Como melhorar a qualidade de vida do doente crónico?

Ser doente crónico é viver com doença, mas não precisa de ser a doença a dominar a vida! No Dia Mundial do Doente destaco o papel que a prática de estilos de vida saudáveis e o acompanhamento médico regular têm na gestão da doença crónica.

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As doenças crónicas não escolhem idade Pedro Fazeres/Arquivo

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) as doenças não transmissíveis, também conhecidas como doenças crónicas, tendem a ser de longa duração e resultam de uma combinação de factores genéticos, fisiológicos, ambientais e comportamentais.

O relatório de 2018 da OMS revela que, do total de mortes em todo o mundo, as doenças crónicas foram responsáveis por 71% (41 milhões). Do total destas doenças, a maioria foram de causas cardiovasculares (representando 44%), oncológicas (22%), doenças respiratórias crónicas (9%) e diabetes (4%).

Destaco o facto de estas mortes serem responsáveis por 75% de mortes prematuras na faixa etária dos 30 aos 69 anos, isto é, estas doenças crónicas matam mais precocemente um número significativo da população.

Também a doença mental, seja a depressão, o burnout e a própria doença de Alzheimer assumem uma preocupação crescente e necessidade de as olharmos sobre diferentes ângulos, com uma maior e melhor integração nos cuidados de saúde. Outras doenças constam desta lista, como a doença renal crónica, doenças auto-imunes, reumatológicas, gastrointestinais, hepáticas, doenças genéticas e doenças raras.

Desafios existem: a gestão da doença crónica carece de literacia em saúde, por parte dos doentes; para os profissionais de saúde, requer aquisição progressiva de mais conhecimentos, bem como, a necessidade de lidar com muitos dados de informação em saúde.

Para garantir qualidade de vida do doente crónico são necessárias várias interacções entre este e os serviços de saúde. Após o diagnóstico da doença o plano individualizado para o seguimento do doente é elaborado pelo médico ou pela equipa de profissionais de saúde, sendo preciso tempo, coordenação e dados de saúde para que seja possível a correspondência efectiva entre as necessidades do doente e a capacidade de resposta dos serviços de saúde.

Ao longo da jornada do doente crónico são necessárias ferramentas para que o doente consiga identificar, reconhecer e autogerir a sua própria saúde, sabendo de forma orientada reconhecer sinais e sintomas de alarme, bem como períodos de estabilização, progressos e melhorias. É fundamental a adesão à terapêutica, assim como a medidas de prevenção para outras doenças crónicas, ou infecciosas. Não podemos, também, esquecer que é necessário ter em atenção o impacto negativo das agudizações, sobretudo nas doenças que possam originar internamentos hospitalares.

Todo este processo necessita da experiência adquirida, assente em conhecimento médico e em peritos em diferentes áreas. O doente precisa de suporte e informação para poder autogerir a sua doença. É necessário que a família, cuidadores e comunidade onde se integra sejam envolvidos e façam parte do processo.

O acompanhamento médico deve ser feito por um médico das especialidades de Medicina Geral e Familiar, ou de Medicina Interna. Os profissionais de saúde devem ter educação científica contínua e as opções terapêuticas devem ser tomadas com base em evidência e normas de orientação.

Para o sucesso dos modelos de gestão de doença crónica torna-se importante a existência de ferramentas de suporte à decisão e de bons sistemas de informação.

Mas estarão todos os stakeholders a conseguir gerir este sistema de forma coordenada e efectiva? Portugal em 2019 era um dos países da União Europeia a 27 em que a apreciação que a população residente fazia do seu estado de saúde era baixa.

Será que a capacitação e autogestão dos que têm doença crónica está a ser parte integrante do processo? Os países com menor ou médio nível económico são aqueles onde existem números mais elevados de casos de doença crónica.

Em cada país a literacia em saúde e o nível educacional influenciam, pela positiva, a redução destas doenças.

Em Portugal, a proporção de pessoas que referiram ter doença crónica ou um problema de saúde prolongado era consideravelmente menor para a população que completou o ensino secundário ou o ensino superior (respectivamente 29,2% e 29,9% em 2020).

As doenças crónicas não escolhem idade, mas a longevidade (o aumento da esperança de vida) traz, por definição, uma maior probabilidade de termos pelo menos uma delas, ou mais do que uma. Dados de 2020, revelam que 43,2% da população com 16 e mais anos referiu ter uma doença crónica ou problema de saúde prolongado.

Neste momento a saúde pode sofrer uma transformação no sentido de criação de cada vez mais valor para todos com a introdução da digitalização na saúde. A tecnologia digital é considerada a 4.ª revolução industrial. Na área da saúde tem um potencial enorme, desde que coordenada e utilizada de forma integrada por todos os intervenientes na abordagem destas doenças. Pode, inclusive, vir a diminuir assimetrias no cuidar.

Para lidar com o fardo crescente das doenças crónicas a OMS identificou várias intervenções, tendo em conta rentabilidade, acessibilidade, viabilidade e escalabilidade, a serem adoptadas em todos os países entre 2018 e 2025, estimando que tal evitaria 9,6 milhões de mortes prematuras.

Este grupo de medidas contém intervenções na área de redução de consumo de tabaco, do excesso de consumo de bebidas alcoólicas, de minimização de opções de dieta não saudável, do combate à inactividade física, da abordagem da doença cardiovascular, da diabetes e da doença oncológica, aqui, em particular, do cancro do colo do útero.

As medidas de prevenção de doenças, promoção e prática de estilos de vida saudáveis, a detecção precoce, o acompanhamento médico e o aumento da literacia em saúde por parte da população, são as reais armas no combate à doença crónica.

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