Russas vão dar à luz à Argentina para obterem cidadania nova para os filhos

A garantia de um passaporte valioso, numa altura de forte isolamento da Rússia por causa da guerra, tem levado muitos casais a procurar maternidades em Buenos Aires.

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Buenos Aires é cada vez mais procurado por russos para terem os seus filhos EPA/JUAN IGNACIO RONCORONI

Há cada vez mais russas a viajarem para a Argentina para dar à luz, de acordo com os dados de maternidades e agências especializadas em viagens com fins clínicos. A tendência entre as famílias russas não é nova, mas a invasão da Ucrânia e o consequente isolamento internacional de Moscovo tem intensificado a prática.

Segundo Kirill Makoveev, fundador da RuArgentina, uma de várias empresas especializadas em organizar viagens de russos para o país sul-americano para fins médicos, a procura do país por grávidas “cresceu entre dez e 15 vezes desde o início da guerra”. Ao jornal argentino Perfil, o empresário calcula que todos os dias cheguem a Buenos Aires entre 20 e 30 mulheres russas com intuito de ter os seus partos no país, contabilizando apenas as chegadas em voos da companhia Turkish Airlines.

No ano passado, emigraram para a Argentina entre 2000 e 2500 russos, segundo o director do departamento consular da embaixada russa em Buenos Aires, Georgi Polin, citado pelo Guardian. “Em 2023, esse número pode subir para dez mil”, acredita o responsável diplomático, sublinhando que uma fatia importante dos russos que procura a Argentina pretende que os seus filhos nasçam no país.

A opção pela Argentina deve-se aos bons cuidados de saúde e aos baixos custos quando comparados com a Rússia, onde, segundo disse Makoveev, “a medicina está no século XIX”.

Porém, a razão mais forte para os pais russos optarem pelo nascimento numa maternidade argentina é a possibilidade de a criança adquirir a nacionalidade do país. “Um passaporte argentino irá abrir muitas portas para o meu filho”, dizia ao Guardian a russa Polina Cherepovitskaia, que em Dezembro deu à luz numa maternidade de Buenos Aires.

Segundo Eva Pekurova, que gere outra agência que organiza viagens clínicas entre a Rússia e a Argentina, o passaporte argentino permite a entrada em 171 países sem necessidade de pedido de visto, incluindo a União Europeia e os EUA, enquanto o russo, antes da guerra, já só tinha isenção de visto para 80 países. Com a imposição de sanções económicas e diplomáticas, viajar para a generalidade dos países ocidentais tornou-se tarefa quase impossível para um cidadão russo desde o início da guerra na Ucrânia.

As famílias russas que procuram agências como a de Pekurova podem pagar até quase nove mil euros só para obter apoio na marcação das consultas, arranjar local onde ficar no país, serviços de tradução e ajuda no processo burocrático.

Até à invasão da Ucrânia, os russos costumavam dirigir-se a Miami, nos EUA, no fim das gravidezes, para que os filhos obtivessem a cidadania norte-americana, disse Pekurova, que organizava viagens para a cidade da Florida. “Antes da pandemia, Miami era o sítio para ir, mas agora é a Argentina”, afirmou.

Para além da nacionalidade argentina atribuída automaticamente à criança, os pais também ficam com o processo de obtenção da cidadania mais facilitado.

Na maternidade do hospital Finochietto, em Buenos Aires, num só mês do ano passado foram registados 50 nascimentos de bebés de pais russos, correspondente a 25% do total de partos, segundo dados da própria instituição. “Nos últimos seis meses assistimos a um aumento da procura de partos [por cidadãos russos]”, disse ao Perfil o porta-voz do hospital, Guillermo Capuya.

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