Governo admite travar aumento das rendas em novos contratos

Pedro Nuno Santos admite que o Governo poderá estender o limite de 2% à actualização das rendas aos valores estipulados em novos contratos de arrendamento.

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Pedro Nuno Santos está a ser ouvido no Parlamento, no âmbito da apreciação do Orçamento do Estado para 2023 LUSA/TIAGO PETINGA

O Governo está a estudar alargar o limite de 2% imposto à actualização das rendas aos novos contratos de arrendamento, uma medida que, para já, apenas se aplica aos contratos celebrados até ao final de 2021. A possibilidade é avançada pelo ministro das Infra-estruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, que revela ainda que já foram identificadas mais de 58 mil famílias em situação habitacional indigna, no âmbito do programa 1.º Direito.

“Vamos avaliar a extensão do travão à actualização automática das rendas aos novos contratos, com base nos preços dos contratos anteriores”, afirmou o ministro, que está a ser ouvido no Parlamento no âmbito da apreciação do Orçamento do Estado para 2023, sem acrescentar detalhes sobre essa medida.

Esta possibilidade está a ser estudada na sequência de uma outra medida implementada pelo Governo, relativa à actualização automática das rendas em 2023.

De acordo com a lei, o valor das rendas dos contratos de arrendamento é actualizado, anualmente, em função da variação média dos últimos 12 meses do índice preços no consumidor, sem a componente de habitação, registada em Agosto do ano anterior.

Em 2023, tendo em conta a inflação registada em Agosto deste ano, a actualização automática das rendas actualmente em vigor seria de 5,43%. Contudo, no âmbito do pacote de medidas destinadas a apoiar as famílias impactadas pela inflação, o Governo decidiu limitar esse aumento a 2%.

Por esse travão, os senhorios serão compensados com um apoio, atribuído por via do IRS ou do IRC, que irá cobrir o diferencial entre o aumento da renda a aplicar em 2023 (que será, no máximo, de 2%) e o que resultaria da actualização automática, que seria de 5,43%. Essa compensação, porém, apenas se aplica aos senhorios com contratos de arrendamento celebrados até ao final de 2021, ficando de fora aqueles com contratos celebrados este ano. Ao mesmo tempo, e tal como o PÚBLICO noticiou no mês passado, estão a ser identificados casos de senhorios que optam por não renovar contratos de arrendamento cujos prazos estejam a chegar ao fim, para, dessa forma, colocarem as casas de novo no mercado sem limitações nos preços de renda que pretendem praticar.

São estes dois fenómenos que o Governo agora está a estudar, com uma medida que, para já, é apenas uma possibilidade em avaliação. Ao que o PÚBLICO apurou, a avançar, o travão ao aumento das rendas aplicar-se-ia a todos os contratos de arrendamento, abrangendo, dessa forma, não só aqueles que foram celebrados apenas este ano como, também, os novos contratos de arrendamento relativos a casas que já estavam no mercado antes.

A título de exemplo: se um proprietário optar por não renovar um contrato de arrendamento cujo prazo chegue ao fim este ano, voltar a colocar a casa no mercado e celebrar um novo contrato no próximo ano, a nova renda só poderá ser 2% superior à renda do contrato original, ou seja, aquele que não foi renovado este ano.

Ao que foi possível apurar, contudo, esta é apenas uma solução em estudo e haverá vários riscos a ponderar, que poderão levar o Governo a não avançar com qualquer medida para controlar os preços de novos contratos de arrendamento.

58 mil famílias em situação indigna

Na mesma audição, o ministro das Infra-estruturas e da Habitação adiantou ainda novos dados relativos ao programa 1.º Direito, um dos principais instrumentos para a operacionalização da estratégia do Governo para a habitação, que conta, em grande parte, com os fundos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).

Segundo Pedro Nuno Santos, as estratégias locais de habitação (EHL) apresentadas pelas autarquias com quem já foram celebrados acordos no âmbito do 1.º Direito identificaram mais de 58 famílias em situação habitacional indigna.

Este número fica muito acima das 26 mil casas que, também no âmbito do 1.º Direito, vão ser financiadas com recurso ao dinheiro do PRR, a fundo perdido. Seja como for, garante Pedro Nuno Santos, as restantes casas também têm financiamento assegurado, seja por via da Administração Central, seja pela Administração Local.

“Todas as 58 mil habitações previstas nas ELH assinadas têm financiamento. O que acontece é que, tendo a oportunidade do PRR, quisemos aproveitar para financiar 26 mil habitações a fundo perdido. Terminado esse financiamento, está previsto, em todas as ELH, o que cabe à Administração Central e o que cabe à Administração Local. Todas as 58 mil situações identificadas têm resposta, têm financiamento. As primeiras 26 mil terão esse financiamento a fundo perdido, ou seja, as autarquias não têm de gastar um euro”, disse o ministro.

Para já, segundo os dados disponibilizados pelo Governo esta tarde, foram feitos cerca de 300 pedidos de financiamento no âmbito do 1.º Direito, relativos a 5600 habitações, distribuídas por 65 municípios. Destas, 1200 casas já foram entregues.

Regras do alojamento local em debate

Outra das portas abertas pelo ministro das Infra-estruturas e da Habitação é uma nova avaliação às regras do alojamento local, de forma a assegurar que o rácio entre o número de estabelecimentos de alojamento local e o número de fogos de habitação estabelecido para as zonas de contenção é cumprido.

A possibilidade foi deixada em cima da mesa depois de o ministro ter sido questionado sobre a dimensão do sector do alojamento local na freguesia de Santa Maria Maior, em Lisboa. Em concreto, nesta freguesia, mais de 50% dos fogos disponíveis estão alocados ao sector do alojamento local, uma proporção que representa mais do dobro do limite definido no Regulamento Municipal do Alojamento Local de Lisboa para a proibição da atribuição de novas licenças de alojamento local (isto é, são proibidos novos registos de alojamento local nas zonas onde o rácio entre o número de alojamentos locais e o número de fogos de habitação seja igual ou superior a 20%).

Pedro Nuno Santos reconhece que a lei não foi capaz de abranger nos casos em que a proporção de alojamentos locais em relação ao número total de fogos já ultrapassava largamente os limites definidos na nova lei. E, por isso mesmo, admite que poderá ser necessário rever a lei que regula o alojamento local, depois das alterações aprovadas em 2018.

“Este é um debate que temos de fazer, porque este é um problema que só se resolve com medidas duras”, afirmou, sem esclarecer a que medidas se referia.

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