EUA preparam-se para mais ataques do Daesh depois de explosões que mataram mais de 100 pessoas em Cabul

Mais de 100 pessoas morreram e centenas ficaram feridas no duplo ataque perto do aeroporto de Cabul. Retirada de pessoas do Afeganistão acelera, mas vários países já disseram que o transporte aéreo em massa de civis está a chegar ao fim e anunciaram que as últimas tropas estavam de partida.

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Cidadão ferido é transportado para o hospital Reuters/REUTERS TV/1TV

As forças dos EUA que estão a ajudar a retirar cidadãos afegãos desesperados que tentam fugir ao regime taliban prepararam-se para mais ataques nesta sexta-feira, horas depois de dois bombistas suicidas terem activado os seus engenhos explosivos nas proximidades da Abbey Gate, uma das principais portas de entrada no aeroporto de Cabul. As explosões mataram mais de 100 pessoas, incluindo 13 soldados norte-americanos. Há mais de 150 pessoas feridas.

Os mais recentes balanços foram avançados pela Al-Jazeera, que diz terem morrido pelo menos 110 pessoas nos ataques, e pela Associated Press, que afirma que morreram pelo menos 95 afegãos e 13 militares dos EUA, citando responsáveis norte-americanos e dos taliban. 

Muitos cidadãos testemunharam as duas explosões e a troca de tiros que se seguiu numa zona próxima do aeroporto na noite de quinta-feira. Num vídeo filmado por jornalistas afegãos é possível ver dezenas de corpos espalhados ao redor de um canal junto ao aeroporto.

Os taliban condenaram o ataque que “visou civis no aeroporto de Cabul”, mas esclareceram que as explosões “ocorreram numa área em que as forças dos EUA estão encarregadas da segurança”. O grupo extremista disse ter dado informações a Washington de que um atentado deste género poderia acontecer. Fonte do grupo avançou ainda que pelo menos 28 membros dos taliban tinham morrido nas explosões, embora um porta-voz tenha negado mais tarde que qualquer combatente que guardava o perímetro do aeroporto tivesse morrido.

Os atentados foram reivindicados pelo Daesh, através da rede social Telegram, pouco tempo depois de o Pentágono ter revelado suspeitar do grupo extremista. As hipóteses iniciais apontavam para a possibilidade de o ataque ter sido realizado por uma organização aliada do Daesh, conhecida como Daesh-Khorasan, que disputa com os taliban a influência sobre o território afegão. 

O Daesh disse que os homens-bomba tinham como alvo “tradutores e colaboradores do exército americano”. As autoridades norte-americanas juraram retribuição, com Biden a afirmar que vai “defender os interesses do povo norte-americano com todas as medidas” ao seu alcance.

O general Frank McKenzie, chefe do Comando Central dos EUA, disse que os comandantes norte-americanos estavam em alerta para a possibilidade de mais ataques, incluindo carros-bomba que tenham como alvo o aeroporto. “Estamos a fazer tudo o que podemos para nos preparar”, disse, acrescentando que parte dos planos estava a ser partilhada com os taliban, grupo que acredita ter “impedido alguns ataques”.

A Casa Branca também não deu indicações de que possa vir a alterar o calendário para a retirada – cujo prazo expira a 31 de Agosto e é inegociável para os taliban – em virtude do ataque. Segundo o Pentágono, ainda permanecem mil cidadãos norte-americanos no Afeganistão. No entanto, a morte de militares norte-americanos, algo que não ocorria desde Fevereiro do ano passado, vem pressionar o Presidente Joe Biden, que já era alvo de críticas pela forma como a retirada permitiu o regresso rápido dos taliban ao poder.

Joe Biden que diz que os Estados Unidos há muito alcançaram o motivo original para invadir o país em 2001: erradicar os militantes da Al-Qaeda e prevenir uma repetição dos ataques do 11 de Setembro nos Estados Unidos.

O Presidente norte-americano adiantou que serão atacados postos estratégicos deste grupo e daqueles que planearam o duplo atentado suicida desta quinta-feira junto ao aeroporto de Cabul. “Para os responsáveis deste ataque, bem como àqueles que desejam o mal aos Estados Unidos, saibam isto: não perdoamos, não esqueceremos, vamos perseguir-vos e fazer-vos pagar”, disse.

"Vi corpos a voarem"

Um vídeo gravado depois do ataque confirmou os relatos de cenas chocantes: cadáveres caídos no canal de águas residuais perto da vedação do aeroporto, alguns a serem retirados e colocados em pilhas enquanto vários civis choravam e procuravam os seus familiares.

“Vi corpos e partes de corpos a voar no ar como um tornado que soprava sacos plásticos”, disse uma testemunha afegã. “A pouca água que corria no canal de esgotos transformou-se em sangue.”

Zubair, um engenheiro civil de 24 anos, disse que estava perto de um dos homens-bomba que detonou os explosivos. “Homens, mulheres e crianças a gritar. Vi muitos feridos - homens, mulheres e crianças - a serem colocados em viaturas particulares e levados para os hospitais”, referiu.

Um porta-voz do Comando Central dos EUA disse que os 18 soldados feridos no ataque estavam “em processo de retirada aeromédica do Afeganistão” e que estavam “equipados com unidades cirúrgicas”.

Um diplomata da Nato em Cabul disse que todas as forças estrangeiras pretendiam retirar os seus cidadãos e funcionários da embaixada até 30 de Agosto. Os taliban reforçarão a segurança à volta do aeroporto, disse o diplomata, que não quis ser identificado. “A segurança é responsabilidade deles”, disse, acrescentando que o grupo extremista deveria investigar a rede do Daesh.

Ritmo de evacuação acelera

O ritmo dos voos de evacuação acelerou esta sexta-feira e os portadores de passaportes norte-americanos foram autorizados a entrar no complexo do aeroporto, disse um oficial de segurança ocidental posicionado naquele local.

Nos últimos 12 dias, os países ocidentais retiraram quase 100 mil pessoas do Afeganistão. Mas reconhecem que milhares serão deixados para trás quando as últimas tropas dos EUA partirem, no final do mês. Vários países, incluindo a Austrália, o Reino Unido e Espanha, disseram que o transporte aéreo em massa de civis está a chegar ao fim e anunciaram que as últimas tropas estavam de partida.

Operações de evacuação continuam REUTERS
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Operações de evacuação continuam REUTERS

O trabalho dos quatro militares portugueses no aeroporto de Cabul no apoio à retirada de cidadãos afegãos está “praticamente concluído” e estes vão sair de Cabul “dentro de algumas horas”, avançou na quinta-feira à noite o ministro da Defesa.

Em declarações à SIC, João Gomes Cravinho revelou que os quatro militares “estão empenhados em colocar nos aviões os 38 afegãos identificados e validados” para viajarem para Portugal e que a missão dos quatro miliares “está quase concluída” e sairão de Cabul “dentro de algumas horas”.

Acredita-se que o ataque de quinta-feira tenha provocado o maior número de mortes de soldados norte-americanos no Afeganistão num único incidente desde 2001, quando 30 pessoas morreram quando um helicóptero foi abatido.

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