Detritos de foguetão chinês reentraram na atmosfera perto das Filipinas

Os destroços do foguetão Longa Marcha 5B, lançado por Pequim para a órbita da Terra a 24 de Julho, reentraram na atmosfera de forma descontrolada. China é alvo de críticas por não cumprir normas internacionais.

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Lançamento do foguetão chinês Longa Marcha 2F em Junho de 2021 EPA/ROMAN PILIPEY

Após vários dias de previsões, os detritos do foguetão chinês Longa Marcha 5B que se aproximavam da Terra já reentraram na atmosfera. O Comando Espacial dos Estados Unidos confirmou que terão caído sobre o Oceano Pacífico, pelas 17h45 (hora de Portugal continental) deste sábado. A reentrada foi confirmada oficialmente pela Agência Espacial Tripulada Chinesa, na rede social Weibo.

Portugal chegou a estar na rota prevista de reentrada, assinalado como um dos lugares por onde os destroços poderiam passar, mas a entrada na atmosfera terrestre acabou por acontecer no lado oposto do globo.

De acordo com a Agência Espacial Tripulada Chinesa, a maior parte dos destroços desintegrou-se sobre o mar de Sulu, entre a Malásia e as Filipinas.

Nas redes sociais já foram partilhados vários vídeos em que é possível ver a reentrada na atmosfera, muitos gravados a partir da Malásia.

A Agência Europeia para a Segurança da Aviação (EASA) tinha emitido na última quinta-feira um comunicado de alerta, sem excluir uma possível queda, entre 30 e 31 de Julho, de “até nove toneladas” de detritos do foguetão chinês em território europeu. Mas a queda sobre a Europa acabou por não se confirmar.

Contudo, o lixo espacial poder-se-ia ter dispersado “de forma descontrolada” por uma área com cerca de 2000 quilómetros de comprimento e 70 quilómetros de largura.

Um segundo foguetão Longa Marcha 5B será lançado ainda este ano, e alguns especialistas já avisam para uma nova entrada não controlada de destroços na atmosfera. “Este é o desfecho da reentrada do Chang Zheng 5B Y3 [parte do foguetão Longa Marcha 5B]”, escreveu no Twitter Jonathan McDowell, astrofísico no Centro de Astrofísica da Universidade de Harvard.

“Voltaremos a passar por isto em Outubro, com o Chang Zheng 5B Y4, programado para o lançamento do próximo módulo da estação Tiangong, a estação espacial chinesa.” Este será o último módulo necessário para a construção da Tiangong (Palácio Celestial).

Este foguetão foi lançado para a órbita da Terra pela China no dia 24 de Julho e os seus destroços regressaram à Terra menos de uma semana depois.

Como explica ao PÚBLICO o astrofísico português André Moitinho de Almeida, professor na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e investigador do CENTRA — Centro de Astrofísica e Gravitação, a regra é que os detritos que resultam do envio de foguetões para o Espaço sejam controlados e se desintegrem em pequenos fragmentos ao reentrar na atmosfera. Aliás, são cerca de uma centena de objectos fragmentados que todos os anos retornam ao planeta.

Neste caso, contudo, a reentrada de um gigante objecto de várias toneladas e grandes dimensões aconteceu sem qualquer controlo e sendo quase impossível prever onde cairia, algo que só se explica por “negligência” da China, afirma.

“As missões chinesas têm sido alvo de muitas críticas. É completamente irresponsável permitir que objectos deste tamanho reentrem de forma não controlada [na atmosfera]”, argumentou. “A tecnologia existe e é uma prática, só que nem toda a gente a adopta. Acho que é negligência, irresponsabilidade [da China].”

Já em 2020 e 2021, a China permitiu o regresso descontrolado de destroços de foguetões lançados pelo país. Acabariam por cair perto da costa ocidental africana e no Oceano Índico, respectivamente.

Desta vez, Bill Nelson, administrador da NASA e antigo senador dos Estados Unidos, também foi claro nas críticas a Pequim.

“A República Popular da China não partilhou informação sobre a sua trajectória específica enquanto o foguetão Longa Marcha 5B regressava à Terra. Todas as nações que exploram o Espaço devem seguir as boas práticas estabelecidas e cumprir o seu papel ao partilhar este tipo de informação com antecedência, para permitir previsões fiáveis do potencial risco de impacto dos detritos”, escreveu, em comunicado. “Fazê-lo é fundamental para a exploração responsável do Espaço e para garantir a segurança das pessoas na Terra.”

Ao não cumprir normas consensuais entre todos os países das Nações Unidas, inclusive da própria China, Pequim vai arriscando numa espécie de “roleta russa”, compara ainda André Moitinho de Almeida. Falta, contudo, uma autoridade internacional que assegure o cumprimento destas práticas.

Ainda que a tecnologia também já permita prever a rota de objectos não controlados, à velocidade a que estes detritos se deslocam, um pequeno erro de cálculo sobre o tempo de entrada na atmosfera pode mudar completamente a previsão do local onde cairiam, explica o astrofísico.

O norte-americano Jonathan McDowell exemplifica, no Twitter: “Se [a previsão sobre a reentrada na atmosfera] está com uma hora de atraso, e uma vez que [a velocidade de deslocação dos destroços] atinge as 17 mil milhas por hora (mais de 27 mil quilómetros por hora), ficaria a 17 mil milhas de distância do local onde vai realmente cair. Esse é o grande desafio de tudo isto”, justifica.

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