino secundário, requer um esforço muito maior do que pegar numa elite de alunos muito privilegiados, que têm uma série de recursos que pagam explicações etc... e levá-los a melhores resultados", defendeu João Costa, em entrevista à RTP.

Para o ministro, o maior desafio que se coloca aos sistemas educativos a nível mundial é melhorar a condição socioeconómica das famílias: "Infelizmente continua a ser o contexto familiar e a condição socioeconómica das famílias o principal preditor do sucesso ou do insucesso e essa deve ser a nossa grande batalha".

O Ministério da Educação tem divulgado outros indicadores de contexto, a par dos resultados dos exames. João Costa destacou que algumas das escolas que surgem nas posições mais elevadas do ranking são as que "pior desempenham têm em termos de equidade".

"Vemos que há sempre um hiato entre os resultados dos alunos mais favorecidos e dos alunos menos favorecidos, mas que lentamente os resultados dos alunos mais desfavorecidos têm vindo a subir", declarou.

Instado a fazer um balanço do ano lectivo, João Costa admitiu preocupação com a instabilidade que as escolas viveram, devido às questões que opõem ministério e sindicatos, referindo que não conseguindo responder a "todas as legítimas aspirações dos professores", foram dados passos nas negociações entre as partes e admitiu que há ainda matérias a negociar com as organizações sindicais.

Resultados são "mais do mesmo", diz Federação Nacional da Educação

O secretário-geral da Federação Nacional da Educação (FNE) considerou que os resultados das escolas públicas no "ranking" são "mais do mesmo" e só poderão melhorar se o Ministério da Educação resolver problemas identificados.

"No "ranking" das escolas, mais uma vez, mais um ano, não verificámos que haja qualquer tipo de novidade. Acaba por não ser noticia já o facto de as escolas privadas sistematicamente obterem melhores resultados que a escola pública. A análise é feita e os argumentos são sempre os mesmos", disse à Lusa Pedro Barreiros, a propósito da divulgação do "ranking" das melhores médias nos exames.

De acordo com o secretário-geral da FNE, tem de ser feita uma distinção entre escola pública e privada no que diz respeito à composição das turmas, dos níveis socioeconómicos, que tem acesso a formas compensatórias de aprendizagem.

"Isto tem impacto nos resultados escolares. Acredito que haja quem queria fazer nesta altura outro tipo de leituras e fazer associar a isto os efeitos da pandemia [de covid-19], da luta dos professores. Acredito que possa vir a ser utilizado quase como arma de arremesso", referiu.

Para Pedro Barreiros, o sistema público só terá melhores condições se tiver os mesmos mecanismos que o privado já tem.

"Será que as escolas privadas estão a oferecer melhores condições de trabalho do que as escolas públicas? Será que estamos a assistir à possibilidade de uma debandada dos professores do público para o privado à semelhança do que acontece com enfermeiros e médicos? Será que estas revindicações dos professores não são justas e legitimas e não se sentem ainda mais magoados pelo facto de o Ministério da Educação não os ouvir?", questionou.

Fenprof considera "ranking" das escolas "uma fraude"

A Federação Nacional dos Professores (Fenprof) considerou o "ranking" das escolas "uma fraude", depois de ter sido conhecida a queda dos estabelecimentos de ensino público na tabela das melhores médias nos exames.

"Continuamos a considerar os rankings uma fraude repetida anualmente em que se compara o incomparável", disse o secretário-geral da Fenprof, Mário Nogueira, após uma reunião do secretariado nacional da federação sindical.

Mário Nogueira assinalou ainda que o ministro da Educação, João Costa, "continue a disponibilizar informação que permite elaborar produtos que marginalizam as escolas públicas e discriminam os seus alunos".

Para o secretário-geral da Fenprof, as escolas públicas, ao contrário dos colégios privados, não escolhem os alunos, mas "recebem todos".

"Ainda bem que assim é, oxalá que assim continue a ser", salientou.

A presidente do Conselho Nacional da Fenprof, Manuela Mendonça, afirmou que os "rankings" não avaliam escolas.

"Há 22 anos, anualmente no dia em que saem os "rankings" das escolas a Fenprof toma posição, denunciando o que é uma mistificação. [...] Isso tem vindo a tornar-se mais claro. Não se podem comparar escolas cujas realidades educativas são distintas", indicou.

De acordo com Manuela Mendonça, não é possível comparar uma escola privada, que seleciona os seus alunos, com uma escola pública que recebe todos os alunos.

"Embora os "rankings" existam fundamentalmente para promover o ensino privado, [...] há também muitos outros dados, nomeadamente estudos, que provam que há mais alunos das escolas privadas a entrar nas universidades, porque têm médias mais elevadas, mas na universidade os alunos que se saem melhor são os alunos das escolas públicas", acrescentou.

Sugerir correcção
Ler 39 comentários