Irmão de Floyd lança debate sobre reforma policial no Congresso dos EUA: “Sejam os líderes de que o país precisa”

Depoimento de Philonise Floyd na Câmara dos Representantes marca início do processo legislativo de combate à violência policial. Republicanos respondem aos democratas com proposta de reforma própria.

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Irmão de George Floyd falou aos congressistas LUSA/Erin Schaff / POOL

Philonise Floyd, irmão mais novo de George Floyd, cuja morte, às mãos de um polícia de Mineápolis, fez nascer uma onda massiva de protestos nos Estados Unidos e não só, pediu esta quarta-feira à classe política norte-americana que honre a memória do falecido e que contribua para acabar com a desigualdade racial e o tratamento diferenciado da comunidade afro-americana no país.

Um depoimento emotivo, feito na Comissão Judiciária da Câmara dos Representantes, em nome de um apelo para uma “mudança positiva”, que marca o arranque do debate legislativo sobre a reforma policial no Congresso dos EUA – que contará com propostas dos dois lados do espectro político norte-americano, depois de os republicanos terem respondido à iniciativa democrata.

“Estou cansado. Estou cansado da dor que estou a sentir agora e da dor que sinto de cada vez que outra pessoa negra é morta por razão nenhuma. Estou aqui para vos pedir que lhe ponham fim, que acabem com a dor”, implorou Floyd.

“George não merecia morrer por 20 dólares. Pergunto-vos: é quanto vale a vida de um homem negro? As pessoas que marcham nas ruas estão a dizer-vos que já chega. Sejam os líderes que este país – e este mundo – precisam”, insistiu o irmão do homem sufocado sob o joelho de um polícia de Mineápolis, por ser suspeito de ter feito um pagamento com uma nota falsa de 20 dólares.

Philonise Floyd foi a primeira de várias figuras ligadas ao activismo pelos direitos civis a testemunhar numa sessão da Comissão Judiciária dedicada à apreciação social e política dos protestos das últimas semanas e, mais concretamente, das práticas e responsabilidades policiais nos EUA.

O Partido Democrata apresentou na segunda-feira uma proposta para a reforma da polícia, com o intuito de combater a violência e o uso excessivo de força policial, e espera poder levá-la a votação na câmara baixa do Congresso até ao início do próximo mês.

A proposta inclui a proibição de algumas manobras de imobilização agressivas – como aquela que levou à morte de Floyd –, o fim de determinados tipos de invasões policiais de propriedade sem aviso, a criação de registos de má conduta policial, a facilitação de abertura de processos a agentes que matem suspeitos sem justificação e ainda a limitação da alocação de equipamento militar para as esquadras e departamentos policiais.

Financiamento policial

Apesar das críticas aos democratas – algumas baseadas nos apelos e acções de líderes locais – a proposta não inclui cortes no financiamento para as forças de segurança. Esta quarta-feira, o previsível adversário de Donald Trump nas presidenciais de Novembro, Joe Biden, voltou a negar que seja essa a intenção do partido.

“Embora não acredite que o dinheiro federal deva ir para departamentos policiais que violam direitos das pessoas ou que recorram à violência como primeiro recurso, não defendo a redução do financiamento da polícia”, escreveu o vice-presidente de Barack Obama num artigo de opinião no jornal USA Today. “A melhor resposta é dar aos departamentos policiais os recursos de que necessitam para fazerem reformas significativas”, concluiu Biden.

Não obstante, o Presidente – que tem sido muito criticado pela oposição e por elementos ligados ao Exército de querer “dividir” os norte-americanos para obter ganhos políticos – recorreu ao Twitter para insistir ser essa a prioridade da “agenda da esquerda radical”.

“Excelente intervenção de Jim Jordan no Congresso sobre o corte de financiamento (não!) à nossa excelente polícia. A agenda da esquerda radical não irá acontecer. O sonolento Joe Biden vai ser (já está a ser) puxado para a esquerda. Muitos, como Mineápolis, querem encerrar departamentos de polícia. Absurdo!”, escreveu Trump naquela rede social.

Republicanos reagem

Há umas semanas, uma iniciativa democrata desta índole estaria condenada ao fracasso, uma vez que o partido, maioritário na Câmara dos Representantes, perde para o Partido Republicano, no Senado – onde qualquer proposta legislativa precisa de receber luz verde, antes de chegar ao gabinete do Presidente para ser ratificada.

Mas o impacto mediático dos protestos em todo o mundo e a discussão que provocaram, nomeadamente sobre a influência das questões raciais nos EUA na actuação das forças de autoridade, colocaram pressão sobre os republicanos, cuja maioria no Senado também vai a exame nas eleições de Novembro.

Segundo uma sondagem Washington Post-Schar School, sete em cada dez norte-americanos acreditam que morte de Floyd é consequência de um problema de racismo sistémico nos EUA, segundo o qual os afro-americanos são mais frequentemente vítimas de força excessiva da polícia que os restantes cidadãos.

Certo é que na terça-feira o Partido Republicano anunciou que os seus senadores estavam a preparar a sua própria reforma policial. Para liderar o grupo de trabalho e redigir a proposta republicana, foi escolhido o senador afro-americano Tim Scott, da Carolina do Sul.

“É importante termos uma resposta”, disse Mitch McConnell, líder da maioria republicana no Senado. “Nenhum de nós tem a experiência de ser um afro-americano neste país e de lidar com esta discriminação, que persiste 50 anos depois das leis dos direitos civis de 1964 e de 1965. A melhor maneira de os senadores republicanos responderem a esta questão é ouvir um dos nossos que passou por essas experiências.”

Fontes do Partido Republicano, ouvidas pelo Washington Post, disseram que a legislação republicana – que deverá ser conhecida na sexta-feira – será mais comedida que a proposta democrata.

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