Imigrantes brasileiras marcam protesto no Porto por se sentirem objecto sexual

A acção de protesto tem como objectivo colocar “um basta” ao estereótipo em torno das mulheres brasileiras — e não só.

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Adam Le Sommer/Unsplash

As imigrantes brasileiras queixam-se de ser tratadas como objectos sexuais em Portugal, onde este estereótipo se traduz em dificuldades no acesso à habitação e outros serviços, tendo agendado para este sábado, 29 de Outubro, uma acção de protesto no Porto.

A iniciativa, marcada para a Praça da Liberdade, no Porto, surge após o alegado ataque de violência sexual por parte de um agente do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) contra uma brasileira que tentava chegar a Portugal como turista, mas não só.

“Não é um caso que acontece só no SEF, nem só com quem está a chegar a Portugal pela primeira vez. É uma violência quotidiana, muito comum, muito presente nas mulheres brasileiras em Portugal, e não só brasileiras”, disse Aline Rossi, coordenadora política da Colectiva Maria Felipa, que promove a acção.

“Isso tem um historial, uma construção histórica em cima, e é uma situação muito complexa, pode implicar violência sexual, assédio, dificuldade de acesso a serviços, nas ruas, no trabalho, na entrada no país”, afirmou Rossi à Lusa.

A activista explicou que o protesto de sábado é “contra a violação de uma mulher brasileira quando tentava entrar no país, mas também o reflexo de violências que acontecem diariamente com mulheres brasileiras em Portugal”.

E revelou que o aumento da imigração brasileira para Portugal, sobretudo nos últimos quatro anos, foi acompanhado de um aumento do “discurso xenófobo, que não é só contra brasileiros, é reflexo de um acirramento político, de uma ascensão da extrema-direita na Europa e também em Portugal, com maior visibilidade do partido Chega, e outros muito próximos de grupos neofascistas, como o Mário Machado”.

“Amanhã é um basta a estas violências que acontecem diariamente, a um olhar que está muito enraizado na cultura, também por causa do passado colonial, de ver a mulher brasileira como um objecto sexual, um corpo público e uma mulher fácil. O estereótipo da mulher puta é uma coisa muito viva ainda hoje na cultura portuguesa”, prosseguiu.

E acrescentou: “Quando uma mulher brasileira sofre este tipo de violência [o alegado ataque no SEF], não é só quem ela é naquele momento, é de onde ela vem, o facto de ser brasileira e o que o imaginário português sobre uma mulher brasileira diz, que normalmente relaciona a imagem da mulher brasileira à puta. Tem a ver com o caso das mulheres/mães de Bragança, tem a ver com o passado colonial de exploração sexual e posse do corpo da mulher.”

Por esta razão, Aline Rossi acredita que o caso “não é uma coisa que vem da ascensão recente da extrema-direita e do discurso xenófobo, isso é só uma repaginação de uma cultura e de um pensamento que já estava lá há muito mais tempo e que simplesmente se manifesta nessas situações, porque nunca foi efectivamente de lá erradicado”.

A activista lamentou que estas ideias se reflictam em dificuldades diárias em Portugal, sendo a mais flagrante a que estas mulheres registam para alugar uma casa. “Todas nós temos um caso para contar, muitos fecham-nos as portas”, referiu, indicando que isso se deve porque julgam que, por serem brasileiras, iriam receber “clientes” nessa casa.

Em relação ao trabalho, a activista explicou que o assédio muitas vezes não é denunciado, porque estas trabalhadoras ainda não estão com a situação totalmente resolvida a nível dos papéis e, por isso, os casos não são mais conhecidos.

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