Centeno: Eurogrupo não deve deixar de pressionar para ter um orçamento da zona euro

O presidente do Eurogrupo acredita que depois da crise acabar, a necessidade de um instrumento como o BICC “será inquestionável”.

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Nuno Ferreira Santos

Depois de centenas de horas passadas a negociar o instrumento orçamental para a convergência e competitividade, conhecido pela sua sigla em inglês BICC, o presidente do Eurogrupo, Mário Centeno, “compreendeu” e “concordou” com a proposta da Comissão Europeia para a sua reconversão temporária no novo instrumento para a recuperação e a resiliência, que vai apoiar os esforços dos 27 na promoção da retoma e transformação da economia no rescaldo da crise do coronavírus.

“Nesta altura, devem canalizar-se todos os recursos disponíveis para o fundo de recuperação, porque precisamos mesmo deste dinheiro. Mas este é um instrumento de crise, não um mecanismo estrutural, e não devemos deixar de pressionar para ter um instrumento orçamental permanente que possa ser usado independentemente do ciclo”, defendeu Mário Centeno, que esta quarta-feira participou numa conversa com o director do think tank Bruegel, de Bruxelas, sobre “a zona euro depois da covid-19”.

O ainda presidente do Eurogrupo não só defendeu a existência de uma capacidade orçamental própria da zona euro, nos moldes do BICC, como rejeitou a ideia de que o novo fundo de recuperação da UE vá inviabilizar ou mesmo enterrar para sempre a ideia de um orçamento para a zona euro.

“Pelo contrário, quando a crise acabar, penso que o debate até será mais simples e que a necessidade de um tal instrumento será inquestionável”, considerou.

Centeno sublinhou que “a estrutura do BICC está muito presente no instrumento de recuperação e resiliência”, que segundo a proposta da Comissão irá financiar programas nacionais de investimento e reformas estruturais “associadas” às recomendações específicas por país do Semestre Europeu. “Essa ideia de fundos europeus que são usados de acordo com as prioridades definidas para a zona euro era precisamente o que estava previsto para o BICC”, vincou.

Talvez por ter a sua génese no BICC, Centeno entende que o Eurogrupo deve ser envolvido nas discussões e negociações dos planos nacionais de recuperação e resiliência, de forma a garantir que “os fundos alocados aos Estados-membros da zona euro são utilizados de forma compatível com os objectivos da união monetária e na prevenção de desequilíbrios no futuro”. Esse “papel permanente de coordenação, que é da maior importância”, é afinal o “grande valor acrescentado” do Eurogrupo, disse.

“O Eurogrupo é um híbrido no contexto das instituições europeias. Claro que  Ecofin tem uma dimensão importante na gestão das responsabilidades, uma vez que é por aí que passa o processo legislativo. Mas a flexibilidade do Eurogrupo dá-lhe uma vantagem sobre o Ecofin, e isso é muito bem entendido pelos ministros das Finanças”, notou Centeno, lembrando que “no Eurogrupo não votamos, procuramos sempre o consenso”.

Na próxima reunião, já na próxima semana, vai haver uma votação, para decidir quem vai suceder a Centeno na presidência do Eurogrupo. “Temos sorte porque temos muitos bons ministros das Finanças na UE, e os três candidatos [a espanhola, Nadia Calviño; o irlandês, Pascal Donohoe, e o luxemburguês, Pierre Gramegna] são um exemplo disso”, garantiu Centeno, que não revelou se tem um preferido. “Penso que é muito bom ter uma corrida competitiva e que reflecte as diferentes dimensões da política europeia”, disse.

Questionado sobre os desafios que o seu sucessor terá pela frente, Mário Centeno respondeu prontamente e com humor. “Manter todos os ministros acordados em reuniões pela noite dentro é um grande desafio e que deve ser tomado a sério”, avisou.

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