Marisa e Ventura lavaram a roupa suja e afundaram-se em acusações mútuas de “vigarista”

Casos polémicos atirados de parte a parte, perguntas sem resposta, um debate sem qualquer profundidade política: os opostos acabaram por sucumbir ao populismo.

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LUSA/JOSÉ FERNANDES

Foi um debate de acusações mútuas e em que se usaram as palavras mais duras dos frente-a-frente destas presidenciais: Marisa Matias e André Ventura atiraram um ao outro a classificação de “vigarista” e acusaram-se de mentir. A candidata apoiada pelo Bloco ainda chamou “cobarde” e “troca-tintas” a Ventura. Durante meia hora, os dois candidatos à Presidência da República questionaram-se mutuamente sobre questões programáticas como a saúde, a educação e impostos, assim como sobre casos polémicos, interromperam-se mutuamente e chegaram à mesma conclusão - a de que o adversário não respondeu a nada. Palavras como hipocrisia, trafulhas, vigaristas, lamaçal ditas pelos dois, ou frases como “eu vinha preparado para acabar consigo”, mostraram que o populismo esteve sempre à espreita de ambos os lados.

Marisa Matias arrancou o debate a reiterar que, se fosse Presidente, não daria posse a um Governo que integrasse um partido “segregacionista” como o Chega e André Ventura socorreu-se do discurso de Marcelo para alegar que um chefe de Estado não pode ter uma atitude “antidemocrática” de recusar dar posse a quem o eleitorado preferir para liderar o executivo - e que daria se fosse o Bloco. Mas a partir daí a conversa descambou e patinou em casos e acusações, sem qualquer profundidade política. Não houve gritos, mas as interrupções e os apartes foram constantes, com Ventura, por exemplo, a pressionar com os maus resultados de Marisa nas sondagens, alavancado por um estudo da TVI que o dá empatado em segundo lugar com Ana Gomes.

A candidata trazia um pacote de casos com que pretendia entalar André Ventura, mas esse é o campo preferido do líder do Chega, que a cada acusação interrompia, fazia acusações, ria-se, contrapunha. E atirava com outros episódios controversos do Bloco que Marisa Matias também não foi capaz de rebater. Foi assim quando Marisa o questionou sobre o que foi a PJ fazer ao seu gabinete em buscas sobre financiamento ilícito, sobre o assessor-fantasma, sobre o seu trabalho no escritório Caiado Guerreiro (e mostrou documentação de comissões de inquérito europeias a paraísos fiscais onde consta a empresa); e Ventura retribuiu a “hipocrisia”, dizendo que não foi o Chega que teve Ricardo Robles a “comprar imóveis à segurança social e a fazer especulação imobiliária” ou a ter deputados a “darem moradas falsas” no Parlamento e até falou de um dirigente do Bloco acusado de tráfico de droga. Marisa lembrou Ventura que este admitira num programa de TV que já fumara droga – e este questionou se fumar é o mesmo que traficar.

Marisa pegou no programa do Chega para criticar a proposta da taxa única de IRS de 15% que prejudica os mais pobres e beneficia os “Jardins Gonçalves”, e acusar Ventura de querer destruir o SNS, “vender a escola pública” e “mentir sistematicamente ao eleitorado”. O líder do Chega falou de “disparates”, aconselhou-a a “estudar” antes dos debates sobre questões fiscais, mostrou notícias e polígrafos que dizem que o partido defende o reforço do SNS, lembrou diversas propostas suas contra as quais o Bloco votou, defendeu a possibilidade de os pais poderem escolher a melhor escola para os filhos, acusou o Bloco de prejudicar os utentes do SNS ao acabar com a PPP do hospital de Braga e perguntou se Marisa ainda defende a saída do euro.

“É o André Ventura cobarde, troca-tintas e que na realidade é um vigarista”, apontou Marisa, não respondendo à questão do euro e da saída da União Europeia, enumerando mais à frente: Ventura ataca os mais fracos e mais pobres; diz uma coisa e faz o seu contrário; e mentiu, porque garantiu que ia ser deputado em exclusividade e acumulava três salários mesmo quando já era candidato.

“Eu sei que está mal nas sondagens, mas não é motivo para ofender. Isso é linguagem ofensiva. Eu não vou fazer isso consigo. A vigarista está desse lado da mesa”, disse Ventura num tom baixo, numa contenção que não se lhe esperaria, tendo em conta o debate com João Ferreira.

Na questão da imigração, Ventura defendeu que não se pode fechar a porta a quem foge da guerra e de perseguição religiosa, mas isso não se aplica aos migrantes marroquinos. “Não podemos ter uma Europa onde estão cá uns para pagar e trabalhar e outros chegam cá só para receber.” Como exemplo, disse que os refugiados têm comparticipação total nos medicamentos e os portugueses não.

“Não serei Presidente de pedófilos, traficantes de droga e dos que vivem à conta de subsídios manhosos.” Marisa quis saber “onde os vai pôr”, Ventura replicou “em lado nenhum”, mas que vai pôr os Estado a fiscalizá-los. A bloquista retorquiu ser necessária uma “posição humanista” e recusou o “discurso xenófobo e racista” de Ventura. Exemplificou com o facto de o líder do Chega começar a campanha ao lado de Marine Le Pen, que quer proibir o ensino do português em França.

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