Rendas: Lojistas denunciam bullying dos donos dos centros comerciais

Partidos mostram vontade de legislar sobre medidas para “reduzir” custos do arrendamento comerciais.

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À excepção da região de Lisboa, os centros comerciais abriram em pleno esta segunda-feira Paulo Pimenta

A Associação de Marcas de Retalho e Restauração (AMRR) denunciou esta quarta-feira que muitos centros comerciais têm aceitado o perdão parcial de rendas aos lojistas, mas condicionados a aceitar alterações que representam situações de bullying, como a renovação dos contratos de renda por mais cinco anos, a assinatura de compromissos que impedem o recurso a tribunal, ou aceitar a resolução de contratos, mas com o pagamento integral das rendas até ao fim do contrato. A denúncia da AMRR foi feita na audição que decorreu esta manhã na Comissão de Economia Inovação Obras Públicas e Habitação, onde os seus representantes pediram para que a Assembleia da República legisle sobre a matéria do arrendamento, de forma a evitar a falência de muitos empresários do sector do comércio e restauração, que levará ao desemprego de milhares de trabalhadores.

Os argumentos da associação, criada já no âmbito da pandemia de covid-19, sensibilizaram os deputados do PS, PSD, CDS, BE e PCP, que se mostram dispostos a estudar a solução para reduzir os custos das rendas, embora separando a realidade dos centros comerciais da dos pequenos senhorios.

A mais jovem associação criada em Portugal apresentou exemplos de vários países europeus que já criaram medidas de apoio aos lojistas, que no caso da Alemanha e da França são a fundo perdido, e alertam, se nenhuma medida for tomada, para o custo estimado de 100 mil empregos a suportar pelo Estado, que pode ascender a dois mil milhões de euros, quando o que está em causa são 500 milhões de rendas exigidos aos comerciantes.

A audição da associação, que diz ter como associados pequenos empresários e não grandes marcas ou lojas âncora dos centros comerciais, que têm contratos de arrendamento distintos, ficou marcada pela denúncia de práticas alegadamente inaceitáveis de alguns senhorios, em troca de descontos de parte das rendas relativas aos meses em que as lojas estiveram encerradas.

O vice-presidente da AMRR, Paulo Andrez, identificou algumas delas, que apelidou “de  bullying total” levadas a cabo por donos de centros comerciais que, a troco de um perdão de rendas de 50% nos meses em que as lojas estiveram encerradas, exigem “o prolongamento dos contratos por mais cinco anos”, nas condições actuais”, ou a proibição de recurso a tribunal, ou a exigência dos lojistas fazerem seguros para acautelar futuras pandemias, entre outras.

O mesmo responsável alertou ainda para situações em que é dado um prazo muito curto aos lojistas para assinatura das alterações aos contratos, acompanhadas de alegadas ameaças de que há outros lojistas interessados naqueles espaços, ou ainda de que “podem rescindir os contratos pagando a totalidade das rendas até ao seu termo”.

Dado que alguns deputados aludiram à dificuldade de legislar sobre contratos estabelecidos entre duas entidades privadas, a AMRR lembra que os pequenos lojistas têm pouco poder de negociação, criando-se mesmo “uma situação de grande desigualdade face a grande marcas”. “Há uns mais iguais do que os outros dentro dos centros comerciais”, denunciam.

Medidas propostas

A associação tem defendido um conjunto de medidas, algumas das quais não representam perdas para os senhorios. É o caso da isenção de taxa liberatória (28%) a pagar pelos senhorios durante dois anos - o que permite acomodar vários meses das rendas -, “a criação de um fundo, relativamente pequeno” para assegurar esse pagamento. Ou ainda a criação de uma moratória, como acontece com nos créditos bancários, em que as rendas em causa seriam pagas através da extensão dos contratos no mesmo período.

A associação pede aos deputados para que possa ser alterada a modalidade de muitos dos actuais contratos, compostos por uma parte fixa e outra variável (em função das vendas e do número de pessoas a entrar nos shoppings), regras que, em face de uma forte redução dos negócios, não podem ser suportadas, alegam. A associação defende, por isso, que as rendas passem, no actual contexto de “lenta recuperação económica”, a variar apenas em função das vendas.

“Partilha de sacrifícios entre empresários e senhorios” é o que a associação pede aos deputados, lembrando que só isso pode impedir uma pequena grande desgraça em Julho, com o aumento de cerca de 25% das rendas (pagamento integral do valor mais a parte correspondente ao diferimento, nos casos em que essa situação se verifica).

Como o PÚBLICO já noticiou, alguns proprietários de centros comerciais avançaram com o perdão total ou parcial de rendas relativos aos meses de encerramento dos estabelecimentos, ou mesmo a redução de valores futuros, mas a AMRR lembra que essas decisões não abrangem todos os centros, nem todas as lojas e restaurantes que estão fora desses espaços comerciais. De acordo com dados apresentados esta quarta-feira, de um total de 490 milhões de euros de rendas, os proprietários dos centros comerciais perdoaram 75 milhões de euros.

Recorde-se que, depois de dois meses praticamente encerrados, os centros comerciais e as lojas de rua com mais de 400 metros quadrados puderam abrir em pleno esta segunda-feira, 1 de Junho, à excepção dos que se localizam na Área Metropolitana de Lisboa, que apenas esta quinta-feira saberão quando o poderão fazer. A medida cautelar para a região de Lisboa foi decidida em função do número de novos casos de covid-19 aí registados.

A abertura do comércio e restauração está sujeita ao cumprimento de amplas medidas de segurança e higienização.

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