“Nem sequer fixo o nome” do comprador, diz gestor envolvido em venda de imóveis do Novo Banco

António Barão participou no negócio da venda dos imóveis do portfólio Viriato pelo Novo Banco, que gerou perdas de 270 milhões de euros. O ex-proprietário das sociedades imobiliárias disse não ter qualquer ligação ao banco.

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LUSA/TIAGO PETINGA

O gestor de sociedades imobiliárias que esteve envolvido no maior negócio imobiliário dos últimos anos em Portugal feito pelo Novo Banco disse esta sexta-feira no Parlamento que nunca teve contactos com a instituição financeira, proprietária dos imóveis, e que não sabia a que se destinava a venda das cinco sociedades imobiliárias que foram usadas no negócio. António Barão explicou como foi feita a transacção: “Chego lá dou uma olhadela no contrato, uma leitura ligeira, nem sequer fixo o nome de a quem estou a vender, certamente que têm tudo em ordem. E assino”.

Barão afirmou que foi contactado pelo escritório de advogados Morais Leitão para vender as suas sociedades. “Combinámos o valor da venda” e o negócio foi feito. “Desloquei-me aos escritórios” da sociedade de advogados e “só tive conhecimento desse cliente na assinatura do contrato”, disse na comissão parlamentar de inquérito ao Novo Banco. Quanto ao cliente “nunca tive qualquer ligação ou afinidade”, “nem sabia a quem é que ia vender”. “Só nesse momento é que soube que era a Anchorage”. Daqui nasceu o negócio da venda dos imóveis do Portfólio Viriato, que segundo o deputado comunista Duarte Alves estavam avaliados nas contas do banco por 645 milhões e acabaram por ser vendidos por 364 milhões. Ou seja, com uma “perda de 270 milhões de euros em parte suportada pelo Fundo de Resolução”. A operação foi feita em 2018. O Novo Banco rejeita que o negócio tenha gerado perdas para o Fundo de Resolução. 

Perante a falta de respostas concretas, os deputados insistiram na tentativa de perceber as ligações de Barão ao Novo Banco. O gestor insistiu que nunca negociou com o Novo Banco. “Não tenho qualquer ligação nem ao Novo Banco nem à sociedade que comprou essas sociedades”. 

Barão, que disse ter vendido cada uma das sociedades por “cinco ou seis mil euros”, recorreu a um exemplo para explicar por que razão é normal não ter essa informação. Perante a estranheza dos deputados, disse que o negócio que fez é “mais ou menos” como o que é feito por um “armeiro” quando vende uma arma a alguém com licença de porte de armas. “Se ele [o comprador da arma] agora sair e matar alguém, o armeiro não tem culpa nenhuma. Não sabe a que se destina arma. Não tem culpa nenhuma. É mais ou menos assim.”

Ao longo da audição, António Barão mostrou-se desconhecedor de várias questões que os deputados colocaram, incluindo os nomes das sociedades que hoje detém. “Não me lembro dos nomes”, disse. Fernando Negrão, o presidente da comissão, chegou a pedir a António Barão que fosse “mais afirmativo” nas respostas “para que não ficassem dúvidas”. Barão, engenheiro de formação, “pintor amador” e “mágico” - como o próprio fez questão de acrescentar aos deputados - contou que na sua actividade cria sociedades para fazer negócios de imobiliário, mas que no caso das sociedades vendidas à Anchorage, estas “não tinham actividade real”. Barão admitiu que vende um serviço que dá isenção de Imposto de Municipal de Transmissão de Imóveis (IMT), já que as sociedades imobiliárias não pagam este imposto num momento inicial na compra de imóveis para a sua actividade. 

No final da audição, o presidente da comissão parlamentar de inquérito sublinhou que destaca do depoimento de António Barão o seguinte: “Há uma frase sua reveladora. Sem ninguém lhe ter perguntado, o senhor engenheiro disse que “ninguém me mandou fazer nada”. Por que é que diz isso se ninguém lhe perguntou?”. Barão respondeu que disse aquela frase por que antes lhe tinham perguntado se tinha colaborado com alguém, se “alguém me disse para eu fazer...”. 

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