Rússia reforça ataques no Leste da Ucrânia, enquanto Zelensky prepara contra-ofensiva

Presidente da Polónia discursou no Parlamento ucraniano e criticou os países europeus, como a França e a Alemanha, que estão a pressionar a Ucrânia a ceder território à Rússia. Ao renovar a Lei Marcial por três meses, Governo ucraniano disse que “o contra-ataque leva mais tempo do que a defesa”.

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Edifício destruído na sequência de um ataque russo contra um campus universitário em Bakhmut, na província de Donetsk Reuters/CARLOS BARRIA

Depois de terem ocupado Mariupol, unindo por terra a península da Crimeia ao território da Rússia, as tropas russas concentraram-se quase em exclusivo no Leste da Ucrânia. No fim-de-semana, o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, admitiu que a situação na região do Donbass é “extremamente difícil”, com as tropas russas a lançarem uma grande ofensiva para a conquista de uma bolsa de território, nas províncias de Donetsk e de Lugansk, que resiste desde Abril à invasão do país vizinho.

Segundo o governador ucraniano da província de Lugansk — cujo território foi ocupado por forças separatistas pró-russas em 2014 —, o Exército russo tentou entrar na cidade de Severodonetsk, na noite de sábado para domingo, a partir de quatro direcções.

O responsável, Serhiy Haidai, escreveu na aplicação de mensagens Telegram que as tropas russas falharam o objectivo, mas disse que os ataques já provocaram a destruição de uma ponte que liga Severodonetsk à cidade vizinha de Lysychansk (também controlada pelos ucranianos), e que os russos continuam a bombardear edifícios civis na região, com ataques aéreos e artilharia pesada.

“Os russos destruíram 58 infra-estruturas civis num único dia”, disse a Polícia Nacional da Ucrânia, este domingo, num comunicado partilhado nas redes sociais. “Os invasores bombardearam 12 localidades e destruíram uma escola, um instituto, várias lojas de comércio e serviços de saúde.”

A maioria das localidades — como Bakhmut, onde terá sido atingido um campus universitário, segundo as autoridades ucranianas — situam-se num triângulo que liga Severodonetsk (na província de Lugansk), a Slovyansk e Donetsk (na província de Donetsk). Esta bolsa de resistência ucraniana tem conseguido repelir os ataques desde meados de Abril, quando as tropas russas foram forçadas a desistir de ocupar Kiev e começaram a reagrupar-se no Donbass.

Para além do reforço dos ataques nesta região do Leste ucraniano, as tropas russas também bombardearam no Sudoeste do país, a 90 quilómetros de Odessa — a outra grande cidade portuária no Sul da Ucrânia que o Kremlin quer invadir e conquistar, depois de Mariupol e Kherson. E se Mariupol, no mar de Azov, serve para unir a Crimeia ao território russo; Kherson — e principalmente Odessa, se cair nas mãos dos russos — é um ponto de ligação entre a Crimeia e a fronteira com a Moldova, a Este, o que significaria o corte total do acesso da Ucrânia aos seus portos.

Do lado russo, o porta-voz do Ministério da Defesa, o major-general Igor Konashenkov, disse que os ataques do fim-de-semana atingiram três postos de comando ucranianos, 13 áreas onde estavam concentradas tropas e equipamento militar da Ucrânia e quatro depósitos de munições. Na província de Mykolaiv — e relativamente perto de Odessa —, a Rússia diz ter atingido um sistema anti-drone.

"Rússia pode ser derrotada"

Em Kiev, as autoridades ucranianas acreditam que a ofensiva russa no Leste do país não será bem-sucedida. Ao mesmo tempo que reconheceu as dificuldades sentidas nos últimos dias, Zelensky afirmou, na sua comunicação diária ao país, na noite de sábado, que as forças da Ucrânia “estão a conseguir travar a ofensiva”, e disse que cada dia de resistência deixará a Ucrânia “mais perto do dia da vitória”.

Este domingo, o Presidente ucraniano renovou a Lei Marcial no país por mais três meses, até 23 de Agosto — depois de duas renovações por períodos de um mês, desde 24 de Fevereiro. Questionado sobre a extensão do prazo de um mês para três meses, o representante da Presidência ucraniana no Tribunal Constitucional, Fedir Venilavsky, indicou que as forças do país estão a antecipar uma nova fase na guerra de invasão russa: “O contra-ataque leva mais tempo do que a defesa.”

Também este domingo, o Parlamento ucraniano recebeu a visita do Presidente da Polónia, Andrzej Duda, que se tornou no primeiro líder internacional a falar aos deputados presencialmente. Na sua comunicação, Duda referiu-se à cisão na União Europeia entre países como França e Alemanha, que admitem um cessar-fogo sem uma retirada das tropas russas; e países como a Polónia e outros no Leste da Europa, que reconhecem à Ucrânia o direito a decidir em que termos está disposta a negociar um plano de paz com a Rússia.

“Têm surgido vozes a dizer que a Ucrânia deve ceder às exigências de Putin. Só a Ucrânia tem o direito a decidir o seu futuro”, afirmou o Presidente polaco, referindo-se à posição do governo de Kiev — reafirmada no fim-de-semana — de que o início de negociações de paz está dependente de uma retirada total das tropas russas, pelo menos para as fronteiras existentes antes da invasão de 24 de Fevereiro.

Numa entrevista ao jornal Kiev Independent, o ex-ministro da Defesa da Ucrânia, Andriy Zagorodnyuk, criticou o Conselho de Opinião do jornal norte-americano New York Times, que defendeu, na sexta-feira, o fim dos combates na Ucrânia mesmo que o país tenha de tomar “as dolorosas decisões territoriais que qualquer acordo com a Rússia exigirá”.

“A situação [no terreno] está a mudar rapidamente, e muitas pessoas não conseguem acompanhar as mudanças”, disse Zagorodnyuk ao Kiev Independent, recordando o novo pacote de 40 mil milhões de dólares (38 mil milhões de euros) em assistência militar e humanitária à Ucrânia que o Presidente dos EUA, Joe Biden, promulgou no sábado.

“Há uma barreira psicológica que impede algumas pessoas de acreditar que a Rússia pode ser derrotada, e que resulta de uma suposição antiga de que a Rússia é uma superpotência militar invicta. Temos de lhes explicar que a Rússia pode ser derrotada”, afirmou o ex-ministro ucraniano.

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