Na Feira Gráfica, pulsa a energia humana das palavras e dos desenhos

Pequenos livros de poesia e ensaios, fanzines e revistas, cartazes, serigrafias, edições de artista. No Pavilhão Branco do Museu da Cidade, a terceira edição da Feira Gráfica abre-se, em formato de exposição, dando a ver a inesgotável vitalidade do universo da edição e publicação sobre papel que existe numa realidade paralela que não a digital. Até 11 de Outubro.

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Curiosos, leitores jovens e menos jovens, homens e mulheres aguardam à entrada do Pavilhão Branco do Museu da Cidade, em Lisboa. Vêm ver o que se publicou em papel, no último ano, longe do mainstream. As circunstâncias actuais não os demoveram desta terceira edição da Feira Gráfica. De máscara, esperam a vez para visitar a exposição do certame e adquirir pequenas obras em poesia, ensaio, prosa, arte, ilustração, banda desenhada, desenho, fanzines, artes híbridas. Pequenas obras de pequenas editoras, ditas independente, com tiragens restritas e que, habitualmente, passam invisíveis à maioria dos comuns. Mas que existem movidas pelo amor, pelo gosto, pelo fazer na sua mais humana acepção.

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Curiosos, leitores jovens e menos jovens, homens e mulheres aguardam à entrada do Pavilhão Branco do Museu da Cidade, em Lisboa. Vêm ver o que se publicou em papel, no último ano, longe do mainstream. As circunstâncias actuais não os demoveram desta terceira edição da Feira Gráfica. De máscara, esperam a vez para visitar a exposição do certame e adquirir pequenas obras em poesia, ensaio, prosa, arte, ilustração, banda desenhada, desenho, fanzines, artes híbridas. Pequenas obras de pequenas editoras, ditas independente, com tiragens restritas e que, habitualmente, passam invisíveis à maioria dos comuns. Mas que existem movidas pelo amor, pelo gosto, pelo fazer na sua mais humana acepção.

À entrada, Emanuel Cameira, fundador da Barco Bêbado e um dos curadores da Feira Gráfica — que volta a contar com o apoio da Câmara Municipal de Lisboa — comenta o que vê. “É sempre um desafio trabalhar nestas condições, por causa das luvas, da logística, mas [a feira] tem tido bastante aderência”. Filipa Valladares, também curadora da feira, concorda. “É verdade que é o primeiro dia, mas tem aparecido muita gente. E de áreas diferentes. Isso é muito importante. A feira continua a reunir várias comunidades”.

No interior do museu, munidos de luvas para folhear as publicações, os visitantes desfilam pelo espaço. Sobem e descem as escadas, param junto a uma vitrina, debruçam-se sobre uma serigrafia, lêem um texto. Passam, passeiam e demoram-se. Encenam um silencioso baile de máscaras que contrasta com a explosão de cores dos fanzines, com as frases que se soltam dos livros, com os cartazes de Miguel Carneiro, Luís Henriques ou Irina Pereira (nos vidros) com o retrato de Bruno Baldé de Filipe Cravo e Vítor Sanches (Bazofo/Dentu Zona).

A energia contra a incerteza

É da sala dedicada às pequenas editoras de poesia, prosa e ensaio que vem a única música. Foi composta por Ricardo Ribeiro para o vídeo de Ana Mata e Catarina Domingues, a dupla criativa da editora Chama I Ficção. “É uma editora que faz um trabalho muito artesanal”, diz Emanuel Cameira, o curador da sala. “A Catarina dirige com o Ricardo a editora Sr. Teste, da qual se podem ver traduções de obras menos conhecidas de Maurice Blanchot, Paul Valery, Hannah Arendt”.  À editora mencionada juntam-se outras com as mesmas características: Douda Correria, não (edições), Averno, Edições Húmus, BCF, Edições do Saguão, Barco Bêbado, Companhia das Ilhas.

Constituem um panorama do que se vai publicando neste domínio, permitindo observar processo de trabalhos, na exposição de capas, contracapas, desenhos, e observar o cuidado artesanal colocado em cada livro. Deste heterogéneo conjunto de publicações, ressaltam-se duas obras: uma antologia de textos da anarquista americana Voltairine de Cleyre, pela editora anarquista Barricada de Livros, e Política [um resumo] de Ricardo Tiago Moura, pela não (edições). 

Na sala ao lado, a presença das palavras diminui. Com a curadoria de Gonçalo Duarte, são o desenho e a ilustração menos convencional que sobressaem. Por exemplo, nos livros coloridos e vibrantes da Triciclo, nos trabalhos da Oficina Loba, da Oficina Arara ou da Homem do Saco. É todo um universo do desenho menos classificável, da ilustração mais expandida que tem a oportunidade de se mostrar, dando a ver o que Marco Franco, José Feitor, Miguel Carneiro ou André Lemos (com uma exposição patente na galeria Tinta nos Nervos até 28 de Novembro) têm andado a fazer.

A ligação com a actualidade, em matéria de lançamentos online, é um aspecto saliente da feira. Um dos livros expostos, Diário do Corona de Bruno Borges (Fojo/O Gorila) será lançado esta terça-feira e, até ao dia 11, aguardam-se as edições de Apesar de Não Estar, Estou Muito de Diogo Jesus (dia 8) e de Not Human-Not Fly de Mao (11). Estas duas obras encontram-se naquela que será a sala mais excitante da feira. Composta de fanzines, cartazes, serigrafias, discos e cassetes, sonda alguns caminhos da produção editorial underground e da ética do-it-yourself, introduzindo o visitante a projectos que atestam a vitalidade de um universo que existe numa realidade paralela que não a digital.

Por onde começar? Pela revista Estrada Decadente, pela Massacre edições, pelos fanzines da Erva Daninha, pela Sapata Pressas. Explodem-nos nos olhos e nas mãos enluvadas.  Na sala 4, onde predominam as publicações originárias no domínio da arte contemporânea, sente-se uma energia similar. Contra a incerteza, os editores e artistas (Mariana Caló e Francisco Queimadela, André Ruivo, Paulo Catrica, Isabel Carvalho, entre muito outros) continuaram a fazer, a publicar para leitores, para aquele público que aguarda lá fora. E que uma vez dentro da feira, colocará em diálogo autores gerações, domínio artísticos e zonas de intervenção cultural distintas.  Contra a incerteza deste mundo, escrevendo e desenhando sobre papel.