Estrada clandestina na Amazónia leva garimpo ilegal ao coração do território yanomami

Potencial destrutivo da mineração ilegal de ouro na região da Amazónia brasileira pode aumentar dez a 15 vezes, denuncia organização ambientalista Greenpeace.

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Índio yanomani com autoridades do ambiente numa operação para desmantelar uma mina ilegal Bruno Kelly/REUTERS

Foi descoberta uma estrada clandestina de 150 quilómetros talhada na Amazónia, em território do povo indígena yanomami, pela qual estão a ser transportadas máquinas pesadas para a mineração ilegal de ouro, denunciou a Greenpeace Brasil. A situação que se está a passar na floresta foi confirmada numa missão de reconhecimento aéreo após um alerta lançado por rádio por uma comunidade yanomami.

É algo inédito a entrada de máquinas como escavadoras hidráulicas no território dos yanomami na floresta da Amazónia, o que eleva o potencial destrutivo da floresta do garimpo ilegal entre dez e 15 vezes na região, diz a Greenpeace, em comunicado. O território yanomami fica no extremo Norte do Brasil, na fronteira com a Venezuela, no estado de Roraima, e tem cerca de 9,6 milhões de hectares, segundo a organização Survival Internacional – mais ou menos a mesma área que Portugal.

“Acreditamos que há ali pelo menos quatro escavadoras – e isso leva o garimpo em território yanomami para um novo nível, um nível de destruição colossal”, disse ao jornal britânico The Guardian Danicley de Aguiar, o activista da Greenpeace responsável pela missão de reconhecimento aéreo sobre este território após o alerta dos yanomami. Estas máquinas servirão para explorar ouro e cassiterita (o principal minério de estanho), diz a Greenpeace.

“Nós, yanomami do Alto Catrimani I, informamos que chegaram três escavadeiras eléctricas aqui. Por isso, eu estou comunicando no rádio. Quero divulgação imediatamente. Nós, lideranças, estamos avisando vocês. Nós precisamos avisar a Polícia Federal urgentemente e com a Funai [Fundação Nacional do Índio] para retirar os garimpeiros de lá. Se demorar, nossas casas vão ser destruídas. As crianças estão com medo e fugindo”, dizia a mensagem via rádio que alertou a Greenpeace. “Chegou até nós do Alto Catrimani uma estrada de onde veio a retroescavadeira. Todos nós estamos preocupados, porque nós não sabíamos que chegaria aqui três escavadeiras. Os garimpeiros não foram convidados para vir, mas eles estão aqui”, dizia.

A estrada passa a menos de 15km de uma aldeia de um povo indígena que vive em isolamento voluntário, os moxihatëtëa, avança a Greenpeace, que sobrevoou a região há uma semana. “A rodovia apareceu no monitoramento via satélite muito recentemente, a partir de Agosto de 2022”, diz um comunicado da organização ambientalista.

O garimpo ilegal naquela zona sempre dependeu de pequenos aviões, porque a região é remota e de difícil acesso. A chegada de máquinas pesadas através desta estrada muda não só as condições de garimpo, como facilita a construção de estruturas que vão aumentar a ameaça da desflorestação, como mais estradas, postos de abastecimento, acampamentos de garimpeiros, salienta a Greenpeace.

Entre 2016 e 2021, um estudo da Greenpeace concluiu que o garimpo ilegal destruiu pelo menos 700km de rios dentro das terras indígenas Munduruku e Sai Cinza. “A monitorização feita pelo projecto Mapbiomas [uma rede colaborativa, formada por organizações não governamentais, universidades e startups de tecnologia, em parceria com o Google Earth] mostrou que, entre 2010 e 2020, as áreas de garimpo dentro de terras indígenas cresceram 495%. As que mais sofrem com esse problema são a TI Kayapó (7602 hectares) TI Munduruku (1592 hectares) e yanomami (414 hectares)”, diz a organização ambientalista.

O Presidente cessante, Jair Bolsonaro, incentivou a actividade mineira na Amazónia – só em Fevereiro deste ano, criou um novo programa dedicado à promoção da mineração artesanal na região. A Amazónia concentra 66,2% de toda a extracção mineral do Brasil e é nesta região que se está 91,6% da área explorada através do garimpo (mineração artesanal) no Brasil em 2021, segundo o estudo Mapbiomas, citado pelo site G1.

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