Cravinho detém imobiliária com sócio condenado por fraude fiscal

Ligação a Marcos Lagoa conhecida numa altura em que o ministro está sob fogo da oposição por causa da derrapagem nas obras do hospital militar, que ocorreram quando liderava a pasta da Defesa.

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João Gomes Cravinho tem quota em empresa imobiliária desde 2015 Nuno Ferreira Santos

O ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, participa no capital de uma empresa imobiliária juntamente com um sócio condenado por fraude fiscal, avançou este domingo a CNN. A empresa em causa tem como sócio Marcos Lagoa, condenado no processo que lesou os CTT através da venda de imóveis, e já teve como sócio António Barão, que participou num negócio que prejudicou o Novo Banco em 270 milhões de euros. À CNN, o ministro, que tem estado debaixo dos holofotes mediáticos por causa da derrapagem das obras do Hospital Militar de Belém quando tutelava a Defesa, disse que "não tinha conhecimento dos problemas judiciais dos sócios".

João Gomes Cravinho tem uma quota de 1000 euros na sociedade imobiliária Eurolocarno, avança a CNN, adiantando que o ministro dos Negócios Estrangeiros declarou a existência desta quota na empresa na declaração de registo de interesses entregue no Parlamento, como o PÚBLICO pôde verificar, assim como na declaração única de rendimentos, património, interesses, incompatibilidades e impedimentos que entregou no Tribunal Constitucional.

A Eurolocarno foi criada em 2014 por António Barão, que era um dos sócios e também gerente. Barão foi um dos protagonistas dos negócios que prejudicaram o Novo Banco. Em Abril de 2021, esteve na comissão parlamentar de inquérito ao Novo Banco, por ter participado no negócio da venda dos imóveis do portfólio Viriato pelo Novo Banco, que gerou perdas de 270 milhões de euros. Actualmente já não é sócio e nunca o foi do ministro, garante o gabinete do ministro dos Negócios Estrangeiros numa nota que enviou ao PÚBLICO, informando que quando Cravinho se tornou sócio, em 2015, Barão já tinha saído.

"António João da Costa Silva Barão não é nem nunca foi sócio do ministro João Gomes Cravinho na empresa Eurolocarno, antes sim a pessoa a quem a empresa foi comprada, em 2015, através do advogado", diz a mesma nota.

De acordo com os registos no portal do Ministério da Justiça, consultados pelo PÚBLICO, em 2015, Marcos Lagoa assume-se como gerente da empresa, cargo que exerceu até 2019. João Gomes Cravinho tem uma quota de 1000 euros, que, segundo a declaração de registo de interesses, equivale a 20% do capital, e que, segundo o MNE, tem sido declarada "sempre". O MNE acrescenta que a empresa Eurolocarno "nunca teve qualquer problema com a justiça, tendo a sua situação judicial e fiscal regularizadas".

A lei não impede um membro do Governo de deter uma percentagem de capital numa empresa. A empresa é que pode ficar mais limitada, nomeadamente na participação em procedimentos de contratação pública quando o membro do executivo detém mais de 10% do capital.

Marcos Lagoa foi condenado a pagar 20 mil euros ao Estado, acrescidos de juros de mora, por ter sido o responsável pelo fundo de investimento imobiliário que comprou um prédio dos CTT, um negócio que terá lesado a empresa através da venda de dois imóveis. De acordo com a CNN, o ministro garante que "não tinha conhecimento dos problemas judiciais dos sócios".

A ligação de Cravinho a este sócio surge numa altura em que o ministro dos Negócios Estrangeiros está sob suspeita por causa da derrapagem no custo das obras do hospital militar. Na sexta-feira, o jornal Expresso adiantou que o ex-ministro da Defesa e actual ministro dos Negócios Estrangeiros foi informado em Março de 2020 de que o custo das obras no antigo Hospital Militar de Belém estava a derrapar.

O governante tem dito que desconhecia a derrapagem de mais de dois milhões de euros, mas um ofício citado pelo semanário, com data de Março de 2020, dava conta de que, já com as obras a decorrer, o director-geral de Recursos de Defesa Nacional – hoje arguido por corrupção e branqueamento na Operação Tempestade Perfeita –, informou o ministro sobre "trabalhos adicionais" que já somavam quase um milhão de euros a mais face aos 750 mil euros.

O ministro tem sido questionado pelos partidos sobre este caso. O PSD entregou recentemente 30 perguntas sobre o tema. Uma delas prendia-se com a data em que o titular da Defesa tinha ficado a saber da derrapagem no custo das obras. Cravinho estará esta terça-feira pelas 15h no Parlamento a ser ouvido na comissão parlamentar de Negócios Estrangeiros, na qual falará sobre política geral do ministério. A polémica do hospital militar refere-se à altura em que Cravinho estava na Defesa, pelo que é possível que este tema não seja ali abordado, continuando a aguardar esclarecimentos em sede de comissão de Defesa.

Notícia actualizada com esclarecimentos adicionais do Ministério dos Negócios Estrangeiros

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