Covid-19. Director do São João pede “coerência” nas regras – “incluindo aviões”

O director de serviço de doenças infecciosas do hospital do Porto sublinha que “o distanciamento social não é para cumprir nuns sítios e não cumprir em outros” e que é necessária coerência.

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António Sarmento, director de serviço de doenças infecciosas do Hospital de São João, no Porto Manuel Roberto

O director de serviço de doenças infecciosas do Hospital de São João (HSJ), no Porto, defendeu esta quarta-feira que as regras associadas à prevenção de contágio pela covid-19 devem ser as mesmas, incluindo nos aviões, sob pena de ficarem “desacreditadas”.

“As regras dentro dos aviões têm de ser as mesmas que dentro desta sala. O distanciamento social não é para cumprir nuns sítios e não cumprir em outros. Porque há o risco de se desacreditarem essas medidas. É necessária coerência. A economia é importante, os voos são importantes, mas têm de existir regras que são cumpridas nas outras áreas. A não ser que alguém cientificamente nos dissesse que os aviões são entidades diferentes”, disse António Sarmento à Lusa.

O especialista em doenças infecciosas e medicina intensiva analisou que “é muito difícil ponderar entre a saúde pública e a economia” porque, disse, “para não se morrer do vírus, há quem passe fome”, mas pediu coerência, admitindo que a retoma dos voos “assusta”.

“As pessoas têm de ponderar entre a economia e a saúde pública e a sociedade tem de decidir o que prefere privilegiar. Sei que a economia é importante porque as pessoas sem dinheiro morrem à fome, mas são decisões muito difíceis”, referiu.

O director de serviço de doenças infecciosas do HSJ, hospital do Porto no qual a 2 de Março foi detectado o primeiro caso de infecção pelo novo coronavírus em Portugal, sublinhou que “não tem uma fórmula mágica” e que “não sabe qual é a solução certa”, mas lançou a pergunta: “Esta pandemia espalhou-se ao mundo em muitos poucos dias porquê?”.

“Por causa dos voos intercontinentais constantes. Sem voos a epidemia não teria chegado a muitos sítios. Os voos são necessários, mas assusta-nos porque começa outra vez a haver contacto entre zonas que estão muito piores do que nós. Até aqui conseguimos uma boa contenção, mas este é o princípio das bases comunicantes. Se a pessoa abrir as comportas, a água nivela-se”, afirmou.

Convidado a fazer um balanço sobre o combate à pandemia e a partilhar quais as suas principais preocupações para o futuro, António Sarmento, que é também professor na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, elogiou o desempenho dos portugueses.

“O futuro ninguém o adivinha, mas até ao dia de hoje Portugal fez um trabalho notável e com resultados notáveis”, considerou o especialista em doenças infecciosas e medicina intensiva, lamentando, no entanto, que as pessoas tenham “uma tendência um bocadinho mórbida de procurar pontos fracos e o que falhou”.

“Numa doença nova que nos apanhou de surpresa e sobre a qual não se sabe nada, é evidente que nem tudo é bem feito desde o início. Apesar de se ter de liderar na incerteza, as coisas foram ponderadas e feitas de uma melhor maneira possível”, concluiu António Sarmento.

O médico participou esta quarta-feira na cerimónia de assinatura de um protocolo entre a AEP, a OM e o Centro Hospitalar Universitário de São João, que visa angariar donativos para criar um novo Centro de Infecciologia no HSJ, no Porto, um projecto de 2,5 milhões de euros para tratamento, investigação e formação.

Esta iniciativa surge no âmbito da SOS - Coronavírus, uma campanha criada pela AEP em Março que tem como objectivo a angariação de fundos, cujos montantes são atribuídos atendendo às necessidades existentes no país, num processo articulado com a OM.

Portugal contabiliza 1356 mortos associados à covid-19 em 31.292 casos confirmados de infecção, segundo o último boletim diário da Direcção-Geral da Saúde (DGS) sobre a pandemia divulgado esta quarta-feira. Relativamente ao dia anterior, há mais 14 mortos (+1%) e mais 285 casos de infecção (+0,9%).

O número de pessoas hospitalizadas baixou de 513 para 510, das quais 66 se encontram em unidades de cuidados intensivos (menos uma). O número de doentes recuperados é de 18.349.

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