Fausto Airoldi: gastronomia de Macau foi das primeiras cozinhas de fusão

Para o chef Fausto Airoldi, a culinária macaense é das primeiras cozinhas de fusão do mundo. Mas os melhores pratos ainda são servidos à mesa das famílias.

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"A boa cozinha macaense ainda está nas famílias de Macau", defende Fausto Airoldi Nuno Ferreira Santos (Arquivo)

Fausto Airoldi defende que a gastronomia de Macau é uma das primeiras cozinhas de fusão do mundo. "Não mete só a cozinha portuguesa; mete a cozinha da Índia, da Malásia. Tem a influência de Hong Kong, inglesa", afirma o chef em entrevista à agência Lusa.

Fausto Airoldi conheceu a cozinha macaense na juventude, quando a mãe foi trabalhar para Macau. Mais tarde, em 2013, seria ele a trabalhar na região, onde integrou a equipa do Galaxy Macau como chefe executivo de R&D - Research and Development (investigação e desenvolvimento) e teve 120 restaurantes para gerir.

Na sua opinião, quase todos os pratos da cozinha macaense "têm essa fusão espelhada, de uma forma ou de outra". E dá exemplos: "Têm um arroz de pato que fica do tipo da nossa cabidela. Usam pato em vez de galinha. Têm um porco à bassafá que leva tamarindo, com mais influência da Malásia. Têm a nossa feijoada e, obviamente, alguns pratos de bacalhau, que eles também usam".

"A cozinha macaense tem muito a ver também com a cantonesa, que é uma cozinha muito saborosa, com cebolas, alhos. Em algumas coisas metem o gengibre e o picante. Depois, também usam produtos daquelas zonas, como o açúcar e o açafrão da Índia. Têm muitas ervas diferentes das nossas", refere.

Para Airoldi, "infelizmente, ou felizmente, a cozinha macaense ainda é muito cozinha de casa". "A boa cozinha macaense ainda está nas famílias de Macau", diz. "Aquilo que se vê nos restaurantes é uma coisa que é vendável, digamos, a um público mais chinês, que vem à procura de comida macaense, como o minchi, o bassafá, que são pratos que as pessoas vêm comer a Macau porque acham que é cozinha macaense", aponta. "Os restaurantes, infelizmente, não fazem uma cozinha macaense tão boa como na casa das pessoas", lamenta, ressalvando algumas excepções.

Por esta razão, acredita que a modernização vai chegar a Macau. "O que eu senti quando lá cheguei foi o que senti em Portugal quando cá cheguei, há 30 anos. [A cozinha] estava um bocadinho estagnada, não havia modernização, e a cozinha macaense vai passar por essa modernização nos próximos anos", defende.

Uma modernização que terá de levar em conta a especificidade da região da China, "onde há muitas pessoas de todo o mundo" e que são "muito sensíveis culturalmente". O chefe exemplifica com o universo do Galaxy Macau, onde trabalhou nove anos, que tinha 18.000 empregados: "Europeus, americanos, da Malásia, Tailândia, Filipinas, indianos, vietnamitas, obviamente muitos chineses e alguns macaenses". "Havia restaurantes de quase todas as nacionalidades e obviamente macaenses e portugueses porque em todos os casinos tem de haver um restaurante macaense e um outro português, por lei", lembra.

Para Airoldi, a modernização deve ser feita, mas "respeitando a tradição", seja em Macau ou em Portugal, onde este passo já foi dado. "Temos de inovar respeitando a tradição. Se fizermos isso, conseguimos chegar a um ponto em que o estrangeiro, quando come cá, percebe os nossos sabores", defende o chef, actualmente a trabalhar num projecto na Comporta, em Portugal.

Recorda o que aconteceu com a cozinha portuguesa que, "é muito saborosa", mas "há 30 anos era muito mal apresentada". "Olhamos para uma açorda e sabemos o que é, mas um estrangeiro olha para uma açorda com um ovo cru em cima e questiona-se sobre o que ele vai comer", observa. "Temos de ter essa noção. Vivemos num mundo turístico, em que os turistas vêm de todo o mundo e temos de apresentar as coisas de uma forma mais profissional."

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