Morreu Chris Bailey, vocalista da banda punk australiana The Saints

Tiveram um único concerto em Portugal mas 49 anos de música que, encetada com o seu punk rock original, foi pioneira e editada mesmo antes dos Sex Pistols ou Clash.

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Chris Bailey, filho de irlandeses, nasceu no Quénia em 1957 dr

Chris Bailey, o vocalista da seminal banda punk australiana The Saints, morreu no sábado, informou o grupo na sua página na rede social Facebook. Vocalista, compositor e guitarrista do importante mas discreto grupo, há muito dizia não se reconhecer na etiqueta “punk”: “Sou um homem velho e já não consigo identificar-me com isso”, disse ao PÚBLICO em 2015 antes do único concerto da banda em Portugal.

“É com uma grande dor no coração que temos de vos informar da morte de Chris Bailey, cantor e compositor dos The Saints, a 9 de Abril de 2022”, diz o comunicado da banda. “Chris viveu uma vida de poesia e música e encalhado num sábado à noite.”

Editados antes dos Sex Pistols, The Clash ou The Damned, menos reconhecidos pelo mainstream do que os Ramones, Buzzcocks ou outras bandas que fizeram do punk um movimento essencial na história da música popular, os Saints desencadearam, a partir da sua cidade de Brisbane, a explosão punk com o single (I’m) stranded de Setembro de 1976, uma das primeiras edições de um disco punk fora dos EUA (os Ramones lançaram o seu primeiro álbum homónimo em Abril de 1976, por exemplo). Uma faísca que inspirou dezenas de outros músicos e que deu nome ao seu álbum (I’m) stranded em Fevereiro de 1977. São uma banda para conhecedores, de “culto”, como descrevia o PÚBLICO em 2015. Os Sex Pistols editavam Never Mind the Bollocks, Here's the Sex Pistols em Setembro de 1977. A vaga estava formada e já crescia nas salas de concertos e nos clubes há anos.

Os Saints tocaram no Stairway Club, em Cascais, há quase precisamente sete anos, já com 42 anos de história desde que se formaram na Austrália pelas mãos de três amigos: Chris Bailey, filho de irlandeses, nascido no Quénia em 1957 (a data precisa não é conhecida), emigrado para a Austrália aos sete anos; pelo guitarrista Ed Kuepper, nascido em Bremen, Alemanha; e pelo baterista e teclista Ivor Hay. Conheceram-se no liceu e começaram por se chamar Kid Galahad and the Eternals, mas em 1974 já eram Saints. “Eu e o Ed criámos uma relação baseada na música que partilhávamos. A soul, o blues e também a boa música pop da época em que cresci [os anos 1960]. Continuo a dizer que parte de mim quer ser um americano negro e cantar como a Nina Simone ou o Otis Redding. Mas sou um tipo branco do centro da Europa e não canto como eles”, disse ao PÚBLICO há sete anos. Depois, o rock’n’roll que se explica pelo “puro prazer físico”, é uma “música sexual que podes dançar, e que, quando és adolescente e tens as hormonas a trabalhar a toda a hora, é muito excitante”, completava.

Essa receita era essencial para o que a edição australiana no jornal The Guardian descreve: interrupções constantes dos seus concertos pela polícia, que detinha tanto músicos quanto espectadores, e que levou a que a agenda dos Saints ficasse cada vez mais vazia.

Em 1978 já estão em Londres e perdem Kuepper devido a discórdias criativas com Bailey. Tornam-se mais pop, Bailey ganha uma carreira a solo, sempre a mexer-se pelo mundo. No concerto em Portugal, estavam com ele em palco os músicos Barrington Francis e Peter Wilkinson. Editaram 14 álbuns de estúdio com diferentes elencos de músicos e diferentes espíritos musicais, mas sempre com Bailey. Era a sua constante.

Esta segunda-feira, Ed Kuepper confirmou a morte do amigo de infância na sua conta no Twitter e recorda como se conheceram no liceu: estavam de castigo. Depois, desenvolveram “uma parceria artística extremamente forte”, descreve. “Não podia ter desejado um cantor melhor.”

A sua morte está a ser lamentada por músicos como Warren Ellis (Dirty Three, Nick Cave and The Bad Seeds) — “um dos melhores cantores; os Saints uma das melhores bandas” — ou o baixista Duff McKagan (Guns N’ Roses), que cita uma das letras do grupo e proclama: “Saints para sempre”.

Na entrevista ao PÚBLICO em 2015, Bailey falava sobre essa coisa de ser músico e referência com desprendimento. “Por estes dias, tendo a achar que as pessoas que constroem casas, as que cozem o pão, os enfermeiros e os médicos são mais importantes. Mas é verdade que, sem música, o mundo seria muito menos agradável.”

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