Portugal tem de melhorar a forma como trata o lixo, o ar e as áreas protegidas, diz UE

Acabam em aterros 48% dos resíduos urbanos portugueses. Pior, 59% são depositados sem qualquer pré-tratamento, diz avaliação da política ambiental nacional feita pela União Europeia.

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É em aterros que acaba grande parte dos resíduos urbanos portugueses Adriano Miranda

O desempenho da economia circular e da gestão de resíduos em Portugal está muito abaixo da média da União Europeia. A geração de resíduos começou a aumentar ao longo da última década e atingiu 513 kg por ano e por habitante em 2020 (um pouco acima da média da UE, que é de 505 kg) e muitos acabam em aterros: 48%, quando a média europeia é de 29%, diz o relatório do reexame da política ambiental portuguesa divulgado nesta quinta-feira pela União Europeia.

Além disto, “um número significativo de aterros em Portugal opera em condições irregulares e sem respeitar as normas aplicáveis”, diz o documento. “Estes locais não cumprem as normas da UE em matéria de aterros (ou seja, carecem de pré-tratamento de resíduos ou não tratam a fracção orgânica) e apresentam riscos graves para a saúde humana e o ambiente”, avança ainda o relatório. No trabalho é também citado um estudo lançado pela Comissão Europeia para concluir que “pelo menos 59 % dos resíduos urbanos são depositados em aterros sem qualquer tratamento”.

A Comissão Europeia iniciou um procedimento de infracção contra Portugal por incumprimento da Directiva Aterros e da Directiva-Quadro Resíduos. “São necessários esforços significativos para aumentar a minimização, a separação, a reutilização e a reciclagem de resíduos, desviando-os assim dos aterros ou das incineradoras”, aconselha o relatório.

O exercício de avaliação da forma como são aplicadas as normas ambientais foi feito para os 27 países da UE em áreas como a economia circular e a gestão de resíduos, biodiversidade e capital natural, poluição, produtos químicos e acção climática. No caso de Portugal, a economia circular e a gestão de resíduos foi considerada uma das que apresenta maiores desafios.

Metas por cumprir

Portugal não cumpriu a meta europeia de reciclar 50% dos resíduos urbanos até 2020. A taxa global de reciclagem foi de 29 % em 2019 e 26,5% em 2020, quando a média europeia é de 48%. O país tem muito trabalho a fazer para concretizar as metas da UE para a próxima década, que incluem a reciclagem de 55% dos resíduos até 2025 e 60% em 2030, diz o relatório do reexame da política ambiental portuguesa.

A utilização circular (secundária) de materiais em Portugal foi de 2,4% em 2014 e desce para 2,2% em 2020, quando a média europeia é de 12,8%. “Portugal não só está muito abaixo da média da UE como, também, em 2020, o seu desempenho foi pior que seis anos antes”, realça o relatório.

No entanto, Portugal está a rever o Plano de Acção Nacional para a Economia Circular (PAEC) de 2017, que agora terá como base o enquadramento europeu, bem como o novo Plano Estratégico para os Resíduos Urbanos (PERSU 2030) e o Plano Estratégico para os Resíduos Não Urbanos (PERNU 2030), que devem ser adoptados durante o corrente ano.

Relativamente à gestão da água, há problemas que continuam. “São necessários mais esforços em infra-estruturas para melhorar a gestão da água, como a recolha e o tratamento de águas residuais, a redução de fugas nas redes e no abastecimento geral de água, a melhoria da monitorização (qualidade e quantidade), bem como soluções baseadas na natureza e a restauração de rios”

Há dificuldades na aplicação da Directiva Tratamento de Águas Residuais Urbanas. A aplicação incompleta desta directiva conduziu a vários acórdãos contra Portugal proferidos pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, salienta o documento.

Indefinições na Rede Natura

A rede Natura 2000 é a maior rede coordenada de zonas protegidas do mundo, e é o principal instrumento para pôr em prática os objectivos das directivas Aves e Habitats, para assegurar a protecção, conservação e sobrevivência a longo prazo das espécies e habitats mais ameaçados da Europa. Portugal acolhe 99 tipos de habitats e 335 espécies abrangidas por estas directivas e em 2021, 20,26% do território nacional era abrangido pela Rede Natura 2000 (a média na UE é de 18,5%).

Mas a legislação não define de forma suficientemente clara e específica as várias espécies e tipos de habitat nas zonas de protecção no território da Rede Natura 2000, que muitas vezes são ameaçadas pelo avanço de empreendimentos turísticos, por exemplo. Por isto, a Comissão Europeia iniciou mais um procedimento de infracção contra Portugal do qual notificou Portugal em Julho de 2019. Algumas insuficiências foram corrigidas, mas outras subsistem, por isso o procedimento de infracção avançou, diz o relatório.

Em Portugal as florestas cobrem 37,21% do território, mas apenas 4% da superfície florestal apresenta um estado de conservação favorável, segundo um relatório de 2021 da Agência Europeia do Ambiente citado na avaliação.

De acordo com o relatório apresentado por Portugal sobre o estado de conservação dos habitats e das espécies abrangidos pelo artigo 17.º da directiva Habitats para o período 2013-2018, a percentagem de habitats em mau estado de conservação aumentou para 28,8%, em relação ao período anterior.

Aumentaram também as espécies em mau estado de conservação para 11,3%, avança o reexame da política ambiental portuguesa. “As principais pressões provêm da agricultura, do desenvolvimento urbano e das espécies exóticas e problemáticas.”

Um relatório de 2021 indica estarem presentes em Portugal 24 das 66 espécies exóticas invasoras listadas na União Europeia. Mas o país “não criou nem aplicou um plano de acção único”, para cumprir o Regulamento da UE sobre Espécies Exóticas Invasoras. Por isso, está em curso um procedimento de infracção contra o Estado português.

A avaliação feita pela União Europeia destaca ainda que são necessárias medidas decisivas para resolver preocupações relacionadas com a qualidade do ar causadas pelo congestionamento de tráfego nas principais áreas metropolitanas, sobretudo no que diz respeito do dióxido de azoto. “Em Portugal, a qualidade do ar continua a ser motivo de preocupação. As últimas estimativas anuais disponíveis (para 2019) da Agência Europeia do Ambiente indicam que cerca de 4900 mortes prematuras por ano podem ser imputáveis às concentrações de partículas finas, 270 às concentrações de ozono e 540 às concentrações de dióxido de azoto”, enumera o relatório de avaliação.

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