O dia em que o rio da Vila mudou de cheiro para receber a rainha de Inglaterra

Em 1985 a rainha Isabel II esteve no Porto e foi preciso disfarçar o cheiro nauseabundo do rio que passa no centro da cidade.

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Rua da Alfândega ornamentada para receber rainha Isabel II no Porto, em 1985 Arquivo Municipal do Porto

O protocolo para a visita da rainha Isabel II estava fechado e incluía uma visita à Praça da Ribeira. Mas na preparação dos pormenores, alguém terá levantado um problema: à hora da visita, a maré estaria baixa e o cheiro não seria o mais agradável. “Aquilo era um esgoto”, explica Germano Silva enquanto conta a história.

Sem possibilidade de fazer alterações ao protocolo da visita de 1985, no tempo do autarca Paulo Vallada, era preciso improvisar uma solução. “Alguém sugeriu que 10 minutos antes da hora se abrisse uma tampa no Largo de São Domingos para deitar um produto”, conta o jornalista e autor de dezenas de livros sobre a cidade. “Quando a água chegou à Ribeira era azul e já não tinha um cheiro nauseabundo.”

O rio da Vila forma-se no subsolo da Praça Almeida Garrett pela junção de dois riachos: um vindo da zona de S. Brás, atrás da Lapa, e outro da Fontinha. O rio desce depois pela Rua Mouzinho da Silveira e Rua de São João seguindo até à Ribeira.

Neste momento, o leito do rio está a ser desviado para a Rua das Flores por causa das obras do metro – e há quem tenha questionado a influência dessa empreitada nas cheias deste fim-de-semana. A Metro do Porto encomendou um estudo ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil para analisar, entre outras coisas, as consequências desse desvio.

O túnel de 536 metros de comprimento e seis de diâmetro (170 metros já estão escavados) deverá estar concluído em Setembro deste ano.

Antes chamado rio da Cividade (“porque se formava na Cividade da cidade, o sítio de maior aglomerado populacional”), andou durante muito tempo a céu aberto. E o cheiro que dele saía não era agradável. “Os peleiros, homens que tratavam as peles, na Rua dos Pelames, deitavam todos os resíduos para o rio. E aquilo era um esgoto a céu aberto.”

O caudal do rio - encanado a partir de 1874, quando a Rua Mouzinho da Silveira foi aberta - chegou a ser significativo: “De tal modo que na Rua de São João, onde havia um declive e a água ganhava força, havia moinhos”, recorda o contador de histórias da cidade. No Largo de São Domingos e na Rua da Ponte Nova havia pontes de granito para atravessar o rio.

Germano Silva não tem memória de incidentes ali ocorridos. Com excepção do relato de um “naufrágio” publicado n’ O Tripeiro. “O rio corria ao longo dos quintais das casas da Rua das Flores. E um homem que ali morava queria sair pelas traseiras, iludindo os pais. Ao atravessar o rio a água subiu e ele teve de andar a nadar. Contou isso n’ O Tripeiro.”

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