O Azul fez um ano a 22 de Abril, Dia da Terra. Para celebrar, preparámos uma série de trabalhos dedicada às zonas costeiras e aos desafios que enfrentam em plena crise climática. E terá uma conferência dedicada aos desafios das cidades costeiras em plena crise climática. Será no dia 12, no Porto. Pode inscrever-se gratuitamente aqui. Também teremos workshops no dia 11, no Porto (a inscrição é feita no mesmo link).

Os últimos dias foram muito intensos no activismo estudantil português: alunos de várias escolas e faculdades juntaram-se em "ocupações", montando as suas tendas para reivindicar o fim dos combustíveis fósseis até 2030 e electricidade 100% renovável e acessível a todas as famílias até 2025. Parece impossível? Pois bem: dizem-nos que só levantam arraiais quando 1500 pessoas se comprometerem a participar numa acção directa no terminal de gás natural — "que não é nada natural, é gás fóssil", repetem os alunos — do porto de Sines, a 13 de Maio.

Se pensarmos na crise climática como um beco sem saída — infelizmente, a metáfora não está muito longe da realidade —, estes jovens trazem ferramentas muito válidas para quebrar o muro que nos impede de continuar o caminho. Querem seguir em frente. Ver o mundo que há além. Acreditar no futuro. E precisam do apoio da sociedade para fazer esta revolução com a força necessária.

Comecei as minhas andanças na semana passada, nas faculdades de Letras e de Psicologia da Universidade de Lisboa. Esta semana, regressei à cidade no dia 2 — quando começou, a nível internacional, a "Primavera das Ocupas" do movimento Fim ao Fóssil: Ocupa!" — para aterrar numa verdadeira batucada à porta da escola António Arroio, onde os alunos fecharam os portões a cadeado. Foi assim uma manhã, depois outra. Perante uma comunidade perplexa, os alunos gritavam: "É a revolução, malta!"

No Liceu Camões, voltei a encontrar a Clara, estudante do 12.º ano que desde a primeira greve climática estudantil se tem envolvido neste activismo, e que me tinha falado sobre as ocupações de Novembro. Na terça-feira, os planos passavam por não interromper as aulas, antes por organizar actividades, chamar a comunidade para o diálogo. Na quinta-feira, a escola amanheceu trancada. Porquê trocar os planos de uma "ocupação" pacífica, vibrante e com várias actividades, por um cadeado no portão da escola? Havia menos pessoas mobilizadas, conta-me, e sente que a acção desta quinta-feira teve mais impacto a nível dos alunos da escola. E há também a outra face da moeda: "É assim que os media vêm e que as câmaras olham para nós."

Isto deixou-me a pensar sobre o papel da comunicação social nesta história. Do lado dos pais, ouvi a Rita Assunção, que tem uma filha no 12.º ano que não se juntou às ocupas mas, com outros dois jovens activistas em casa, é uma mãe que sabe bem o quanto "se sentem injustiçados porque dedicam muito trabalho e nunca têm atenção". "Só quando fecham ministérios é que vão lá." 

Foi interessante perceber também as diferentes formas de gerir as "ocupações". Os alunos da secundária António Arroio, em Lisboa, fecharam a escola durante dois dias seguidos. Inspiraram, talvez, os colegas do Camões, que hoje amanheceram de portões trancados. Nas faculdades, por outro lado, os estudantes têm preferido apostar na presença nos corredores. Organizam palestras, organizam refeições gratuitas, abrem o diálogo. À noite, recolhem às tendas.

Aqui e ali, uma erupção (como a espécie de barricada montada no gabinete do director da Faculdade de Letras, Miguel Tamen, na quarta-feira), mas, em geral, se descontarmos a inquietação que paira no ar como que a perguntar "até quando?", as ocupações têm sido tranquilas. Aliás, mais a norte, na faculdade de Letras da Universidade do Porto, foram mesmo silenciosas. "Nós planeámos uma manifestação pacífica, íamos fazer barulho, mas tudo dentro dos conformes, entretanto a direcção veio falar connosco e disse que não podíamos perturbar as aulas nem a paz da universidade", contou um dos estudantes à nossa colega Renata Mendes. Como não os "deixaram fazer barulho" durante a manifestação, os activistas decidiram manifestar-se "silenciosamente". Mas será que assim alguma coisa muda?

Nestes dias de ocupações e de escolas fechadas pelos estudantes, ouvi não apenas os miúdos do lado de lá dos portões, mas também aqueles que ficam no passeio. Senti em muitos deles frustração, noutros uma certa revolta, em particular os do 12.º ano, altura decisiva para o seu futuro profissional. Apesar de estarem conscientes que as alterações climáticas vão tornar o seu futuro cada vez mais difícil, e muitos solidários com a luta dos colegas, a verdade é que vários deles não têm o privilégio de abdicar dos cursos ou dos empregos que os esperam depois de terminar este ano desafiante. Não consegui deixar de pensar nos meus tempos do secundário, quando acreditava que o melhor era mudar o sistema por dentro, de forma ordeira. Ainda acredito nisso, pelo menos em parte, mas o que aprendi desde então é que a mudança chega de várias maneiras  e essa diversidade é importante.

A própria Clara Pestana, aos 17 anos, já o sabe: "Há muitos grupos a lutar pelo clima de maneira diferente. Não é por haver esta acção que deixa de haver outras formas de agir". Ou, como me dizia a Elsa Childs, presidente da associação de pais do Liceu Camões, "muito pior do que um cadeado no portão é uma geração inteira deixar de acreditar que pode fazer a diferença." Ao seu lado, o Luís Ferreira — outro membro da associação de pais — sublinhava a importância de dar apoio a estes jovens. "Não lhes matem os sonhos. É uma luta que devia estar a ser feita por todos, diariamente."

Não são só os pais que se juntam à causa dos filhos. No Azul, a Andréia Azevedo Soares foi conhecer a Frente Grisalha pelo Clima, um grupo de pessoas que conhecemos em Novembro do ano passado, quando os protestos pelo clima levaram à detenção de quatro jovens em Lisboa. É um movimento informal, com pessoas de "diferentes idades" (muitas delas ainda não são grisalhas, devo acrescentar), que apoia publicamente a Greve Climática Estudantil e o Movimento Fim ao Fóssil. 

Ainda no Camões, encontrei também o Dinis Costa, do 11.º ano, que me contou que estiveram a preparar o bloqueio da escola até às duas da manhã e acordaram às seis para garantir que os portões estariam trancados. Dormir pouco? "É um sacrifício que estamos dispostos a correr." Os seus pais não se preocupam? "Sempre foram de lutar por aquilo que acreditam." Não acham que estão a exigir demasiado de uma só vez? "Há tanta coisa para fazer que pedir uma única coisa é pouco."

Tantas formas diferentes de lutar. Tantas formas diferentes de apoiar. Tantas formas diferentes de agir na medida do possível, na medida do nosso mundo: fechando uma escola, manifestando solidariedade, exigindo a mudança. O que vi e ouvi nestes dias de correria entre "ocupações" trouxe-me mais perguntas do que respostas, tantas coisas para reflectir. Mas, por mais que estes meios de luta nos deixem perplexos, há algo em que estamos certamente de acordo com estes jovens em rebelião: as coisas não podem continuar como estão.