Compra de carro vai render mais 30 milhões ao Estado em ISV

Taxas sobem 1% e não segundo a taxa de inflação, como era habitual. Mesmo assim, a receita estimada com o imposto sobre carros novos cresce 14% face a 2021.

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Receita de IUC vai crescer menos do que o executivo estimava na proposta de OE de Outubro de 2021 Nelson Garrido

A compra de carro vai, afinal, render mais 30 milhões ao Estado do que aquilo que era a previsão do Governo na proposta de Orçamento do Estado (OE) de 2022 que tinha apresentado em Outubro. A primeira estimativa, no OE 2022 de João Leão, apontava para receitas de Imposto sobre Veículos (ISV) a crescer 6% (mais 29 milhões de euros) face às receitas de 2021. Na segunda estimativa, que consta da proposta de OE 2022 hoje apresentada por Fernando Medida, o crescimento é afinal de 14% (mais 59 milhões de euros).

O relatório anexo à proposta de OE 2022 não explica a razão desta correcção. Questionado pelo PÚBLICO na conferência de apresentação, o ministro das Finanças justificou esta forte revisão em alta com “as perspectivas de evolução do mercado” automóvel.

O mercado cresceu 8,1% em termos homólogos no primeiro trimestre de 2022, segundo os dados da ACAP - Associação Automóvel de Portugal. No entanto, o primeiro trimestre de 2021 ficou marcado por uma quebra de 25,2% das vendas, devido a um confinamento total por causa da pandemia.

Na ACAP não se acredita que o mercado nacional registe, em 2022, vendas que justifiquem um acréscimo de 30 milhões. O secretário-geral desta associação, Hélder Pedro, diz ao PÚBLICO que o sector “gostaria de ver o mercado recuperar para os níveis pré-pandemia, mas infelizmente não parece ser esse o caminho”.

Em teoria, as receitas de ISV podem crescer pelo aumento das taxas, pelo aumento do volume de vendas ou pelo aumento dos preços. Como as taxas nunca descem e os preços também não, a quebra nas receitas de ISV, pelo contrário, devem-se exclusivamente a uma quebra nas vendas. Foi isso que sucedeu entre 2019 e 2021 neste imposto,

No último ano pré-pandemia, o Estado encaixou 727,5 milhões em ISV. No ano seguinte, o primeiro da pandemia, houve uma quebra de 40% nesta receita, para 438,3 milhões, quando a compra de carros caiu 34%. Em 2021, com o mercado nacional a recuperar 1,9%, houve uma ligeira recuperação no ISV, de pouco mais do que 4% para 457,7 milhões.

Para 2022, ninguém do sector arrisca um cenário, com a crise das matérias-primas e a guerra na Ucrânia a manter vivas muitas incertezas quer do lado da oferta quer da procura. Mas o executivo é optimista.

Voltemos aos três factores que podem explicar um aumento tão acentuado da receita face à previsão moderada que o Governo tinha há seis meses. Em relação às taxas, o Governo impede uma escalada substituindo o aumento à taxa de inflação, que é o critério habitual, por um aumento de taxa fixa em 1%. Os consumidores e construtores respiram de alívio. Portanto, o aumento de 30 milhões na previsão de crescimento da receita não vem daqui.

Quanto ao volume de vendas, os primeiros meses do mercado nacional não demonstram um dinamismo que justifique tamanho optimismo. E ss previsões para o resto do ano são conservadoras: o sector continua a sofrer paragens de produção por causa da escassez de semicondutores e de outras matérias-primas, tanto por causa da pandemia como também devido à guerra na Ucrânia.

Resta, por isso, a hipótese do aumento dos preços dos carros. A pressão inflacionista no comércio automóvel já existe desde 2021 e algumas das principais marcas do mercado nacional conseguiram resultados financeiros recorde no ano passado, apesar de terem vendido menos viaturas. Virá daqui o “salto” nas previsões do ISV?

O secretário-geral da ACAP reconhece que há uma pressão inflacionista do lado da oferta, tanto pela escassez como pelos custos de produção crescentes, sobretudo os preços logísticos, de matérias-primas (incluindo algumas fornecidas por Rússia, Ucrânia e China) e de mão-de-obra.

Resta saber se os fabricantes vão tornar os carros assim tão mais caros. Hélder Pedro destaca que o mercado automóvel é “aberto e concorrencial”. E recusa-se a comentar as políticas de preços dos associados da ACAP.

Certo é que o Governo melhorou substancialmente a sua previsão de encaixe no ISV. O mesmo é dizer que a compra e uso de carro vai dar ainda mais dinheiro ao Estado.

Em Outubro passado, quando o então ministro João Leão apresentou a proposta de OE que viria a ser chumbada no Parlamento, a notícia era a de que o uso do automóvel voltaria a encarecer e ninguém ficou satisfeito.

Ao contrário do ISV, no IUC o Governo prevê agora um aumento mais moderado do que há seis meses. Em vez de uma subida de 13 milhões na receita, a nova proposta de OE prevê agora um aumento de oito milhões.

Tal como no ISV, as taxas de imposto serão actualizadas em 1% e não, como era habitual, à taxa de inflação. Mantém-se o adicional sobre o IUC que penaliza os carros com motor a gasóleo.

Com Rafaela Burd Relvas

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