Cientistas querem criar rastreio à clamídia em Portugal para prevenir “problema de saúde pública”

A ideia é apontada por investigadores da Universidade do Porto. Quatro em cada cinco casos de clamídia não tem sintomas e a falta de rastreio pode contribuir para a transmissão mais facilitada de uma das infecções sexualmente transmissíveis mais comuns.

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Investigadores querem aplicar uma técnica de rastreio mais eficaz, que detecta a bactéria da clamídia em 98% dos casos RUI GAUDêNCIO

Um grupo de investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) defendeu esta quinta-feira a criação de um programa de rastreio da clamídia, uma das infecções sexualmente transmissíveis “mais comuns” e para a qual não existe vacina disponível.

Nas vésperas do dia mundial da Saúde Sexual, que se assinala no domingo, Nuno Vale, professor da FMUP e investigador do Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde (Cintesis), alerta que, embora a clamídia seja uma infecção comum, não revela sintomas em cerca de 80% dos casos, o que aumenta o risco de transmissão da doença.

“Em Portugal, ainda não existe um programa de rastreio, ao contrário do que acontece noutros países”, apontou Nuno Vale, que lidera o grupo de investigadores que levou a cabo o estudo “Clamídia, um problema de saúde actual: desafios e oportunidades"), publicado na revista científica Diagnostics, que tem também como autores Rafaela Rodrigues, também da FMUP e do Cintesis, bem como Carlos Sousa, da Unilabs.

No estudo, os autores concluem que os próprios serviços de saúde não estão sensibilizados para este problema, recorrendo a métodos convencionais (as culturas), com tempo de espera e “baixa sensibilidade”, o que pode resultar em muitos falsos negativos, subdiagnóstico e falta de tratamento.

Em causa pode estar “um problema de saúde pública”, consideram os investigadores. A clamídia, uma infecção provocada pela bactéria Chlamydia trachomatis, é tratada com a toma de antibióticos.

Quando não tratada, esta infecção pode resultar em graves sequelas nos órgãos reprodutores. Nas mulheres, a doença pode causar dor crónica, doença pélvica inflamatória e infertilidade. A doença está também associada a tumores ginecológicos (cancro do colo do útero) e à transmissão da grávida para o bebé. Já em homens, acrescenta a FMUP, as consequências mais graves incluem doenças da próstata e também infertilidade.

“Na ausência de uma vacina, a solução deve passar pelo rastreio de mulheres e homens sexualmente activos e assintomáticos. Em vez do método tradicional de cultura, que é complexo e pode demorar vários dias, as tecnologias de amplificação do ácido nucleico são mais rápidas e mais sensíveis, detectando a bactéria em cerca de 98% dos casos”, sublinha Nuno Vale.

Nos últimos anos, vários países implementaram programas nacionais de rastreio de infecções por clamídia em mulheres até aos 25 anos, adianta o investigador. Entre os países que recentemente avançaram com esta medida estão Inglaterra, Austrália, Países Baixos e Suécia.

Além de criar um programa nacional de rastreio, o grupo de investigadores aponta para a necessidade de estudar a prevalência e incidência da infecção por clamídia em Portugal, bem como de desenvolver campanhas de prevenção e sensibilização sobre os factores de risco. Em 2020, a Organização Mundial da Saúde estimou que tenham ocorrido 129 milhões de novas infecções.

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