Lagarde avisa: ajuda do BCE não deve adiar correcção da dívida

Presidente do BCE garantiu que subidas excessivas das taxas de juro vão ser contrariadas pela autoridade monetária, mas avisou que isso não deve levar os governos a abandonar os esforços de consolidação orçamental.

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Presidente do BCE está, esta terça-feira, em Sintra. Reuters/YIANNIS KOURTOGLOU

O Banco Central Europeu (BCE) está decidido a ajudar os países que sofram subidas excessivas nas suas taxas de juro da dívida pública, mas não a um ponto que os leve a não corrigir os seus desequilíbrios orçamentais, avisou esta terça-feira, em Sintra, Christine Lagarde.

No discurso de abertura do Fórum do BCE - que reúne esta semana em Portugal vários responsáveis de bancos centrais e economistas - a presidente da instituição reafirmou a sua intenção de, mesmo numa altura em que se prepara para subir o nível das taxas de juro em toda a zona euro, impedir que na dívida pública de alguns países essa subida se faça sentir de forma exagerada.

Há duas semanas, o conselho de governador do BCE, em reacção a uma subida acentuada dos juros da dívida de países como a Itália, Espanha ou Portugal, anunciou que iria tomar medidas para contrariar aquilo que caracteriza como uma “fragmentação do mercado da dívida da zona euro”. Por um lado, irá reinvestir em dívida desses países os valores que for recebendo à medida que os títulos de dívida pública acumulados no seu balanço atingirem a maturidade. Por outro lado, irá lançar um novo instrumento, ainda não detalhado, para influenciar os valores das taxas de juro nos mercados de dívida.

Esta terça-feira, contudo, Lagarde fez questão de salientar que estas medidas não devem servir para que os governos reduzam os seus esforços de consolidação orçamental. “O novo instrumento terá de ser eficaz. Mas ao mesmo tempo tem de ser proporcional e tem de conter salvaguardas suficientes que preservem o ímpeto dos Estados membros relativamente a políticas orçamentais saudáveis”, afirmou a presidente do BCE.

Esta terça-feira, a agência Reuters noticiou que as condições exigidas aos países para beneficiarem do novo instrumento serão relativamente lentas, sendo um dos exemplos o cumprimento das recomendações de políticas feitas regularmente pela Comissão Europeia, à semelhança do que acontece com o plano de recuperação e resiliência.

As taxas de juro da dívida pública portuguesa estão a registar, durante esta semana, uma subida ligeira, situando-se nos 2,65% durante a manhã desta terça-feira. Este valor, contudo, é ainda consideravelmente mais baixo do que os 3,1% atingidos a 14 de Junho, imediatamente antes de o BCE reunir de emergência e anunciar a aplicação de medidas destinadas a evitar subidas excessivas das taxas de juro da dívida dos países periféricos.

Subidas dos juros mais rápidas?

Em relação à política monetária seguida para a totalidade da zona euro, embora preocupada com aquilo que a actual perda de poder de compra das famílias pode fazer ao consumo privado e à economia na zona euro, Christine Lagarde fez questão de deixar claro que, se inflação persistir, o BCE não terá dúvidas em subir taxas de juro ainda mais rápido do que aquilo que está previsto.

No seu discurso, a presidente do banco central falou dos desafios que se colocam à política monetária na zona euro numa altura em que a taxa de inflação supera os 8%, mas existe o risco que uma subida forte das taxas de juro para a combater possa lançar a economia para uma recessão.

Neste cenário, a melhor estratégia para o BCE, defendeu Christine Lagarde, é “manter as opções abertas”. E entre essas opções está, salientou a presidente do BCE, a subida das taxas de juro mais rápida e mais acentuada do que a que está neste momento planeada.

No início de Junho, o BCE anunciou que, depois de colocar um ponto final das compras líquidas de dívida pública a 1 de Julho, irá na reunião agendada para dia 21 realizar uma subida de taxa de juro de 0,25 pontos percentuais. Em Setembro, uma nova subida deverá ser realizada, possivelmente de 0,25 pontos, mas deixando-se a porta aberta para um aumento maior. Até ao final do ano, o plano actual é a de manter uma subida gradual das taxas de juro.

Christine Lagarde, esta terça-feira, reforçou a ideia de que a velocidade da subida das taxas de juro pode acabar por ter de ser maior do que o planeado. “Se o cenário para a inflação não melhorar, teremos informação suficiente para agirmos mais rapidamente. Este compromisso, contudo, está dependente dos dados”, afirmou.

Em relação à evolução da economia, não escondeu o risco de a perda de poder de compra actualmente sentida pelas famílias poder levar ao esvaziamento da almofada de poupança acumulada durante a pandemia e a um abrandamento do consumo privado e do investimento. Ainda assim, no seu cenário central, o BCE continua a não antecipar uma entrada da zona euro em recessão. “Revimos acentuadamente em baixa as nossas previsões de crescimento para os próximos dois anos, mas ainda estamos à espera de taxas de crescimento positivas devido às almofadas domésticas que podem contrariar a perda de força no crescimento”, disse.

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