China usa perfis falsos nas redes sociais para distorcer as percepções e passar a narrativa chinesa, diz estudo

Estudo refere que a narrativa pró-China é partilhada juntamente com conteúdos anti-Ocidente e, especialmente, contra os EUA. Por exemplo, são negados os abusos em Xinjiang e são satirizadas figuras críticas de Pequim.

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As contas falsas estavam espalhadas pelo Facebook, Twitter, Instagram e Youtube Dado Ruvic

Uma rede com mais de 350 perfis falsos em redes sociais tem desenvolvido uma operação de propaganda para “distorcer as percepções internacionais” enaltecendo a imagem e a influência da China fora do país. A conclusão é de um estudo do Centre for Information Resilience (CIR), projecto sem fins lucrativos que combate a desinformação. 

As contas falsas ou roubadas, espalhadas pelo Twitter, Facebook, Instagram e YouTube, assemelham-se a conteúdos partilhados “por representantes do Governo chinês e pelos media estatais”. O relatório indica que o objectivo da rede parece ser o de deslegitimar as posições dos países ocidentais e amplificar as narrativas pró-China”, disse numa declaração Benjamin Strick, autor do relatório.

Essas narrativas são construídas a partir de temas como a covid-19, “conflitos no estrangeiro, discriminação racial numa aparente tentativa de inflamar tensões, negar as críticas feitas à China e ter como alvo Governos ocidentais”, referiu Strick. Por exemplo, alguns dos perfis negam repetidamente a existência de violações dos direitos humanos na província de Xinjiang, referindo-se às alegações como mentiras “fabricadas” pelos EUA e pelo Ocidente. Também foram satirizadas algumas figuras críticas do regime chinês.

Comentando o relatório para a BBC, Ira Hubert, analista investigador na Graphika, uma empresa que analisa as redes sociais, salientou que a rede “divulgou uma combinação consistente de conteúdos anti-EUA”. Por exemplo, foi aplaudida “a “derrota” dos EUA antes da retirada das tropas do Afeganistão e o país foi pintado como um “mau aliado da Índia” durante o pico da pandemia de covid-19.

Esta rede assemelha-se a outra rede de propaganda chamada Spamouflage Dragon identificada pela Graphika. Embora não haja provas concretas que a rede esteja ligada ao Governo chinês, o CIR acredita que se assemelham a outras redes pró-China removidas pelo Twitter e Facebook. Aliás, os perfis falsos ampliam as narrativas difundidas “pelos representantes do Governo chinês e pelos media estatais”.

Rede de perfis falsos

O CIR descobriu a rede através do mapeamento de hashtags utilizadas por redes já identificadas. Também as narrativas pró-China e as fotos denunciam as contas. Algumas fotografias são criadas por programas de inteligência artificial e não correspondem a pessoas existentes – são realistas, mas também deixam sinais. E se algumas contas parecem ter sido roubadas, outras foram criadas para o efeito. As plataformas já informaram ter removido as contas identificadas no estudo.

Segundo a análise da jornalista da BBC Kerry Allen, especializada nos assuntos e media chineses, nos últimos anos a presença da China em plataformas internacionais tem crescido com financiamentos de milhares de milhões de dólares.

Uma vez que o Facebook, o Twitter e o YouTube estão bloqueados na China continental, o país tem tido dificuldades em fazer-se ouvir nessas plataformas. E para isso precisava “não só de vozes chinesas, mas de vozes estrangeiras”.

Surgiu então a diplomacia do “lobo guerreiro”, uma estratégia que envolve uma forma de comunicação pró-activa e agressiva. Como diz Allen, responsáveis chineses começaram a usar perfis no Twitter para veicular a retórica do Partido Comunista Chinês, porque a “China quer mostrar ao mundo que é um amigo – e não um Estado repressivo e autoritário, como é visto nas nações ocidentais”.

Allen admite que a “China tem certamente a capacidade de orquestrar campanhas em grande escala nas redes sociais”, mas com limitados conhecimentos de inglês e muitas plataformas bloqueadas, acabam por partilhar os conteúdos dentro da rede.

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