Rainha da beleza da Birmânia teme a prisão depois de ter denunciado abusos pelos militares no poder

Han Lay, que há um ano marcou o Miss Grand International, na Tailândia, ao denunciar a situação na Birmânia (Myanmar), está há três dias num aeroporto tailandês a aguardar luz verde para entrar no país.

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Han Lay tem 23 anos; desde Abril de 2021, reside na Tailândia Reuters/ATHIT PERAWONGMETHA

Há um ano, Han Lay chamou a atenção internacional com o seu comovente discurso, durante o concurso Miss Grand International, na Tailândia, sobre a repressão mortal no seu país. Agora, a rainha da beleza que falou contra os governantes militares da Birmânia (Myanmar) está, pelo terceiro dia consecutivo, retida no Aeroporto Internacional de Suvarnabhumi, Banguecoque.

A jovem aguarda que lhe seja concedida a entrada, enquanto activistas de organizações não-governamentais (ONG) assim como a sua entidade patronal exortam as autoridades a não a enviarem de regresso à sua terra natal. A modelo, de 23 anos, que se refugiou na Tailândia depois da sua intervenção no concurso, saiu do país para uma breve visita ao Vietname. Contudo, no regresso, foi impedida de entrar em território tailandês, com os serviços de imigração a alegarem que a jovem está a utilizar documentos de viagem inválidos.

A equipa de gestão de eventos que trabalha com Han Lay disse que esperava que a jovem pudesse reentrar na Tailândia. “A única coisa que queremos é que não regresse à Birmânia, porque, se regressar, não sabemos o que lhe vai acontecer”, disse um representante da equipa, citado pela Reuters, que se recusou a ser identificado porque não estava autorizado a falar aos meios de comunicação social.

Questionado, nesta sexta-feira, sobre o caso de Han Lay, Tanee Sangrat, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros tailandês, disse que as autoridades “não fizeram qualquer detenção e não têm planos de a enviar para lado nenhum nesta fase”.

A Tailândia tem sido frequentemente apanhada no fogo cruzado entre países que procuram o regresso de cidadãos e activistas que alegam que esses serão perseguidos se enviados para casa. Entre os casos mais mediático, estão o de um jogador de futebol australiano, detido na Tailândia, em 2018, a pedido do Bahrein por ter criticado o regime monárquico, e de uma jovem saudita, de 18 anos, que ficou retida no aeroporto de Banguecoque depois de ter fugido da sua família.

A Reuters não conseguiu contactar ninguém da junta militar no poder na Birmânia para comentar o caso de Han Lay.

Tanto a modelo como o seu agente denunciaram que Han Lay foi alvo de um aviso vermelho da Interpol, o nível de alerta mais elevado. A polícia tailandesa e o gabinete de imigração recusaram-se a comentar e a Reuters não pôde confirmar de forma independente esse alerta.

Numa publicação no Facebook, Han Lay conta que a polícia birmanesa estava no aeroporto de Banguecoque a tentar encontrá-la, mas que ela se recusou e que tinha entrado em contacto com a Agência das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).

Sobre este tema, a polícia tailandesa encaminhou a Reuters para o gabinete de imigração, enquanto o ACNUR disse que a sua política era a de não confirmar casos individuais.

No Twitter, Phil Robertson, da ONG Observatório dos Direitos Humanos, disse que as autoridades tailandesas deveriam conceder protecção a Han Lay e “em nenhuma circunstância” extraditá-la para a Birmânia.

Em Abril do ano passado, durante o discurso no concurso de beleza Miss Grand International, na Tailândia, a concorrente birmanesa pediu “ajuda internacional urgente”. No dia da sua intervenção, 141 manifestantes tinham sido mortos por militares que a jovem apelidou de “egoístas”, denunciando “abusos de poder”.

A modelo admitiu, na altura, ter tido dificuldade em concentrar-se durante a competição, sentindo-se culpada devido ao sofrimento que se vive no seu país. “Não posso ser feliz aqui porque (...) muitas pessoas estão a morrer na Birmânia.”

Paralelamente, o fundador da competição, Nawat Itsaragrisil, deixou claro que a decisão da jovem em se manifestar contra a junta militar a punha em risco, no regresso a casa, defendendo por isso que permanecesse no estrangeiro. “Se ela for para a Birmânia agora, não vai para casa, mas vai para a prisão.”

Em Julho, a junta militar no poder na Birmânia executou quatro activistas pró-democracia, acusados de participar em “actos terroristas”. Há mais de três décadas que não havia execuções naquele país asiático.

Os quatro homens tinham sido condenados à pena de morte em julgamentos à porta fechada e nem a pressão internacional de organizações e de outros países para que as execuções não fossem realizadas foi suficiente para que os militares que tomaram o poder na Birmânia alterassem os seus planos.

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