“Regresse a África”, a frase que suspendeu uma sessão do Parlamento francês

Deputado da União Nacional, partido de Marine Le Pen, interrompeu a intervenção de um deputado negro com um insulto racista, mas diz que se referia aos que tentam chegar à Europa por mar.

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O incidente levou à suspensão da sessão, com várias iniciativas ainda agendadas, algo muito raro na Assembleia Nacional EPA/CHRISTOPHE PETIT TESSON

“Que volte para África” ou “regresse a África”. Foi esta a frase proferida por um deputado da extrema-direita na Assembleia Nacional francesa durante a intervenção de um deputado negro, que questionava o Governo sobre um pedido de ajuda de uma organização que resgata pessoas no Mediterrâneo. A sessão parlamentar foi interrompida, o que é extremamente raro em França, e o gabinete da Assembleia e o gabinete da Assembleia decidiu suspender por 15 dias o deputado em questão.

O deputado da França Insubmissa (LFI, esquerda radical) Carlos Martens Bilongo, de origem congolesa, evocou no hemiciclo o “drama da imigração ilegal”, pondo perguntas ao Governo sobre a ONG SOS Méditerranée, que horas antes pedira ajuda a Paris, Madrid e Atenas para encontrar portos onde desembarcar 234 migrantes e requerentes de asilo resgatados nos últimos dias, quando tentavam chegar, de barco, à Europa.

Foi durante essa intervenção, na quinta-feira à tarde, que se ouviu a frase do deputado da União Nacional (extrema-direita) Grégoire de Fournas. De imediato, a presidente da Assembleia, Yael Braun-Pivet, exigiu saber quem tinha falado; logo depois, os deputados começaram a entoar “Fora! Fora! Fora!”, até que Braun-Pivet suspendeu a sessão. “Isto não é possível”, declarou, apontando “a gravidade dos factos” e a “emoção legítima” da Assembleia.

“Nasci em França, sou um deputado francês”, disse mais tarde Bilongo, descrevendo a frase de Fournas como “vergonhosa” e afirmando-se “muito triste”.

O deputado do partido de Marine Le Pen tentou defender-se, argumentando que estava a referir-se ao “barco que transporta migrantes para a Europa” ou aos migrantes. “Estamos perante uma manipulação que procura distorcer as minhas observações para me atribuir comentários repugnantes em relação a um colega francês deputado da nação que tem a mesma legitimidade que eu nestas bancadas”, defendeu-se, em declarações aos jornalistas. Mas Fournas acabou por pedir desculpas a Bilongo pelo “mal-entendido”.

Considerando que os comentários do deputado foram “para lá do intolerável”, o líder da LFI, Jean-Luc Mélenchon, escreveu no Twitter que Fournas devia ser expulso da Assembleia Nacional.

“O racismo não tem lugar na nossa democracia”, reagiu a primeira-ministra, Elisabeth Borne, observando que, “naturalmente”, a Assembleia Nacional “terá de adoptar sanções”.

A União Nacional aumentou a sua presença na Assembleia nas eleições parlamentares de Junho, somando 89 lugares. Como habitualmente, o tema da imigração teve destaque nas campanhas do partido para as duas eleições deste ano, as legislativas e as presidenciais. Uma das propostas de Marine Le Pen passava por realizar um referendo para reduzir significativamente a imigração para França.

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