Novas dinâmicas na criação de valor nas regiões

A aposta no investimento em ciência e inovação deve ser prioridade das empresas, mas também do Estado. Da parte deste, urge contrariar a tendência de burocratização e centralização da gestão dos financiamentos.

O sistema científico e o ensino superior representam um dos setores que mais contribuíram para a internacionalização da sociedade portuguesa, projetando a imagem de um país aberto ao mundo, de conhecimento e de inovação.

A trajetória positiva na intensidade de Investigação e Desenvolvimento (I&D) e de massa crítica científica, de forma dispersa pelo território, merece hoje o maior interesse de empresários e de autarcas.

O inquérito ao potencial científico e tecnológico de 2020 revela que a despesa total em I&D em Portugal atingiu 3236 milhões de euros em 2020, evoluindo para 1,6% do PIB, face aos 1,2% de 2015. Este aumento é particularmente expressivo nas empresas (78% face a 2015) e representa 0,92% do PIB. Portugal é um dos Estados-membros da UE que mais crescem, porém ainda tem um longo caminho até atingir a meta de 3% do PIB. Por isso, não podemos estar satisfeitos; urge continuar uma estratégia de consolidação e convergência com a Europa e com o mundo de referência neste domínio.

Os dados confirmam a evolução positiva da intensidade em I&D de uma forma transversal ao território português. Lisboa continua a liderar o rácio da despesa em I&D face ao PIB (1,96%), mas registam-se novas dinâmicas regionais. Senão vejamos o Norte, uma região com forte intensidade produtiva e vocação exportadora (40% das exportações nacionais) que regista o maior crescimento desde 2020, aumentando o diferencial positivo face à média nacional e o peso no total da despesa em I&D.

O número de investigadores por mil ativos também regista uma evolução territorialmente expressiva. No setor privado, o Norte destaca-se com 40,4% dos investigadores, confirmando uma tendência de descentralização. Efetivamente, o número de investigadores aumentou muito (sobretudo nas empresas), porém a intensidade do investimento (i.e., a despesa por investigador) continua baixa a níveis europeus e mantém-se constante nos últimos trinta anos.

Em termos estratégicos para a criação de valor e de competitividade, as interações entre as empresas e as instituições do sistema científico e tecnológico, devem tornar-se práticas comuns. É vital assumir a inovação como epicentro da estratégia empresarial de diferenciação do produto e de afirmação nos mercados no contexto de racionais de crescimento da geração de valor.

Os projetos que passaram à segunda fase do concurso das agendas de apoio à indústria do PRR são um bom sinal para esta mudança. Mostram a natureza transformadora das agendas mobilizadoras, pois exigem consórcios estruturados entre empresas e centros de I&D, embora o montante disponibilizado seja insuficiente para a ambição das empresas.

O futuro passa por apoiar projetos que contribuam para a alteração do perfil de especialização da economia portuguesa, incentivando atividades de maior valor acrescentado, intensivas em conhecimento, orientadas para a criação e sustentação de empregos qualificados com salários mais elevados.

A aposta no investimento em ciência e inovação deve ser prioridade das empresas, mas também do Estado. Da parte deste, urge contrariar a tendência de burocratização da gestão dos financiamentos e descentralizar, também, a sua gestão. Do lado do sistema científico, é vital a transformação dos ambientes académicos, previligiando ecossistemas criativos que estimulem a inovação, a cultura científica e a inclusão social e regional.

Continuar a aumentar o volume e a intensidade do investimento em I&D é um desafio coletivo para Portugal. Contudo, além de aumentar o volume de investimento, é essencial apostar em melhores níveis salariais, modernizar a estrutura laboral com menos desigualdades e mais e melhores carreiras profissionais.

Estas mudanças são vitais para um país que ambiciona um estado social europeu equilibrado, mais e melhor emprego para fixar a geração mais qualificada de sempre em todo o território nacional, reduzindo as assimetrias de desenvolvimento.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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