Fernanda Montenegro eleita para a Academia Brasileira de Letras

A actriz de 92 anos integra agora o selecto núcleo de “imortais” do Brasil.

Foto
Fernanda Montenegro no Porto em 2004 MARCO MAURICIO/ARQUIVO

A actriz Fernanda Montenegro, de 92 anos, foi eleita, sem concorrência, para ocupar a cadeira 17 da Academia Brasileira de Letras (ABL), tornando-se assim “imortal”. O evento decorreu no palacete Petit Trianon, no Rio de Janeiro.

A falta de concorrência à cadeira vaga foi interpretada na academia como uma homenagem à actriz, um dos nomes mais aclamados do cinema, do teatro e da televisão do Brasil.

“Fernanda Montenegro é um dos grandes ícones da cultura brasileira. Intelectual engajada e sensível leitora do real. Sua presença enriquece os laços profundos da Academia com as artes cénicas. Com ela, adentram, luminosos, tantos, personagens, que marcaram gerações, passado, presente e futuro”, declarou o presidente da ABL, o académico Marco Lucchesi.

A artista brasileira foi eleita com 32 dos 34 votos dos académicos. Os restantes dois votos foram em branco.

Com quase oito décadas de carreira, Fernanda Montenegro sucederá ao académico Affonso Arinos de Mello Franco, que morreu em Março do ano passado e que ocupava a cadeira 17, das 40 que compõem a ABL.

“Academia Brasileira de Letras é um referencial cultural de 125 anos. Abrigou e abriga representantes que honram a diversidade da nossa criatividade em várias áreas. Vejo a academia como um espaço de resistência cultural. Agradeço a oportunidade”, comemorou a actriz na rede social Instagram.

Seguindo o modelo da Academia Francesa, a ABL é constituída por 40 membros efectivos e perpétuos, apelidados de “imortais”. Além deste quadro composto por brasileiros, existem 20 membros correspondentes estrangeiros. Entre estes estão dois portugueses, Guilherme d'Oliveira Martins e Telmo Verdelho, eleitos no início do mês passado para ocuparem as cadeiras deixadas vagas por Eduardo Lourenço (1923-2020)João Malaca Casteleiro (1936-2020).

Quando um membro da ABL morre, a cadeira é declarada vaga numa sessão denominada “Saudade”, tendo os interessados em ocupar a vaga dois meses para se candidatarem.

Fernanda Montenegro inscreveu a sua candidatura a 6 de Agosto deste ano, um dia depois de o músico Gilberto Gil, outro favorito para integrar a ABL, se candidatar a outra das vagas disponíveis.

As cadeiras que eram ocupadas por Alfredo Bosi (12), Murilo Melo Filho (20) e Marco Maciel (39) estão livres na ABL.

Fernanda Montenegro nasceu a 16 de outubro de 1929, no bairro do Campinho, no Rio de Janeiro. Pisou o palco pela primeira vez aos oito anos de idade para participar numa peça na igreja, mas a sua estreia oficial no teatro ocorreu em Dezembro de 1950, ao lado do marido Fernando Torres, no espectáculo 3.200 Metros de Altitude, de Julian Luchaire.

Segundo informações da própria ABL, Fernanda venceu o prémio de Actriz Revelação da Associação Brasileira de Críticos Teatrais, em 1952, pelo seu trabalho em Está Lá Fora um Inspetor, de J.B. Priestley, e Loucuras do Imperador, de Paulo Magalhães.

Mudou-se para São Paulo em 1954, onde fez parte da Companhia Maria Della Costa e do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC). Com o marido, formou a sua própria companhia, o Teatro dos Sete.

Em 1963, estreou-se na TV Rio, com as novelas Amor Não é Amor e A Morta sem Espelho. Na enrão recém-criada TV Globo, participou na série de teleteatro 4 no Teatro (1965), dirigida por Sérgio Britto, e, mais tarde, em novelas de sucesso como Baila Comigo (1981), Guerra dos Sexos (1983), Cambalacho (1986), Sassaricando (1987), Belíssima (2005), Outro Lado do Paraíso (2017) ou na série Doce de Mãe (2014), trabalho pelo qual ganhou o Emmy Internacional na categoria de melhor actriz.

Ao longo da carreira, participou também em minisséries como Riacho Doce (1990), Incidente em Antares (1994), O Auto da Compadecida (1999) e Hoje é Dia de Maria (2005). No caso da minissérie baseada na obra do académico Ariano Suassuna, Fernanda Montenegro viveu a própria Compadecida.

Em 1999, Fernanda Montenegro foi condecorada com a maior comenda que um brasileiro pode receber da Presidência da República, a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito “pelo reconhecimento ao destacado trabalho nas artes cénicas brasileiras”.

Ainda nesse ano, foi indicada ao Óscar de Melhor Actriz pela sua participação no filme Central do Brasil, sendo até ao momento a única brasileira nomeada para esse prémio.

A artista chegou a ter uma exposição no Museu de Arte Moderna (MAM), no Rio de Janeiro, comemorativa dos seus 50 anos de carreira. Em 2004, aos 75 anos, recebeu o prémio de Melhor Actriz no Festival de Tribeca, em Nova Iorque, pela sua actuação em O Outro Lado da Rua, de Marcos Bernstein.

Em 2019, para comemorar os seus 90 anos, publicou as suas memórias no livro Prólogo, Ato, Epílogo, em que aborda não apenas a sua trajectória pessoal mas também as suas visões acerca do Brasil.

Sugerir correcção
Comentar