Viver com frio, calor e bolor. Zero leva 315 relatos de pobreza energética ao Governo

Associação Zero entrega esta terça-feira ao Governo testemunhos da pobreza energética no país. Frio no Inverno, um ar irrespirável no Verão, humidade e bolor – “não posso dormir em nenhuma divisão”.

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A associação ZERO recolheu centenas de testemunhos no âmbito da campanha Casa Quente para Toda a Gente Guillermo Vidal

O apelo é transversal: “preciso de ajuda”. Anonimamente, 315 pessoas contaram o que se passa entre quatro paredes - chove dentro de casa, a roupa nos armários fica estragada por causa da humidade, há bolor nas paredes, não há dinheiro para combater o frio com o aquecimento. E, nas noites quentes de Verão, dormir é tarefa difícil. São as vozes de quem sabe que não se pode dar "ao luxo" de ter uma casa confortável.

Esta terça-feira, a associação ZERO vai entregar junto do Ministério do Ambiente e Acção Climática e do Ministério da Habitação, 315 testemunhos recolhidos entre 28 de Fevereiro e 27 de Março de 2023 que procuram dar visibilidade, alertar e sensibilizar a população para a pobreza energética no contexto nacional.

“Já chegou aos 35 graus dentro de casa"; "Não me posso dar ao luxo de ter a casa confortável"; "Não posso dormir em nenhuma divisão"; "Em Janeiro de 2023, pagámos 330 euros de factura de electricidade e gás natural, para manter algumas divisões da casa entre o 18 e os 20 graus, porque temos um recém-nascido", são apenas algumas das frases nos testemunhos confiados à Zero.

Aqui estão as histórias de quem ainda insiste em tentar a aquecer a casa no Inverno e recebe, no fim do mês, uma factura insuportável, mas também de muitos que já não o fazem, e recorrem antes a mantas, roupas e botijas de água quente. O frio não é o único problema.

Chuva dentro de casa, a humidade a entrar pelas paredes, o bolor a pintar os tectos de preto, a roupa nos armários desfeita pelo mofo, os aquecedores desligados quando faz frio, sem forma de arrefecer o lar quando faz calor.

Os testemunhos foram recolhidos no âmbito da campanha Casa Quente para Toda a Gente, que procura “dar visibilidade a esta realidade e ajudar a dar voz às pessoas que aparentemente não são ouvidas pelas entidades que deveriam trazer soluções para combater a pobreza energética”, lê-se no site da iniciativa.

A associação ZERO, segundo um comunicado de imprensa, pretende desta forma “reforçar a importância da aprovação" da Estratégia Nacional de Longo Prazo para o Combate à Pobreza Energética, que alinhada com a Estratégia Nacional de Longo Prazo para Renovação dos Edifícios (ELPRE PT) e outras medidas nacionais "será um grande passo no combate à pobreza energética".

A associação vai bater a duas portas. Primeiro, prevê-se uma primeira entrega dos testemunhos junto à Secretária de Estado da Energia e Clima, Ana Gouveia, “que já confirmou que receberá pessoalmente, também em representação do Ministro Duarte Cordeiro”, informa a ZERO. Os depoimentos serão depois também entregues no Ministério da Habitação.

O que é a pobreza energética?

Em comunicado de imprensa, a ZERO define a pobreza energética como “a incapacidade de manter a habitação com nível adequado de serviços energéticos essenciais, devido a uma combinação de baixos rendimentos, baixo desempenho energético da habitação e custos com energia”. Adiantam ainda que cerca de 3 milhões de cidadãos vivem num contexto de pobreza energética e que mais de 70% dos edifícios são ineficientes a nível energético.

Para combater estas condições a ZERO “exige medidas urgentes”. O principal objectivo da acção desenvolvida é o de “chamar a atenção para a importância da aprovação da Estratégia Nacional de Longo Prazo para o Combate à Pobreza Energética 2022-2050”, que esteve em consulta pública até 3 de Março de 2023.

A associação quer “intervenções verdadeiramente estruturantes", desde “uma estratégia alinhada com metas e objectivos nacionais, além da Estratégia de Longo Prazo para a Renovação dos Edifícios (ELPRE), e em coordenação efectiva com outras políticas (saúde, alterações climáticas, pobreza, habitação, entre outras)”.

Assim, a recolha e entrega dos 315 testemunhos, recebidos de pessoas residentes em 118 concelhos, vem tentar aproximar a realidade nacional dos decisores políticos, para que as pessoas possam ser ouvidas e com o intuito de incentivar medidas para combater a pobreza energética.

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