Balança externa piora, mas mantém-se positiva em 2020

Diminuição forte da importação de bens e menor pagamento de juros da dívida ajudaram a assegurar, mesmo num cenário de queda abrupta do turismo, um saldo externo ligeiramente positivo em ano de crise.

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rui gaudencio

A crise que a pandemia lançou sobre o sector do turismo abalou fortemente a balança externa portuguesa durante o ano passado, mas o país conseguiu ainda assim manter um saldo ligeiramente positivo das suas contas com o estrangeiro, prolongando uma tendência que se verifica já desde 2012.

De acordo com os dados publicados nesta quarta-feira pelo Banco de Portugal, a balança corrente e de capital registou um saldo positivo de 256 milhões de euros durante o ano passado, um valor que corresponde a aproximadamente 0,1% do PIB português. Este valor corresponde a uma diminuição do saldo face a 2019, ano em que atingiu os 2591 milhões de euros (cerca de 1,2% do PIB).

Este é o nono ano consecutivo em que Portugal regista um saldo positivo nas suas contas com o exterior. E consegui-o por muito pouco, num ano em que a balança comercial (a principal componente das contas externas) voltou a ser negativa e em que um dos principais contributos positivos, o turismo, sofreu uma crise sem precedentes.

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Em 2020, a balança comercial, que inclui as exportações e importações de bens e serviços, passou de um saldo positivo de 0,8% do PIB em 2019 para um défice de 1,7%.

Esta deterioração da balança comercial foi provocada pelo resultado muito menos positivo registado ao nível dos serviços, cujo saldo caiu de 8,4% para 4,3% do PIB. E, em particular, pela queda abrupta de mais de 10.000 milhões de euros das exportações de serviços de turismo.

A pandemia provocou uma queda tanto das exportações (57,6%) como das importações de turismo (46%), mas no caso de Portugal, um país largamente excedentário no que diz respeito a este sector, isso significou um abalo muito significativo nas suas contas externas, dando um contributo negativo de 8150 milhões de euros para o saldo externo face ao ano passado.

Este contributo negativo foi compensado, pelo menos parcialmente, por outras componentes da balança externa. Pelo meio, o Banco de Portugal reviu os números de 2019, o que significou, no caso das exportações de turismo, uma descida do recorde de 18.431 milhões de euros que tinha sido alcançado para os 18.291 milhões.

No comércio internacional de bens, embora as exportações tenham caído, as importações diminuíram ainda mais e, assim, o saldo negativo diminuiu de 7,6% para 6% do PIB.

Também significativas foram as melhorias do saldo da balança de capital (de 0,8% para 1,3% do PIB) e o saldo entre os rendimentos primários que entraram e saíram de Portugal (de -2,4% para -1,5% do PIB), esta última devido sobretudo à diminuição dos juros de dívidas pagos ao exterior, tanto pelo sector público como pelo privado.

Depois de, durante décadas, a economia portuguesa ter registado saldos externos muito negativos, que em alguns anos chegaram a superar os 10% do PIB, estes desequilíbrios foram corrigidos de forma brusca em 2012, durante a crise do euro, por via sobretudo de uma contracção muito forte do consumo e do investimento que conduziu a uma redução das importações.

Nos últimos anos, apesar da retoma progressiva do consumo e do investimento, Portugal tem conseguido registar saldos positivos com o exterior, beneficiando de um desempenho muito positivo das exportações (principalmente de turismo) e da redução dos juros pagos ao exterior (com a ajuda decisiva do BCE). Isso não chegou ainda contudo para retirar Portugal da lista de países mais endividados face ao exterior.

Turismo em queda

O turismo tem sido um dos sectores mais afectados pela pandemia de covid-19, que provocou restrições profundas à mobilidade, a que acresce o receio dos próprios turistas em deslocar-se. No caso do Reino Unido, principal mercado emissor de turistas, os dados do Banco de Portugal demonstram que o dinheiro gasto pelos britânicos em Portugal caiu 63% no ano passado, para 1202 milhões de euros. É preciso recuar a 2000 para se encontrar um valor inferior.

Já a França teve uma queda menor, de 40%, chegando aos 1551 milhões de euros, o que lhe permitiu voltar a ultrapassar o Reino Unido em receitas turísticas (a última vez tinha sido em 2013), e a Alemanha teve um recuo de 55%, para 883 milhões.

De acordo com os dados do INE referentes aos alojamentos turísticos (sem contabilizar as unidades de alojamento local com menos de dez camas), o Reino Unido manteve-se como principal mercado emissor em 2020, representando 16,3% das dormidas de não residentes.

Outro mercado fundamental, o espanhol, registou uma descida de 48% para os 1012 milhões.

Os EUA e o Brasil, depois de terem batido novos recordes em 2019, com tendência para continuarem a subir, travaram a fundo com quedas de 74% e de 71%, respectivamente, chegando aos 316 e aos 216 milhões de euros.

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