PS pede adiamento da votação da eutanásia. AR só volta ao assunto depois do OE2023

Votação na especialidade do texto final estava marcada para esta quarta-feira em comissão, para que pudesse subir ao plenário amanhã. Há três justificações diferentes para o adiamento.

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O Parlamento só deve voltar a discutir o tema em Dezembro Daniel Rocha

A votação final do diploma que legaliza a morte medicamente assistida só vai ser feita depois do processo do Orçamento do Estado para 2023: o PS pediu nesta quarta-feira o adiamento da votação na especialidade que estava agendada para esta manhã sem especificar a razão. Entretanto, a bancada parlamentar socialista revelou alguma descoordenação nas justificações que foram sendo divulgadas.

O pedido foi feito pela deputada Joana Sá Pereira, a coordenadora dos socialistas, na reunião da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, quando o presidente da comissão, o social-democrata Fernando Negrão, anunciou que se iria proceder à discussão e votação do texto final elaborado no âmbito do grupo de trabalho. Joana Sá Pereira disse apenas que o adiamento para a primeira reunião a seguir ao Orçamento era “por razões óbvias”.

A deputada Cláudia Cruz Santos disse ao PÚBLICO que a apresentação do texto final seria feita pela deputada Isabel Moreira e que a coordenadora Joana Sá Pereira “justificou o pedido de adiamento por razões óbvias”. Isabel Moreira é filha de Adriano Moreira, o histórico líder do CDS que faleceu no fim-de-semana.

Porém, no final da reunião da comissão, a deputada Isabel Moreira disse aos jornalistas que o PS entendia que não fazia sentido juntar a votação deste diploma sobre a legalização da eutanásia com a do Orçamento do Estado, que decorre nesta quinta-feira. Apesar de este ser um assunto mais delicado, é normal fazer-se a votação de outros diplomas com o Orçamento.

Perante versões contraditórias, o PÚBLICO questionou a assessoria do grupo parlamentar socialista, que apresentou uma terceira justificação: o texto final objecto de consenso no grupo de trabalho há duas semanas tem de ser sujeito a uma “análise cuidada e minuciosa” para “evitar quaisquer erros e incongruências que possam levar a novo bloqueio” seja no período da redacção final global, ainda no Parlamento, seja em Belém.

Em Novembro do ano passado, já depois da aprovação em plenário do texto final, a comissão fez ajustamentos à redacção que foram contestados pelo CDS, o que atrasou o envio do decreto para Belém.

Na redacção final global (feita depois da votação final no plenário), a comissão aceitou o pedido do PS para substituir a expressão “antecipação da morte” por “morte medicamente assistida” ao longo de todo o texto. O CDS reclamou e a alteração foi retirada, seguindo o texto para Belém com expressões não coincidentes em diversos artigos.

O texto final que juntou as propostas do PS, Bloco, IL e PAN foi elaborado pela socialista Isabel Moreira e todos os partidos se mostraram confortáveis com a versão – não apresentaram qualquer proposta de alteração, quando foi discutido no grupo de trabalho –, apenas o Chega se afirmou contra todo o processo.

Nesta terceira versão final, os deputados voltam a não admitir a necessidade de uma doença fatal (ao contrário do que pedia Marcelo), reformularam alguns conceitos, introduziram a possibilidade de acompanhamento psicológico ao longo do processo e prazos para as suas várias fases, incluindo um mínimo de dois meses entre o pedido de acesso à eutanásia e a concretização da morte, e flexibilizaram a composição da comissão de avaliação, que pode funcionar sem a lista total de representantes (para evitar bloqueios provocados pela recusa da Ordem dos Médicos).

O Presidente da República já vetou dois decretos do Parlamento com outras tantas versões do regime de despenalização da morte medicamente assistida. A primeira em Março de 2021 na sequência da declaração de inconstitucionalidade de duas normas sobre as quais Marcelo Rebelo de Sousa pediu a fiscalização ao Tribunal Constitucional. E a segunda em Novembro, com um veto político, argumentando o Presidente que essa nova versão, ao retirar a exigência de doença fatal, alargava o leque das situações em que seria possível aceder à eutanásia. Marcelo dizia ser uma “mudança considerável de ponderação dos valores da vida e da livre autodeterminação” e questionava mesmo se essa “visão mais radical ou drástica" corresponde ao “sentimento dominante na sociedade portuguesa”.

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