Peso do gás no consumo eléctrico atinge recorde até Junho

Embora o mecanismo ibérico de controlo de preços esteja a amortecer o encarecimento da produção eléctrica, a seca está a fazer aumentar o recurso às centrais a gás natural.

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A seca tem feito aumentar o recurso a energia fóssil Paulo Pimenta

O mecanismo ibérico tem permitido amortecer o efeito da escalada do preço do gás na produção de electricidade (resultando numa poupança média de diária de 14% para os consumidores com contratos indexados aos valores de mercado, segundo o Governo), mas a seca severa que atinge o país tem exigido que as centrais de ciclo combinado compensem a falta de produção hidroeléctrica, que está em mínimos históricos.

Os dados divulgados pela REN esta segunda-feira indicam que a produção a gás natural abasteceu 31% do consumo de electricidade em Portugal na primeira metade do ano, tratando-se do “valor mais elevado registado até hoje para o primeiro semestre”.

Por outro lado, 21% do restante consumo foi assegurado por importações, o que representa igualmente “o valor mais elevado de sempre registado no sistema eléctrico nacional, para este período do ano”.

A produção renovável abasteceu 48% do consumo, repartida pela eólica com 25%, hidroeléctrica com 11%, biomassa com 7% e fotovoltaica com 5%.

Nestes seis meses em que o consumo de electricidade aumento 2,9%, o índice de produtibilidade hidroeléctrica registou 0,34 (para uma média histórica igual a 1, situação que se agravou especificamente em Junho, em que o índice foi de apenas 0,24) e o de produtibilidade eólica ficou-se por 0,95, enquanto a produtibilidade solar atingiu 1,11.

Analisando os dados semestrais sobre o consumo de gás, registou-se uma subida de 1,2%, graças a um aumento de 49% nas centrais eléctricas (sendo o abastecimento feito “quase integralmente” a partir do terminal de gás natural liquefeito de Sines).

Relativamente a Junho (mês em que o mecanismo ibérico de contenção dos preços da electricidade entrou em vigor, com efeito no dia 15) a empresa responsável pela gestão do sistema energético revela que o consumo de gás para produção de electricidade “foi mesmo o mais elevado de sempre” para esta altura.

O consumo de electricidade subiu 3,6% face ao homólogo e, embora tenha havido uma redução global de 7,5% do consumo de gás devido à tendência de quebra no segmento convencional (empresas e famílias), que resultou num corte de 15,1%, a utilização desta energia nas centrais de ciclo combinado aumentou 2,4% face ao mesmo período do ano passado.

A produção renovável abasteceu apenas 38% do consumo, um valor que foi semelhante ao da produção não renovável, enquanto os restantes 24% corresponderam a energia importada.

Mecanismo ibérico contém preços

Segundo as contas apresentadas pelo Ministério do Ambiente no sábado, nos primeiros 15 dias de aplicação da medida excepcional para o mercado ibérico grossista da electricidade, as famílias e empresas com contratos de fornecimento de electricidade expostos ao preço do mercado conseguiram “uma poupança média diária de 38 €/MWh [megawatt hora]”.

Este valor corresponde a uma redução média diária de cerca de 14% face àquele que seria o preço sem mecanismo para clientes que representam cerca de 30% do consumo de electricidade, e que são, na sua esmagadora maioria, do segmento industrial.

O Governo detalha que as famílias e empresas abrangidas pelo mecanismo ibérico – que são também quem financia a medida – suportaram um preço médio de 237,84 €/MWh, que teria sido de 275,90 €/MWh se não tivesse estado em vigor desde dia 14 de Junho.

Salienta também que, no mesmo período, os consumidores franceses e italianos pagaram valores genericamente superiores aos ibéricos durante este período.

Nas duas últimas semanas de Junho a ameaça do corte total de abastecimento russo fez escalar o preço em mais de 45%, “passando dos 80 €/MWh registados no dia 15 de Junho para os 116,03 €/MWh do dia 30”.

Esta subida fez com que se tivesse tornado mais dispendiosa a produção de electricidade nas centrais a gás natural (produtores aos quais está a ser aplicado um tecto máximo médio de 48,75 euros MWh para a energia utilizada e que depois têm de ser compensados da diferença face ao preço de mercado).

Embora os consumidores de electricidade possam contar até Maio de 2023 (que abrange os períodos críticos do Outono e Inverno) com um amortecedor face a estas subidas, tudo aponta para que a sombra do corte total de gás russo à economia alemã e a ameaça de escassez nos meses frios continuem a pressionar as cotações nas próximas semanas.

No mercado holandês TTF, que serve de referência a nível europeu, o valor está nos 146 euros/MWh, mantendo-se neste nível para Agosto. No mercado ibérico Mibgas (aquele que serve de referência ao cálculo da compensação às centrais de ciclo combinado em Portugal e Espanha) o preço está nos 138,18 euros (em alta de 7,1%), embora o contrato de Agosto seja de 125,25 euros/MWh.

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