Presidente da BBC sob pressão por alegado envolvimento num empréstimo concedido a Boris Johnson
Deputados apontam “erros de avaliação significativos” de Sharp por ter apresentado um empresário que foi fiador do ex-primeiro-ministro quando era candidato à chefia da emissora pública.
A comissão parlamentar de Digital, Cultura, Media e Desporto da Câmara dos Comuns do Reino Unido (DCMS, na sigla em inglês), divulgou este domingo um relatório muito crítico sobre a actuação do presidente da BBC, Richard Sharp, por causa do seu envolvimento, como alegado intermediário, num caso polémico de concessão de um empréstimo avultado ao então primeiro-ministro conservador, Boris Johnson, numa altura em que Sharp era candidato à chefia da emissora pública britânica.
A comissão – composta por deputados do Partido Conservador, do Partido Trabalhista, do Partido Nacional Escocês e por alguns independentes, e chefiada por um dirigente conservador –, diz que Sharp cometeu “erros de avaliação significativos” e que devia “considerar o impacto que as suas omissões terão na confiança nele próprio, na BBC e no processo de nomeações públicas”.
Em declarações aos deputados, na semana passada, Sharp confirmou ter contactado o cabinet secretary, Simon Case – o dirigente que está no topo da hierarquia da Administração Pública britânica e que dá apoio ao primeiro-ministro e ao seu gabinete –, em Dezembro de 2020, para lhe passar o contacto de um primo afastado, o empresário Sam Blyth.
Segundo o Sunday Times, Blyth assumiu, mais tarde, o papel de fiador num empréstimo que foi concedido a Boris Johnson, quando este chefiava o Governo britânico, no valor de 800 mil libras (cerca de 904 mil euros) – o empresário afirmou, entretanto, que o valor “é bem menor do que aquele que foi noticiado e que não foi totalmente entregue”.
Cerca de um mês depois dessa conversa com Case, Sharp foi nomeado pelo Governo, com o aval do primeiro-ministro e do ministro da Cultura, como candidato preferencial para presidente da BBC. Depois de receber o apoio da DCMS, assumiu oficialmente o cargo em Fevereiro de 2021.
Antigo banqueiro que trabalhou durante mais de duas décadas na Goldman Sachs, e conhecido financiador do Partido Conservador, Richard Sharp garantiu — precisamente por estar a candidatar-se à liderança da BBC — que informou imediatamente Case sobre esse facto e explicou-lhe que o seu papel terminava com a introdução de Blyth, de forma a “evitar um conflito ou percepção de conflito de interesses”.
This damming report makes the BBC Chair’s position increasingly untenable because it throws into serious doubt the impartiality and independence that is so fundamental to trust in the BBC. The Conservatives’ cronyism is dragging down the BBC when we should be building it up. pic.twitter.com/qiQipyLeRJ
— Lucy Powell MP (@LucyMPowell) February 12, 2023
“Não ofereci aconselhamento financeiro a nenhum funcionário do antigo primeiro-ministro. Não sei nada sobre os seus assuntos [financeiros], nunca soube. Não facilitei nenhum empréstimo”, afiançou aos deputados, rejeitando ter servido de intermediário no processo.
No seu relatório, a DCMS diz, no entanto, que, ao decidir “não revelar as suas acções ao painel [de deputados] e à comissão” no caso concreto, ocorrido durante um processo de nomeação, “mesmo sabendo que isso seria totalmente apropriado”, Sharp “violou os padrões que são exigidos a pessoas que se candidatam a cargos públicos”, como o de presidente da BBC.
“As decisões de Richard Sharp, primeiro envolvendo-se na facilitação de um empréstimo ao então primeiro-ministro, ao mesmo tempo que se candidatava a um emprego que dependia dessa mesma pessoa; e depois não revelando a sua relação material [com o caso], foram erros de avaliação significativos, que prejudicam a confiança nos processos de nomeações públicas e que podem dissuadir indivíduos qualificados de se candidatarem a esses cargos”, critica a comissão.
Lucy Powell, “ministra-sombra” da Cultura, do Partido Trabalhista, na oposição, diz que o relatório da DCMS deixa Sharp numa posição “cada vez mais insustentável” e “lança sérias dúvidas sobre a imparcialidade e a independência consideradas fundamentais para se confiar na BBC”.
“O clientelismo dos conservadores está a atirar a BBC para baixo, quando devíamos estar a desenvolvê-la enquanto alicerce da nossa economia criativa”, acrescentou, numa mensagem publicada no Twitter.