Putin marca aniversário da anexação da Crimeia com visita à província

Visita acontece no dia em que é prolongado o acordo que permite a exportação de cereais pela Ucrânia através do mar Negro.

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O governador pró-russo de Sevastopol, Mikhail Razvozhaiev, e o Presidente russo, Vladimir Putin, visitam um centro de arte para crianças Reuters/SPUTNIK

O Presidente da Federação Russa, Vladimir Putin, fez este sábado uma visita surpresa à Crimeia, província ucraniana que Moscovo conquistou e anexou em 2014, numa acção não reconhecida internacionalmente, para marcar o nono aniversário do dia da anexação, segundo vários media russos.

Ao lado do governador de Sevastopol, Putin visitou um centro de artes para crianças – a escolha foi vista como uma espécie de resposta ao Tribunal Penal Internacional. Na véspera, o TPI emitiu um mandado de detenção para Putin e para a comissária dos direitos das crianças da Rússia, Maria Lvova-Belova, dizendo que tem indícios suficientes do envolvimento dos dois na transferência forçada de milhares de crianças ucranianas a Rússia ou zonas da Ucrânia ocupadas pela Rússia (como é o caso da Crimeia).

Este foi o primeiro mandado de detenção do TPI para responsáveis de um dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU. O TPI recomeçou ainda, em Outubro do ano passado, uma investigação de crimes graves cometidos no Afeganistão, que poderão incluir crimes cometidos pelas forças dos EUA.

Nem os EUA nem a Rússia ratificaram o Estatuto de Roma, que criou o TPI, mas países onde tenham sido cometidos crimes podem pedir a jurisdição, mesmo que não sejam, eles próprios, signatários, como é o caso da Ucrânia (o Afeganistão é signatário). Ao fazê-lo, admitem a investigação de crimes cometidos por qualquer parte no conflito.

Putin não fez ainda qualquer comentário público sobre o mandado, mas a porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros considerou, ainda na sexta-feira, que este não tem qualquer valor, “incluindo legal”. Na prática, o mandado significa que Putin não poderá deslocar-se a países signatários do tratado sem arriscar uma detenção.

Tem sido discutido se se aplicaria imunidade diplomática por ser um chefe de Estado em funções, mas num caso anterior, em 2015, o Supremo da África do Sul considerou que o Presidente do Sudão, Omar al-Bashir devia ser preso durante uma visita ao país (Bashir acabou por sair do país antes de ser detido, mesmo contrariando uma decisão judicial).

De qualquer modo, Putin já não viaja desde o dia da invasão em larga escala da Ucrânia que começou a 24 de Fevereiro de 2022 (a excepção foi uma visita ao aliado bielorrusso em Minsk) e mesmo antes, com a pandemia, raramente se deslocava.

O veredicto do TPI foi, no entanto, encarado como tendo uma grande importância simbólica pela Ucrânia, pelos seus aliados ocidentais, e por organizações de defesa de direitos humanos como a Human Rights Watch.

Não foram divulgadas imagens de quaisquer comentários de Putin durante a visita à Crimeia, apenas do Presidente russo ao lado do governador da maior cidade da península durante a visita. Na véspera, Putin terá apenas comentado que “as questões de segurança têm a máxima prioridade para a Crimeia e Sevastopol neste momento”.

Este sábado, o governador pró-russo da província, Mikhail Razvozhaiev, fez um anúncio no Telegram: “o nosso Presidente Vladimir Vladimirovich Putin sabe como surpreender. De um bom modo”, declarou. “Está cá pessoalmente”, sublinhou, quando tinha sido prevista apenas uma participação por vídeo. “Porque numa data tão histórica, o Presidente está sempre com Sevastopol e o povo de Sevastopol.”

Da Europa, vieram declarações lembrando que a anexação foi ilegal e não é reconhecida, afirmações feitas, no dia do aniversário, pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros da Finlândia ou da Suécia, nota a emissora Euronews.

Extensão de acordo dos cereais

Este sábado foi ainda anunciada a extensão do acordo para a saía de cereais da Ucrânia através do mar Negro, um acordo patrocinado pelas Nações Unidas e pelo Presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, embora a Ucrânia tenha dito que o acordo iria vigorar durante os próximos 120 dias e a Rússia dissesse que eram apenas 60 dias.

A porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros enviou uma cópia de uma carta da representação permanente às Nações Unidas, dizendo que Moscovo não se oporia a que o acordo fosse prorrogado por 60 dias, até 18 de Maio, segundo a agência Reuters.

Mas acrescentava que um novo prolongamento “só será possível” após “progressos concretos” na “exportação de alimentos e fertilizantes russos”, cita ainda a agência britânica. Estas exportações não foram visadas em concreto pelas sanções ocidentais, impostas na sequência da invasão e guerra que leva a cabo na Ucrânia, mas Moscovo diz que estão a ser prejudicadas por causa das sanções que afectam sistemas de pagamentos, logística e seguros.

Notícia corrigida às 20h20 de 18.3.2023. Por um lapso de edição, foi acrescentada, numa versão anterior do texto e no título, a palavra “russa” para descrever a província da Crimeia. Mas, como se lê no texto, a anexação pela Rússia da província ucraniana nunca foi reconhecida, pelo que se trata de uma província ucraniana. A versão final, já sem a palavra russa, não foi actualizada, pelo que se fez depois a correcção.

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