Loretta Lynn (1932-2022), a “primeira-dama” da música country

Viu a sua carreira contada no filme A Vida do Mineiro, com Sissi Spacek, e a sua música distinguida com três Grammys. Loretta Lynn foi das primeiras mulheres a chegarem ao topo da country nos anos 1960 e 70.

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Loretta Lynn recebeu o seu primeiro prémio da indústria fonográfica em 1971 Ethan Miller/Reuters

A cantora norte-americana Loretta Lynn, uma lenda da música country, morreu esta terça-feira no seu rancho em Hurricane Mills, no Tenneessee. Tinha 90 anos.

A morte foi confirmada pela sua família à agência de notícias Associated Press: “A nossa preciosa mãe, Loretta Lynn, morreu pacificamente esta manhã, 4 de Outubro, enquanto dormia, em casa, no seu amado rancho, em Hurricane Mills”, diz o comunicado.

Muitas vezes cognominada “primeira-dama” da música country, Loretta Lynn teve uma carreira longa, celebrada nos palcos norte-americanos e um pouco por todo o mundo, mas também no cinema. Além de ter visto canções suas serem usadas em mais de uma centena de filmes, teve a sua vida contada em Coal Miner’s Daughter (A Filha do Mineiro, Michael Apted, 1980), que valeu a Sissi Spacek o Óscar de Melhor Actriz.

O filme adapta a biografia homónima da cantora, escrita alguns anos antes por George Vecsey. O livro era já a consagração da história de Loretta Webb, uma jovem nascida no dia 14 de Abril de 1932, filha de um operário das minas de carvão na zona rural do Kentucky, e que começou a cantar em família e nos coros das igrejas locais. O pai tocava banjo, a mãe guitarra e dois dos seus sete irmãos viriam a fazer carreira na música, como ela.

Com apenas 15 anos, a adolescente que sonhava cantar profissionalmente casou com o empresário e produtor musical Oliver Mooney Lynn, seis anos mais velho, com quem viveria até à morte deste, em 1996 (a AP lembra que Lynn diz ter casado aos 13, mas os registos consultados pela agência de notícias mostram que a cerimónia se realizou quando tinha 15).

Apesar de o marido ser uma figura conhecida no meio da country, a carreira de Loretta Lynn só arrancou verdadeiramente nos anos 60, quando tinha já quatro filhos, tendo-se reforçado na década seguinte ao gravar êxitos como I’m a honky tonk girl, You ain't woman enough (To take my man), Don't come home a-drinkin’ (With lovin’ on your mind), One's on the way, Fist city e o já referido Coal Miner's Daughter (que em 2001 foi considerada pela National Public Radio uma das 100 melhores canções do século XX).

Ainda na década de 70, ganha relevo a sua parceria com o letrista e também cantor Conway Twitty, com quem grava After the fire is gone, Lead me on e Louisianna woman, Mississippi man.

Nos anos 80 e 90, Loretta Lynn privilegiou os concertos e as digressões, juntando-se às cantoras Tammy Wynette e Dolly Parton, formando um trio que receberia o nome Honky Tonk Angels.

Nas décadas seguintes a intérprete e compositora que tinha nos seus longos vestidos rodados com corpetes profusamente decorados uma das suas imagens de marca continuou a gravar e viu a sua música distinguida com vários Grammys, entre eles um de carreira, em 2010.

A “primeira-dama” da country recebera o seu primeiro prémio da indústria fonográfica em 1971 ao lado de Conway Twitty pelo êxito After the fire is gone. Em 1994, a sua colaboração Wynette e Parton valeu-lhe outro. Dez anos mais tarde, Van Lear Rose, feito em parceria com Jack White, seria considerado o Melhor Álbum Country. Lynn ainda voltou ao estúdio várias vezes depois disso, lançando Full Circle, em 2016, ou Still Woman Enough, o disco derradeiro, em 2021, já depois de ter deixado de fazer digressões.

Nos obituários que lhe dedicam hoje vários jornais norte-americanos e europeus jornalistas e críticos põem em foco a postura singular de Loretta Lynn no mundo da country, tradicionalmente conservador, sobretudo no que toca ao papel da mulher. A originalidade das suas letras, tantas vezes protagonizadas por figuras femininas fortes, nos antípodas do lugar que por regra ocupam neste género musical, chegam a reflectir as suas opiniões perante a política (a Guerra no Vietname, por exemplo) e as transformações sociais (como o uso generalizado da pílula). Escreve a AP que Loretta Lynn cantou sem medo “o sexo e o amor, a traição de maridos, o divórcio e o controle da natalidade”, chegando mesmo a ter problemas com animadores de rádio “por causa deste tipo de material de que até os artistas do rock fugiam”.

“Era o que eu queria ouvir e o que eu sabia que outras mulheres também queriam ouvir”, disse Lynn à AP em 2016. “Eu não escrevi para os homens, escrevi para nós mulheres. E os homens também adoraram.”

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