A união de facto: os direitos consagrados e os que podem ser consensualizados

A lei prevê um conjunto de direitos na união de facto, como seja o direito de habitação da casa de morada de família, o direito à pensão de sobrevivência ou o direito de exigir alimentos da herança do falecido, conforme decorre do artigo 2020.º do Código Civil.

Do ponto de vista jurídico, viver em união de facto não é o mesmo que estar casado, na medida em que as normas que regem o casamento não lhe são aplicáveis, nomeadamente, não existe um regime de bens previsto, não existe um regime de alimentos após a cessação da união de facto ou, em caso de falecimento de um dos membros da união de facto, o outro não adquire a qualidade de seu herdeiro.

Mais, na união de facto não existem os deveres previstos no artigo 1672.º do Código Civil que se encontram consagrados para o casamento, a saber: deveres de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência. Do mesmo modo, os membros da união de facto não podem adotar apelidos do outro, na medida em que não lhes é aplicável quanto previsto no artigo 1677.º do mesmo Código.

Também importa salientar que quando os membros da união de facto têm filhos comuns, não existe uma presunção legal de paternidade, diferentemente do que ocorre quanto aos filhos concebidos e nascidos na constância do casamento (artigo 1826.º do Código Civil).

No entanto, a lei prevê um conjunto de direitos na união de facto, como seja o direito de habitação da casa de morada de família, o direito à pensão de sobrevivência ou o direito de exigir alimentos da herança do falecido, conforme decorre do artigo 2020.º do Código Civil.

Tomando em conta que as relações patrimoniais entre os unidos de facto estão, pois, sujeitas ao regime das relações obrigacionais e reais, nada obsta a que os membros da união de facto, no âmbito da sua autonomia privada, celebrem um contrato de coabitação (cuja eficácia não fica dependente do reconhecimento jurídico de que a união de facto tem uma duração superior a dois anos), no qual regulem, por exemplo, as regras para a divisão dos bens que tenham adquirido durante a vigência da união de facto, prevejam a fixação de presunções quanto à titularidade de bens adquiridos ou os termos da contribuição de cada membro para as despesas da habitação.

Estes contratos, que podem ser celebrados antes, durante ou após a dissolução da união de facto e que podem ser modificados, são contratos de Direito comum, que terão como fim a criação de um regime regulador de aspetos que os membros da união de facto considerem relevantes, sendo um meio que os unidos de facto têm para suprir as omissões legais que existem e, muito concretamente, a nível patrimonial, sendo que as previsões nele contidas não podem violar quanto previsto no artigo 280.º do Código Civil, ou seja, não podem conter estipulações que sejam contrárias à ordem pública ou ofensivas dos bons costumes, pois, caso contrário, serão nulos.

Assim, num contrato de coabitação, não se podem prever os deveres conjugais supra referidos que são próprios do casamento, pelo que o seu objeto apenas poderá versar sobre questões patrimoniais.

De entre as questões de caráter patrimonial importa referir que a limitação do artigo 280.º do Código Civil impedirá, por exemplo, a previsão de um regime de comunhão de bens equivalente ao do casamento.

Já quanto às estipulações que podem constar do contrato de coabitação, e tendo em conta que, de acordo com o artigo 2014.º n.º 1 do Código Civil, a obrigação de alimentos pode resultar de um negócio jurídico, nada impedirá que os unidos de factos estipulem, seja no decurso da união de facto ou para depois da sua dissolução, uma obrigação de alimentos, que até poderá ser recíproca.

Sobre a estipulação deste direito a alimentos no contrato de coabitação falaremos em artigo posterior.

Advogadas na Rogério Alves & Associados, Sociedade de Advogados, SP, RL

As autoras escrevem segundo o novo acordo ortográfico

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